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Protestos acusam gap entre mídia e sociedade

Pautas das manifestações nasceram na imprensa tradicional, mas parte da população não se vê representada nela


8 de julho de 2013 - 9h04

Os motivos da hostilidade de parte dos manifestantes contra a mídia durante os protestos recentes são, ao mesmo tempo, claros e difusos. Afinal, sempre houve quem acusasse a imprensa de parcial e mentirosa, entre outros. Por outro lado, foi o noticiário produzido por diários, telejornais e portais que amparou muitas das reinvindicações que pulsaram nos protestos. Pautas como PEC 37, corrupção, superfaturamento de obras da Copa e cura gay repercutiram intensamente graças ao trabalho da imprensa. Esse foi um argumento comum entre muitas das fontes consultadas por Meio & Mensagem (a íntegra desta matéria está publicada na edição 1567, de 8 de julho, exclusivamente para assinantes, disponível nas versões impressa e para tablets).

“As redes sociais não produzem notícia; toda essa pauta é extraída da imprensa”, diz Marcelo Rech, editor-executivo de jornais do Grupo RBS e vice-presidente do Fórum Mundial de Editores. Segundo ele, a mídia foi um elemento central para “desnudar a ineficiência do serviço público e a letargia do Congresso.”

Marcelo Coelho, colunista da Folha de S.Paulo, concorda: “Antes, toda oposição ao governo do PT era coisa de uma imprensa chamada de golpista e de tucana”, adirma. “Todas as manifestações mostraram que os pontos de crítica ao governo, como corrupção e gastos públicos, não eram necessariamente coisas apenas de uma direita tucana. Houve uma despartidarização da crítica aos erros do governo, que atingiu tanto ao PSDB quanto ao PT.” Também é essa a opinião de Daniel Slaviero, presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert): “Sobretudo TV e rádio contribuíram muito para esse processo, para que a sociedade se mobilizasse e os protestos tivessem tanto alcance.”

Quais fatores teriam determinado, então, a animosidade de parte desses manifestantes? Tanto nas passeatas em si, com agressões a profissionais e patrimônio destruído, como nas redes, com o recrudescimento das acusações? Segundo Slaviero, as críticas não tinham um foco objetivo, mas era contra o status quo em geral, especialmente contra a política e suas representações no Executivo, no Congresso e no Judiciário. Tornou-se, portanto, uma repreensão contra os canais de poder de forma geral, onde também se incluiu a mídia. “A gente entende que o movimento estava contra todas as forças estabelecidas e uma parcela se voltou contra a própria mídia brasileira, especialmente a TV, que é uma força no País”, diz o diretor da Abert.

Rech identifica ainda a ação de grupos específicos com a intensão direta de ferir a imprensa: “A extrema esquerda e alguns grupos anarquistas são bastante atuantes em diversas cidades, e muitos têm relação com movimentos internacionais da Europa, do Oriente Médio e do Occupy Wall Street. São setores que defendem uma hostilidade aberta contra a imprensa, por que os entendem como parte do stablishment, do sistema, como sustentação de um regime que ele quer derrubar”, afirma.  

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Vácuo representativo
Em comunicado, o departamento de comunicação da Globo disse que a emissora foi tanto acusada de destacar as ações violentas de vândalos como de enfatizar o lado pacífico das manifestações. “É normal. As pessoas tendem a querer ver o seu ponto de vista prevalecer”, respondeu. Douglas Tavolaro, vice-presidente de jornalismo da Record, também diminuiu a importância dos episódios violentos e ressaltou a confiança do telespectador no trabalho da emissora. “O incêndio no caminhão da Record usado para a captação de imagens foi, definitivamente, um fato isolado”, diz.

Mas há quem enxergue nessa violência alertas sobre um distanciamento entre a grande imprensa e os interesses reais da população. “A vontade de fazer uma cobertura fria criou um jornalismo muito tecnocrático. Essa tendência foi forte”, afirma Coelho. Segundo Luli Radfahrer, professor-doutor de comunicação digital da ECA-USP, esse afastamento é ainda mais crítico, pois remonta a um desprezo histórico que a imprensa tradicional tem em relação ao mundo digital que é reprocessado, hoje, em relação às redes sociais. “A grande mídia ainda acha que a internet está na adolescência e fica esperando passar essa fase”, diz Radfahrer.

Esse vácuo representativo tem sido ocupado por profissionais independentes que tentam se aproximar do público, nas redes e nas ruas, de outra forma. Parte é amparada por veículos de estrutura enxuta, mas estreitamente conectados às pautas sociais. Parte se reúne em coletivos de reportagem cuja principal força é justamente a internet. Assim funciona o Mídia Ninja, cooperativa jornalística atuante em cem cidades que já existe há um ano e se destacou na cobertura das manifestações.

Para Bruno Torturra, um dos fundadores do grupo (cuja sigla significa “Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação”), tais propostas ganham terreno diante de uma confusão do público e dos próprios jornalistas sobre os sentidos do ofício e da redação. “É similar à quando se confunde partido político com a prática política”, afirma Torturra. “Há uma crise dos intermediários, sejam os partidos ou a própria mídia. Precisa acontecer uma atualização muito rápida, com uma aproximação direta entre o jornalista e seu público.”

Segundo Torturra, o Ninja foi criado para atender a uma demanda por um novo tipo de jornalismo, que tivesse uma lógica múltipla, que agregasse referências diferentes. Um componente importante nessa equação é o contato com os acontecimentos mais próximos do indivíduo, da comunidade. “A Hiperlocalidade faz todo sentido: como pulverizar uma rede de jornalismo e canalizar notícias locais de cidades pequenas ou bairros num canal específico e distribuir isso nacionalmente”, explica o repórter. “Captar as multilocalidades e devolver pautas de cantos que nunca estiveram conectados é um dos nossos desafios”, conclui.  

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