Ação da Leo Burnett acusada de transfobia
?The Shemale Calendar?, incluído no 39º Anuário do Clube de Criação, lançado no mês passado, gerou protestos nas redes sociais
?The Shemale Calendar?, incluído no 39º Anuário do Clube de Criação, lançado no mês passado, gerou protestos nas redes sociais
Odhara Rodrigues
21 de outubro de 2015 - 5h42
Uma campanha criada em 2013 pela Leo Burnett Tailor Made para a marca de autopeças Meritor está causando polêmica nas redes sociais, após ter sido postada na página do Facebook do 39º Anuário do Clube de Criação. “The Shemale Calendar” é um calendário estrelado por “lindas travestis” e adverte os mecânicos de que comprar peças falsificadas pode ter consequências inesperadas. Com o conceito “Se não é original, mais cedo ou mais tarde você sente a diferença”, a peça foi incluída no shortlist da área de Design Gráfico do 39º Anuário do Clube de Criação, que revelou seus vencedores em 2014 e teve sua edição impressa lançada no mês passado.
Nesta quarta-feira, 21, a postagem no Facebook viralizou e a ação começou a sofrer críticas de pessoas que acreditam que tratar as transexuais como sendo mulheres “falsificadas” é desrespeitosa.
A campanha criada por Julio D’Alfonso, Carla Cancellara, Murilo Melo e Ricardo Alonso, teve direção de criação de Marcelo Reis (atual co-presidente da LBTM) e Guilherme Jahara (hoje CCO da Fbiz). A aprovação no cliente foi de Marcelo Rosa.
Em comunicado para a imprensa, Marcelo Reis declarou: “Esse calendário (Shemale Calendar) foi criado há mais de 2 anos, de forma equivocada, mas sem o intuito de ofender ninguém. Já na primeira semana de distribuição solicitamos para as oficinas que não fosse fixado nas paredes. A peça foi inscrita no festival do Clube de Criação por uma falha nossa. Somos uma empresa que sempre respeitou e apoiou a diversidade. Eu, Marcelo Reis, peço desculpas. Lamentamos o constrangimento causado. Já solicitamos ao Clube de Criação que o trabalho seja retirado do Festival, por não estar alinhado com nosso modo de pensar e agir”.
O anunciante Meritor se eximiu de qualquer responsabilidade sobre a campanha, disse não ter autorizado a ação, embora reconheça a possibilidade de que “um colaborador pode ter aprovado inapropriadamente”. A ficha técnica da campanha credita a aprovação ao gerente de produtos e marketing Marcelo Rosa. O comunicado do anunciante é este: “Como a maior parte das empresas, a Meritor possui uma política clara para uso da sua marca bem como logotipo. Essa política não foi seguida nesta situação. A empresa acredita que um colaborador pode ter aprovado inapropriadamente o uso de seu nome e logotipo. No momento, a companhia está se reunindo para levantamento de detalhes sobre o assunto. A Meritor não apoia campanhas dessa natureza”.
Após a repercussão negativa, a postagem no Facebook do 39º Anuário do Clude de Criação foi apagada (veja pint mais abaixo). Em seu site, o Clube de Criação frisa que "recebe inscrições de trabalhos criados por toda e qualquer agência do mercado publicitário brasileiro, reúne grupos soberanos de jurados e respeita as escolhas destes júris, sem fazer qualquer ponderação ou julgamento de valor". "A única exigência da entidade é que as peças tenham sido veiculadas. Neste caso, o trabalho foi inscrito na categoria Design Gráfico e, portanto, não caberia comprovante de veiculação, mas sim uma carta, assinada pela agência e pelo anunciante, atestando que os calendários haviam sido entregues ao seu público-alvo. O Clube recebeu esta carta", salienta a entidade.
Nana Lima, co-fundadora do Think Eva, consultoria sobre o universo feminino para marcas e empresas, comentou sobre o assunto: "Confesso que não conhecia esse material até ele ter aparecido nas redes sociais. Se o machismo dentro e fora da publicidade prejudica e limita as mulheres, quando falamos de mulheres trans ainda é muito pior. O corpo delas é sempre representado de uma maneira hipersexualizadas e nessa peça em questão ainda é tratado com motivo de piada. Se alguém dentro da agência tivesse pesquisado o assunto teria visto que a situação das mulheres trans no Brasil é muito triste, a elas são negadas direitos básicos como educação e trabalho. Elas são inexistentes na publicidade nacional e nas poucas vezes que aparecem são representadas dessa maneira, um desfavor para a luta dessa minoria tão marginalizada na nossa sociedade. Sem diversidade nos departamentos de criação é difícil enriquecer o olhar e criatividade".
Em entrevista para o BuzzFeed Brasil, a maquiadora e modelo Rafaela Manfrini, uma das seis transexuais que apareceram na propaganda, contou que foi enganada pela agência em relação à natureza das fotos. "Na verdade, nos passaram que era um teste e que o cliente seria a Fiat. Sabíamos que ia concorrer ao festival de Cannes! Mas apenas isso". Ela também comentou sobre os RGs fictícios (veja abaixo) que foram usados na campanha: "Fomos pegas de surpresa, antes da maquiagem, e ainda por cima masculinizaram nossos rostos no computador. Não tínhamos ideia de que iam colocar um RG fictício", ela declarou.
Apesar do post ter sido apagado do Facebook do Clube de Criação, ainda está disponível na internet um vídeo com o making of do calendário:
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