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17 a 21 de junho de 2024 | Cannes - França
Diário de Cannes

Menos olho na ficha técnica e mais olho no olho

Se as premiações são uma grande vitrine para contratações, está na hora das agências buscarem talentos que criam porque cansaram de perder


20 de junho de 2022 - 14h32

Eu estou em Cannes como um dos embaixadores do programa CC:DC (Cannes Can:
Diversity Collective), que tem como objetivo incentivar talentos com vivências sub-
representadas de todo o mundo a terem a oportunidade de ocuparem um dos maiores
festivais de criatividade e publicidade do planeta.

Todo dia, estou ao lado de pessoas negras, vindas de quatro diferentes continentes,
compartilhando experiências, alegrias, angústias e frustrações. Uma galera jovem, com
projetos admiráveis, apesar das poucas alternativas e privilégios.
Isso tem me feito pensar muito sobre criatividade. Não necessariamente essa que vemos
nos projetos premiados. Mas a que nasce um lugar muito específico: a ânsia criativa
oriunda da escassez.

Todas as vezes que conversei com meus colegas e perguntei sobre os seus projetos,
existia uma paixão inexplicável, acompanhada de uma fala sobre o quão difícil era o
mercado. Gente que ama cinema, mas tem que produzir seus próprios filmes. Gente que
trabalha em agências de publicidade pelo mundo, mas é a única pessoa negra de todo o
time. Gente que quer continuar ascendendo criativamente, mas não tem ajuda ou
referências de como chegar lá.

Por que eu estou contando isso? Bom, o Festival de Cannes é uma grande vitrine criativa.
Muitas agências fiscalizam as fichas técnicas dos trabalhos vencedores para definir suas
contratações. Mas não seria limitado entender a criatividade apenas por isso?

Existe uma ferramenta criativa que nenhum leão vai premiar: a necessidade de dar certo.
Que faz pessoas agarrarem projetos como se eles fossem a única oportunidade possível da
sua carreira decolar. Que faz pessoas continuarem dando seu máximo mesmo sem saber
se existe um lugar possível. Que faz pessoas criarem coisas incríveis com pouquíssimos
recursos.

Mas essas pessoas, infelizmente, não vão ser a maioria a subir nos palcos ou a estar nas
fichas técnicas. Essas pessoas ainda estão esperando uma oportunidade. E é muito
limitante que as agências continuem a direcionar seus olhares apenas para talentos que
criam para ganhar. Principalmente enquanto existe uma potência imensurável em quem cria
porque está cansada de perder.

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