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Comunicação

Por que a campanha do Guardian é tudo isso

Criado pela BBH, o filme ?The Whole Picture? ? ou ?Three Little Pigs? ? repercute e ganha elogios. Ela expressa o conceito de ?open journalism?, que coloca o cidadão como elemento forte da cobertura


5 de abril de 2012 - 1h00

Há situações que só acontecem na mídia inglesa. Ou quase só acontecem com a mídia inglesa. Não é raro ver nas páginas virtuais do centenário e prestigiado The Guardian um novo comercial que ainda não foi veiculado na TV. Em geral, o texto do site vem na linha: “o filme ‘X’, que estreará na semana que vem…” Ou seja, consegue-se antecipar com bons dias, naquele espaço, o da web, a exibição de uma campanha televisiva. Ponto para eles.

Outra característica da mídia inglesa é exatamente discutir o papel da mídia em suas páginas – virtuais e físicas. No próprio Guardian há um suplemento que contém reportagens que falam abertamente de outros veículos. Não é à toa, portanto, que o diário foi um dos que escancarou os excessos da News Corp, como salienta em artigo Simon Dumenco, o “Media Guy” de Advertising Age.

Por sinal, jornalismo é uma questão que entra na pauta de um cidadão britânico comum. Mais. Ali, ao contrário do que se vê no Brasil, a figura do jornalista não tem tanto prestígio assim. Ocorre até o contrário: ele é frequentemente mal visto. É o que observa o inglês Tim Lucas, sócio-fundador da The Listening Agency. A razão disso? Os tabloides ingleses sensacionalistas e mesmo os paparazzi (fenômeno que, diga-se, está longe de ser exclusivo da terra da rainha).

Claro, quem pratica o bom jornalismo tem esse mérito reconhecido. Daí porque o Guardian pode colocar o dedo na ferida e abrir sua mais recente campanha, conhecida como “Three Little Pigs” ou “Três Porquinhos”, com uma imagem que, aparentemente, remete a um erro estampado na versão impressa. O que isso quer dizer? Que a imprensa de papel está fragilizada por não conseguir atualizar os fatos como a mídia online? Calma, vamos esmiuçar a ação.

 

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Batizado pela BBH de Londres como “The Whole Picture”, o filme traz de início uma manchete no jornal que diz: “lobo mau foi cozido vivo”. Enquanto isso, surgem cenas da polícia invadindo a casa de um dos três porquinhos, os supostos assassinos do lobo, que teria atacado as residências do trio – como todos nós sabemos desde a infância. As reações do público pelas redes sociais provocam uma reviravolta no caso. Em uma das mensagens, lê-se “os porquinhos são, na verdade, vítimas”. Discute-se até o direito de defesa de um cidadão diante do invasor.

Aos poucos, novos elementos se juntam à história, desvendando surpreendentes aspectos da trama. Um jornalista recebe um chamado e alguém diz que o lobo não poderia ter soprado a casa dos porquinhos: ele sofria de asma (e aparece um vídeo da vítima usando um inalador). Um infográfico é apresentado aos leitores para esclarecer a evolução do caso.

Nova reviravolta na história: os porquinhos haviam armado a história toda porque estavam interessados em receber dinheiro do seguro da casa. Levados a julgamento, eles confessam que o golpe fora montado porque não queriam perder a casa para os bancos (estavam endividados por causa da hipoteca). Mais uma vez, a reação do público determina mudanças na cobertura jornalística. Protestos se espalham contra as instituições financeiras; os custos para manter as casas e a inadimplência provocada pela crise econômica se amplificam. Um dos cartazes dos manifestantes diz “Salvem as pessoas, não os bancos”. Referência às manifestações do tipo Occupy Wall Street? Sim.

Em um tablet, um leitor confere as cenas do protesto gerado a partir do caso dos três porquinhos. Ao lado, links para outras reportagens sobre diversas manifestações, de Mumbai a Toronto, e mais outro texto que pede reformas urgentes em virtude do cenário econômico e dos interesses dos bancos.

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Veiculado pela primeira vez na TV no dia 29 de fevereiro, o filme se encerra com a frase: “The whole picture”. E aponta os meios onde está o Guardian: web, print, tablet e mobile. Se alguém ainda não viu, vale a pena conferir acima (não se atrase). A produção é da Rattling Stick.

Jornalismo aberto

Como salienta a Creativity, esta é a primeira grande campanha de posicionamento do Guardian em 25 anos. Ela foi criada para divulgar o conceito “Open Journalism”. E, em que pese a qualidade da produção (ou a da linguagem ou do roteiro), muito da genialidade desse comercial está em saber colocar as necessidades e os dilemas que vivem os grandes veículos de imprensa hoje.

Alguém consegue acreditar em uma imprensa saudável que não ouça o que diz o público? Alguém consegue imaginar que é possível oferecer uma fotografia por inteiro de um episódio se todos os lados não tiverem seu espaço respeitado? Mais do que uma campanha publicitária para difundir um de seus valores, o centenário e moderno The Guardian mostra como é que se faz bom jornalismo. Ele pode escancarar, portanto, que uma cobertura completa se faz não apenas por se usar as mais distintas plataformas, mas por ouvir o que o público sabe e sente. Por incluí-lo na história.

A explicação do que é “Open Journalism” vem do editor-chefe do Guardian, Alan Rusbrigder. “A editoria de Viagens procura por centenas de pessoas que conheçam Berlim como se fosse a palma da mão”, “o editor de Esportes quer saber como cobrir melhor cada uma das 32 seleções que disputam a Copa do Mundo de futebol”, “os editores de Opinião e comentários gostariam de ampliar o espectro de debates incluindo pensadores políticos, cientistas, teólogos, advogados e inúmeros outros representantes da sociedade e gente ao redor do mundo cujas vozes nunca são ouvidas”.

Isso quer dizer trazer o público para “dentro” do jornalismo. Quer dizer, abrir espaço para que ele palpite sobre como deve ser feita a cobertura do Guardian sobre determinados temas. No ano passado, durante o Media On, seminário de jornalismo organizado pelo Terra, Meg Pickard, chefe de engajamento digital do diário inglês, falou à plateia a respeito do conceito de “mutualização”. Basicamente, significa ter a colaboração de leitores e comunidades para discutir tópicos da pauta e trazer novas perspectivas para uma história que está sendo apurada.

Em entrevista ao Meio & Mensagem, Meg reforçou isso. “Mutualização quer dizer colaboração com nosso público ou com comunidades para melhor entender ou explorar histórias de diferentes modos. Criamos mutuamente conteúdo que é de interesse de todos ou para benefício de todos. Para mim, significa que estamos mudando o jeito de contar histórias. Estamos examinando também a forma como as pessoas consomem o conteúdo. Não dá para separar entre criadores e consumidores. Nós estamos juntos”.

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De volta às palavras de Alan Rusbridger e ao conceito da campanha, o time de tecnologia do Guardian trabalha duro para fazer com que o conteúdo do jornal seja compartilhado, distribuído e conectado da maneira mais simples possível. Ele lembra que nos últimos anos os leitores estão crescendo (palavras dele): um pouco no impresso e de vastamente no digital. “Os jornalistas estão descobrindo que eles podem dar uma fotografia por inteiro de um modo melhor.” Até porque, como observa Tim Lucas, da The Listening Agency, os jornalistas percebem, assim, que não são donos da verdade, que eles não têm como saber de tudo. No entanto, isso não significa que os jornais deixarão de investir nos jornalistas. Porque para dar uma boa história é preciso ter o talento de ouvir, ir atrás e colher as informações venham de onde vier, cobrindo todos os ângulos. 

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Um detalhe importante: não se trata de mero discurso o que o Guardian está fazendo. Ele criou um canal dentro de seu site que se chama Open Journalism. E nesta segunda-feira, 5, já fez uma convocatória para seus leitores a respeito de tópicos como Dia Internacional da Mulher e conferência Rio+20. Está ali: “Como se envolver. Descubra como você pode contribuir para nosso jornalismo e se engaje com outras histórias e narradores de uma maneira nova”.

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