Marcas investem em comunicação inclusiva
Anunciantes como Extra e Burger King colocaram recursos de Libras e audiodescrição; tema ganhou atenção na edição deste ano do Cannes Lions com cases de Google, Ikea e Microsoft
Anunciantes como Extra e Burger King colocaram recursos de Libras e audiodescrição; tema ganhou atenção na edição deste ano do Cannes Lions com cases de Google, Ikea e Microsoft
Bárbara Sacchitiello
2 de setembro de 2019 - 11h54
Na semana passada, em celebração ao seu aniversário de 30 anos, a rede de supermercados Extra começou a exibir na mídia um comercial que, além das tradicionais ofertas, trazia um elemento diferente. Junto com a atriz Fabiana Karla, garota-propaganda da campanha, uma tradutora de Linguagem Brasileira de Sinais (Libras) aparece no canto da cena, expressando o mesmo texto dito pela atriz.
É a primeira vez que o recurso é utilizado em uma campanha da rede, que contou com a criação da agência Leo Burnett Tailor Made. A ideia de tornar o comercial mais inclusivo para as pessoas que possuem algum tipo de deficiência auditiva foi do próprio anunciante e a agência passou a desenvolver a campanha já a partir dessa premissa. “A inclusão da linguagem brasileira dos sinais nos comerciais foi mais um passo no aprimoramento da comunicação da marca com os clientes. E como a ideia nasceu antes da produção, o processo de filmagem então já foi pensado e executado prevendo incorporar esse novo elemento”, diz Augusto Coelho, diretor de criação da Leo Burnett Tailor Made.
A atitude do Extra – que também começa a aparecer na comunicação de outras marcas – tende a ser um elemento a ganhar força na publicidade brasileira. Para o criativo da Leo Burnett, a adoção de elementos inclusivos nas mensagens publicitárias, como a linguagem de sinais, já é algo comum na comunicação pública e prestação de serviços. “Trazer essa atitude para a iniciativa privada – mais especificamente para o varejo – é reforçar a postura de ser uma marca democrática que conversa com todos os brasileiros e brasileiras”, reforça Coelho.
No final do mês de julho, o Burger King também apresentou uma campanha com um recurso direcionado a pessoas portadoras de necessidades especiais. Em um comercial para divulgar a oferta de sua linha de sanduíches, um rapaz cego aparecia provando os lanches, enquanto uma voz narrava toda a cena, fazendo uso do recurso de audiodescrição.Embora a opção da audiodescrição esteja disponível na maior parte da programação da TV aberta, por meio da utilização da tecla SAP, a utilização da descrição dentro de um comercial de TV não é algo ainda comum. Na ocasião do lançamento da campanha, Ariel Grunkraut, diretor de marketing e vendas do Burger King no Brasil, comentou a estratégia. “Nós trabalhamos constantemente para que todos se sintam acolhidos e livres para serem quem são, respeitando suas individualidades. Lançar a primeira campanha com audiodescrição em rede aberta é um reflexo de todo nosso posicionamento”, disse o executivo.
Como protagonista dessa campanha, a rede de fast-food contou com a participação de Eduardo, um deficiente visual que, na opinião da agência David, ajudou a complementar o tom das mensagens do Burger King. “Temos um personagem que sabe rir de si mesmo, assim como a própria marca. Tudo sempre é feito com muita verdade e autenticidade. O principio de que todos são bem-vindos no BK vai além do discurso e é parte fundamental da comunicação da marca, desde casting a temas de campanhas e ações pontuais”, diz Rafael Donato, vice-presidente de criação da David.
#PraCegoVer
Nas redes sociais, é crescente o número de marcas que, em suas postagens, começam a exibir a frase #PraCegoVer, seguida da descrição detalhada daquela imagem. O projeto foi criado oficialmente em 2012, pela professora Patricia Braille, que começou incluindo a descrição das imagens e fotos que postava no Facebook para que seus amigos cegos pudessem compreendê-las (por meio dos programas de leitura automática disponíveis na web).
Como tais programas fazem a leitura dos textos, mas não conseguem descrever as imagens postadas, a proposta da iniciativa é oferecer uma descrição da foto do post, a fim de que as pessoas que não enxergam possam ter ideia do que está sendo postado. A ideia começou a ser disseminada na rede social e, agora, esta presente também no Instagram. Marcas como O Boticário e Avon já fazem uso do recurso.
https://www.instagram.com/p/B14nSJrlhvC/
Acessibilidade: nova fronteira criativa
Na edição deste ano do Cannes Lions, o principal festival de criatividade do mundo, a questão da acessibilidade foi um dos elementos mais presente. Dezenas de troféus – incluindo quatro Grand Prix, o prêmio máximo de cada categoria – foram entregues a cases que propõem algum tipo de inclusão aos consumidores e usuários das marcas.
Duas das maiores empresas de tecnologia do mundo voltaram suas ferramentas para as pessoas que acabam ficando à margem de alguns de seus produtos. O Google abriu uma plataforma colaborativa, chamada Creatability, que convidava desenvolvedores a criarem ferramentas que, por meio de inteligência artificial, trouxessem soluções de usabilidade para portadores de necessidades especiais. E a Microsoft, após observar que algumas crianças não podiam se divertir com o Xbox por não conseguirem usar as mãos e membros superiores para manusear o controle, desenvolveu um protótipo que torna o game mais inclusivo.
Outro case premiado por levar uma opção acessível de consumo ao público foi “Thisables”, da rede de lojas de móveis e decoração Ikea. O projeto consistiu na criação de peças que adaptam móveis para serem utilizados por pessoas com diferentes tipos de restrições de mobilidade. A ideia do escritório israelense da McCann, que criou a campanha, era realmente tornar aquilo inclusivo. Por isso, a Ikea disponibilizou em seu site os protótipos dos objetos, para que pudessem ser copiados em impressoras 3D.
Durante o Festival, o brasileiro Jaime Mandelbaum, chief creative officer (CCO) da VMLY&R na Europa, que presidiu o júri de Brand Experience & Activaction, comentou a respeito do tema da inclusão na indústria publicitária. “As empresas estão começando a sair do discurso, para, de fato, começar a fazer cosias práticas. Claro que ainda existem marcas que abraçam uma causa por ela estar em alta ou pelo marketing, mas vejo um número grande de empresas começando a acordar para o fato de que um grupo muito significativo de consumidores têm experiências completamente diferentes em relação aos outros”, declarou.
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