15 de junho de 2017 - 12h39
Mesmo Junho, mesma Cannes, mesmo sol, mesmos rosés, mesmas longas noites e mesmas manhãs ansiosas para ver os resultados no Lions Daily News. Alguns vencedores serão os mesmos e com certeza teremos várias das mesmas conversas. 64 anos depois do primeiro festival realizado em 1954, tudo parece o mesmo. Mais categorias, mais leões, mas sem grandes novidades.
Você pode escolher parar de ler este texto aqui e partir para uma semana na Riviera entorpecido pelo sol, pelas risadas, rosés e, se for um dos escolhidos, pela alegria que você nunca imaginou que um meio leão de lata poderia trazer. Ou você pode continuar a leitura e partir para uma semana de reflexão, redescoberta, e muitos questionamentos sobre o seu trabalho, o futuro da sua profissão e o futuro das próprias marcas que pagam as nossas viagens para Cannes.
Como eu disse antes, tudo parece o mesmo, mas uma grande mudança está acontecendo na frente dos nossos olhos, que vai transformar completamente a nossa indústria e as nossas carreiras. É uma revolução de proporções nunca vistas antes por nenhum de nós da geração X, Y , Z ou até mesmo pelos nossos pais ou avós baby boomers. Estou falando da revolução digital industrial. Ela está transformando os pilares da nossa sociedade, mudando sistemas de produção, serviços, entretenimento, comunicação, entre outros e, diferentemente das revoluções prévias, o impacto dela vai ser muito mais rápido e abrangente.
Ok, mensageiro do apocalipse, mas o que isso tem a ver com o sol, o rosé e os momentos de glória na Riviera? Eu diria que para os que não querem que esta seja uma grande festa de despedida de uma indústria ameaçada, tem tudo a ver. Uma das vozes estraga-festa que está capitaneando este discurso é Scott Galloway, professor de marketing da NYU Stern School of Business e fundador da empresa de consultoria L2. Sua presença em Cannes este ano (terça-feira dia 19 as 17 hs no salão Debussy) é um sinal que pelo menos o Festival já está de olho nessas mudanças. Entre os assuntos que ele deve falar devem estar a decadência da TV frente aos canais digitais, tanto como veículo de entretenimento como influenciador do consumo das marcas, acompanhada da queda dos investimentos dos anunciantes. Para muitos isso deve parecer notícia velha, mas quando você vê os números, a sensação é a de estar em um barril em direção a Niágara Falls.
Outro tema, ligado diretamente ao anterior, é o futuro das agências de publicidade no formato atual em um mundo de adblockers, conteúdo de alta qualidade sem propaganda, multi-plataformas e de acesso fácil e barato. Para a TV aberta, se ela não se reinventar, vai restar ser o veículo para um público pouco qualificado e com baixo poder aquisitivo. O terceiro assunto que ele provavelmente irá abordar é o futuro das marcas em um mundo onde as buscas por voz crescem a cada dia através dos celulares e home-assistants. Este mercado será dominado por dois players, Amazon e Google, que vão determinar quem vai aparecer nos primeiros resultados dessas buscas sendo que nos EUA, a Amazon tem crescido continuamente como destino de buscas por produtos. A pergunta que o professor Galloway faz para as empresas é: você tem certeza que suas marcas são realmente relevantes e estão na memória do consumidor quando ele buscar um produto? Ou se o seu produto é tão diferenciado que ele será lembrado quando chamarmos a Alexa?
As previsões não são otimistas, mas, se existem losers, também existem os winners, e alguns deles vão estar ao seu lado em Cannes. A outra boa notícia é que o próprio Festival de Cannes está atento a essas mudanças: a criação da seção de música e entretenimento, assim como o crescimento da área de inovação e tecnologia, não são só formas extras de ganhar dinheiro, mas sim de planejar a sua sobrevida. E se você quer continuar aproveitando o mesmo sol, na mesma Riviera, tomando os mesmos rosés, eu passaria mais tempo visitando essas novas partes do Festival e iria ouvir o que Scott Galloway tem a dizer.