Como a inclusão no mercado pode mudar a vida de pessoas trans
No Dia Nacional da Visibilidade Trans, profissionais do setor de comunicação falam sobre como o mercado de trabalho tem impacto positivo na vida das pessoas dessa comunidade
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Amanda Schnaider
29 de janeiro de 2025 - 9h37
Nesta quarta-feira, 29 de janeiro, é celebrado o Dia Nacional da Visibilidade Trans, que visa promover o respeito e conscientizar a população sobre os desafios enfrentados pela comunidade trans.
Além da sobrevivência – visto que o Brasil segue, pelo 17º ano consecutivo, como país que mais mata pessoas trans no mundo, segundo dossiê da Rede Trans Brasil –, um grande desafio dessa comunidade ainda é a empregabilidade.
Tradicionalmente, o mercado de trabalho não é um lugar fácil para a maioria dos brasileiros, mas quando esse recorte se vira para pessoas da comunidade LGBTQIA+ e, principalmente, pessoas trans, se torna ainda pior.
Segundo dados da To.gather, empresa de mensuração e gestão da diversidade corporativa no Brasil, que reuniu empresas em 17 estados do País, apenas 4,5% dos cerca de 1,5 milhão de trabalhadores são pessoas LGBTQIA+. Esse número cai ainda mais quando são trabalhadores trans, chegando a apenas a 0,38%.
O atual diretor de arte associado da AKQA Casa, Tai Reis, salienta que entender como lidaria com o anúncio de sua transição publicamente foi a maior barreira que teve que enfrentar no mercado de trabalho. “Sou publicitário e já atuava profissionalmente, mas tinha receio de compartilhar essa questão. Apesar da boa recepção nas agências onde trabalhei, a situação me causava muito estresse”, confessa.
No segmento da publicidade há seis anos, a executiva de contas na Galeria, Gabriela Messias Mendonça, revela que sua trajetória foi solitária. “Na minha primeira agência, fui a primeira [pessoa trans], na minha segunda agência fui uma das duas, e agora que estou na Galeria tenho um grupo um pouco maior, em setores diferentes, em clientes diferentes e participando efetivamente em vários departamentos da agência”, complementa.
Apesar de o número de pessoas trans no mercado formal de trabalho ainda ser bastante baixo, a sua evolução é visível. “Quando comecei era muito mais limitada a quantidade de pessoas trans trabalhando nos lugares. Hoje, vejo que existem mais pessoas trabalhando, ocupando diversos cargos”, frisa Guilhermina de Paula, fundadora e CEO da OcupaTrans, projeto que visa garantir o acesso e visibilidade de pessoas trans e travestis em cenários contrários à marginalização.
Guilhermina percebe ainda que algumas áreas, como criação, social media e RH, são áreas com maior número de pessoas trans trabalhando. Neste sentido, Gabriela tende a achar que o campo da comunicação ainda é um pouco mais positivo para a inclusão de pessoas trans, versus outros campos mais operacionais. “São setores que ainda são muito estigmatizados”, complementa.
O processo de inclusão das pessoas dessa comunidade no mercado de trabalho é de extrema relevância para mudar a perspectiva de vida dessas pessoas, na visão de Reis. Ele mesmo ressalta que entrar na AKQA Casa, por meio de uma vaga afirmativa, foi o empurrão que precisava para iniciar a sua transição. “Foi no ambiente de trabalho que finalmente ouvi as pessoas me tratarem da forma que eu sonhei, com o meu nome e pronomes corretos. Esse processo de inclusão impactou profundamente a minha vida, me dando coragem para lidar com outras questões”, pontua.
Neste sentido, Gabriela salienta, ainda, que a inclusão no mercado de trabalho não é apenas sobre as possibilidades óbvias que isso representa, como promover estabilidade financeira para essas pessoas, mas sobre coisas pequenas, mas relevantes, como reduzir a marginalização da vida das pessoas trans, que por muito tempo só viam na prostituição uma possibilidade de sobrevivência.
“Hoje, por exemplo, tenho a possibilidade de estar morando num apartamento com meu esposo, tenho possibilidade de pensar em projetos futuros, de ir viajar, de sair, comprar as minhas coisas, tenho a possibilidade de viver de forma digna, de forma necessária para qualquer ser humano, conseguir fazer as pequenas coisas, porque tenho a possibilidade de um trabalho”, salienta.
Junto com essa redução da marginalização vem a segurança, segundo reforça Guilhermina. “Sabemos o quão difícil é, mesmo para pessoas que fazem parte do grupo de privilégios já é muito difícil se afirmar e se manter do mercado. Falando de pessoas que não tiveram os mesmos acessos, isso se intensifica dez vezes mais ou até mais”, complementa.
No entanto, tanto Guilhermina quanto Gabriela enfatizam que a inclusão de pessoas trans no mercado de trabalho já viu dias melhores. “Sabemos que, nos últimos tempos, o mercado de modo geral tem falado muito sobre diversidade, mas essa potência também tem perdido um pouco, porque as pessoas tendem a achar que a diversidade era só incluir essas pessoas no mercado de trabalho”, destaca a executiva de contas da Galeria.
A executiva, entretanto, frisa que é preciso mais do que isso, que é preciso garantir capacitação, um espaço de qualidade e acompanhamento, mas principalmente, um olhar pessoal para a vivência de cada pessoa.
Neste sentido, Reis ressalta que um tratamento horizontal é valioso para criar um ambiente acolhedor. “As pessoas trans são constantemente suscetíveis a serem desrespeitadas, então, é importante ter um RH cuidadoso e proativo, preparado para apoiar e orientar colaboradores e líderes”, comenta.
Além disso, o diretor argumenta que os gestores precisam de uma sensibilidade para auxiliarem na construção desse espaço, que envolve atenção a detalhes como o uso correto de nomes e pronomes em projetos ou e-mails; a implementação de políticas estruturais, um exemplo é a implementação de banheiros inclusivos; e oportunidades para que vozes trans sejam ouvidas e amplificadas a partir de suas experiências e perspectivas.
Um movimento que tem impactado essa comunidade, direta ou indiretamente, é que algumas grandes empresas norte-americanas, como Meta, Amazon, Target e McDonald’s, anunciaram recentemente que estão reduzindo ou encerrando programas de diversidade, equidade e inclusão (DEI). Na visão de Guilhermina, esse movimento representa um “paradoxo muito complexo”, visto que, segundo ela, ao mesmo tempo, em que pode ter um efeito dominó e “derrubar” tudo que a comunidade LGBTQIA+ conquistou ao longo de todos esses anos, ainda há empresas que estão fazendo de tudo para segurar e se opor a esse pensamento.
Gabriela também observa uma movimentação de empresas abrindo oportunidades e margem para pessoas dessa comunidade, porém, destaca que, paralelamente a isso, ainda existem cenários de transfobia, de racismo atrelado a transfobia, de machismo atrelado a transfobia. “Não temos mais conversado sobre a importância da participação de pessoas trans na estrutura”, comenta. “Não temos mais as conversas sobre como isso contribui para a estrutura. Não vejo mais essa movimentação que eu via até dois anos atrás”, complementa.
Apesar desse cenário desmotivador, Reis acredita que, no futuro, haverá mais pessoas trans ocupando cargos de liderança, empreendendo seus próprios negócios e se destacando em diferentes setores. Na sua visão, para isso, será necessário continuar contando com aliados. “É relevante o investimento de empresas nesse sentido, inclusive para que talentos trans possam desenvolver todo o seu potencial. Conquistamos muito nos últimos anos, mas ainda há muito trabalho a fazer”, conclui.
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