Do Tucuruvi ao Palais de Cannes

19 de junho de 2024 - 10h50

Em uma tarde ensolarada, mas com aquele friozinho de junho que te obriga a ter um moletom a tiracolo, eu vivia aquele momento pós-almoço, antes dos e-mails, layouts, reuniões e inúmeros ajustes seguirem a rotina normal. Era um tempo em que as pessoas paravam para conversar sobre diversos assuntos. Nesse momento, fui apresentado pessoalmente, pela primeira vez, a um Leão. Na verdade, antes disso, eu já olhava para ele e seu irmão gêmeo de longe, sem entender exatamente o que representavam. Isso foi há vinte anos, quando eu era estagiário em uma agência em São Paulo.

No meio dessa conversa, comentávamos sobre um projeto que estávamos trabalhando para um cliente. De repente, uma das pessoas disse em alto e bom som: “Esse job aí é Cannes, amigo!” Em seguida, olhou para mim pedindo algum tipo de confirmação ou comentário, apontando para os Leões que estavam em uma bancada com outros prêmios à nossa esquerda. Como todo bom estagiário que, em algum momento, quer parecer conhecer mais do que realmente sabe, eu prontamente respondi: “É! Cannes, amigo.” No entanto, não consegui esconder que não entendia do assunto, nem o motivo da empolgação dos outros membros do time com a possibilidade desse tal de Cannes.

Em um gesto de preocupação e orientação para aquele garoto meio sem jeito de perguntar mais, meu chefe na época e esse amigo começaram a me explicar melhor sobre o festival e a importância dele para o mercado e para seus profissionais, ao mesmo tempo que foram buscar um dos Leões para eu ver mais de perto. Claro que fiquei empolgado em saber mais sobre o assunto, mas para um jovem do Tucuruvi, que gastava três horas por dia em um ônibus, era algo inalcançável. Lembro-me de chegar na faculdade e compartilhar com meus amigos tudo o que havia aprendido durante aquela conversa inesperada.

A vida seguiu, e os anos trouxeram a rotina de enviar projetos e acompanhar os assuntos discutidos durante o festival. Eventualmente, algumas iniciativas das quais participei foram reconhecidas, incluindo o job que iniciou o papo, que obteve um shortlist naquele ano.

Hoje, termino este texto há alguns quilômetros do Palais de Cannes, participando pela primeira vez, fisicamente, do que tornou-se uma realidade virtual por anos. E não estou sozinho, mas com um dos meus grandes amigos da época de faculdade, que ouviu que eu havia conhecido um Leão em uma tarde de junho.