“Xadrez com capoeira”: as estratégias da Gana para mostrar o Brasil real
Tatiana Marinho, sócia e CEO da Gana, analisa o mercado brasileiro e fala sobre união de dados e ginga para entregar bons resultados aos clientes
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Caio Fulgêncio
31 de agosto de 2023 - 6h00
Com menos de três anos de mercado, a Gana nasceu com a premissa de refletir o Brasil autêntico dentro e fora da própria operação. Chefiada pelos sócios Felipe Silva, Tatiana Marinho e Ary Nogueira, a agência de publicidade é, propositalmente, formada 100% por pessoas negras. Hoje, o time fixo é composto, no total, por 37 pessoas, de todas as regiões do País.
Segundo Tatiana, CEO da Gana, o olhar da publicidade brasileira ainda é muito voltado para fora do Brasil. Para a executiva, que tem passagens por NBS e Dentsu, a publicidade ainda precisa aprender a ver a diversidade e pluralidade local como oportunidades para a criação de soluções criativas para as marcas.
A posição que a Gana já ocupa no mercado é comprovada pela carteira de clientes. Entre os fixos, atende iFood, Kuat – com relançamento da marca no Nordeste e em Minas Gerais – e Mercado Bitcoin. Além disso, a agência fez projetos para Sallve, Havaianas, Unilever, Natura, Budweiser, Spotify com Mano a Mano e Meta.
Ao Meio & Mensagem, Tatiana – que também é diretora financeira do Sindicato das Agências de Propaganda do Estado de São Paulo (Sinapro-SP) – analisou o mercado publicitário pós-pandemia da Covid-19 e falou sobre a necessidade de investimentos em diversidade nas empresas.
Meio & Mensagem – Como avalia a atuação de agências independentes, como a Gana, em relação às de grupo, como Dentsu?
Tatiana Marinho – Há um tempo, houve um movimento forte de grupos multinacionais adquirindo agências independências. Porém, nos últimos anos, surgiram novas agências, que enxergaram a oportunidade de ocupar um espaço em que agências de grupos têm mais dificuldade de atuar. As independentes têm capacidade de reagir rápido às mudanças e transformações do mercado. Além disso, têm mais flexibilidade para moldar suas equipes, processos e modelos de trabalho de acordo com a necessidade dos clientes. São menos burocráticas, com uma gestão mais horizontalizada, equipes com mais autonomia e sem muita hierarquização nos processos de aprovação. Dessa maneira, conseguimos manter uma proximidade da liderança nas contas. O cliente tem contato direto com os tomadores de decisão e esse é um dos principais benefícios. A união de maior flexibilidade, menos burocracia, mais autonomia e proximidade da alta liderança, nos dá a oportunidade de sermos mais ágeis e termos maior foco na entrega. É um trabalho de cocriação com o cliente. Por outro lado, acredito que nosso maior desafio é não possuir toda a estrutura como a dos grandes grupos, suporte financeiro/investimento, grandes times, e a força com os grandes veículos pelos altos investimentos em mídia.
M&M – Você faz parte do Sinapro, como vê o papel das entidades do mercado na articulação dos interesses das agências?
Tatiana – Nos seus 80 anos de atuação, o Sinapro vem fazendo um trabalho muito sólido nas bases legais que regulam o segmento, e nas relações com os principais stakeholders. Esse é um papel fundamental das entidades, que apoiam as agências no exercício das suas atividades, compartilhando e compatibilizando as melhores práticas. Acredito que atualmente o setor tem um grande desafio de tornar o mercado e as relações mais sustentáveis. O olhar para o desenvolvimento e gestão de pessoas é um pilar importante e essencial para o nosso fortalecimento. Não podemos mais deixar de debater assuntos como saúde mental, diversidade, ambiente tóxico e qualidade da relação entre agência x cliente x veículo. Dessa forma, precisamos de ações concretas para mudar a realidade dentro das agências.
M&M – A diversidade é um assunto que cresceu na publicidade nos últimos anos, inclusive, em Cannes, como analisa a evolução desse tema nas estruturas das agências?
Tatiana – Ainda acho que estamos engatinhando nesse assunto. As agências pouco evoluíram nas suas estruturas. Enquanto não tivermos diversidade nas lideranças, será difícil mudar essa realidade. A pesquisa do Observatório da Diversidade realizada em parceria com a Gestão Kairós, mostrou que, em cargos de liderança, existem apenas 10,3% são negros; 4,6% são mulheres negras; 6% 50 anos ou mais; 0,7% pessoas com deficiência; e 16,2% LGBTQIAPN+s. Se olharmos para CEOs e presidentes, os dados são ainda mais impactantes. Temos somente 15% de mulheres; 8% de negros; 0% de mulheres negras e de pessoas deficientes; e 8,5% LGBTQIAPN+. Ou seja, ainda há muito o que se fazer. As agências precisam entender que a diversidade é uma potência de criatividade, que gera resultado. As pessoas diversas não são token, elas precisam ser ouvidas, se sentirem pertencentes ao ambiente onde estão, para mostrarem seu talento sem um olhar discriminatório e permeado de julgamentos. Somos uma empresa que nasceu do incômodo de profissionais com quase 20 anos na publicidade e que não viam os negros na linha de frente das agências. Dessa forma, a Gana não só provoca o mercado para olhar para a diversidade, como, diariamente, prova que pessoas diversas são competentes, criativas e entregam excelência. Infelizmente, ainda existe uma visão preconceituosa de que uma pessoa diversa não é qualificada ou que não se encontram esses talentos no mercado.
M&M – Como analisa o momento do mercado publicitário brasileiro do ponto de vista operacional e de força negócios pós-pandemia da Covid-19?
Tatiana – Os últimos anos foram desafiadores, mas, ao mesmo tempo, de transformação. O mercado publicitário precisou mais uma vez se reinventar, mas dessa vez em um estalar de dedos, sem sinais e aviso prévio. Aprendemos como trabalhar à distância em equipe, a fazer apresentações para os clientes por vídeo, a gerir a empresa e cuidar das pessoas remotamente. Agora, no pós-pandemia, muitas agências estão voltando para um modelo híbrido de trabalho, o que há 4 anos atrás era inimaginável. Toda essa adaptação à nova realidade trouxe impactos ao negócio. Por um lado, há a redução do custo de se manter as grandes estruturas dos escritórios e todos os seus impactos. Por outro, existe o desafio de conseguir construir e/ou manter a cultura e valores da empresa sem o presencial, o convívio diário, além de gerir a equipe, manter a rotina de estar próximo e alimentar a troca entre as pessoas e as áreas, e manter o time engajado e motivado.
M&M – E, no âmbito criativo, identifica transformações nos últimos anos?
Tatiana – Do ponto de vista criativo, ainda vejo que nossa publicidade é muito “internacionalizada”, o olhar é contínuo e atento para fora do Brasil, mas pouco se aprofunda na cultura e regionalidade brasileira. Falta um olhar para o brasileiro, para o público com quem quer falar. Temos uma rica diversidade e pluralidade, por que não aprendermos a usá-las e a criar soluções criativas que conectem de fato as marcas ao seu público? Correndo paralelamente, temos a chegada da inteligência artificial, que já é uma realidade e um grande desafio para as agências. Como usar a IA de maneira responsável e trazê-la como uma aliada no processo criativo para que se complementem? A publicidade é movida por inovação, já passamos pela época em que presenciamos toda a revolução do digital, recentemente o metaverso, e agora chegou a inteligência artificial. Mais uma vez é hora de se reinventar, de se adaptar. Aqui, chamamos nossa metodologia de Xadrez com Capoeira. O xadrez é toda estratégia, inteligência e dados, a capoeira traz na sua ginga e na arte o olhar para o Brasil de verdade, suas diferentes culturas e vivências. E é essa união a base do nosso trabalho e das soluções criativas. Mostramos o que é fazer uma publicidade que fala de verdade com o brasileiro, e que ele se sente representado.
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