Meio & Mensagem
12 de janeiro de 2016 - 9h55
Por Bárbara Sacchitiello e Alexandre Zaghi Lemos
Existem muitas mulheres atuando em agências de publicidade, algumas delas em funções diretivas. Mas há um reduto altamente masculino nessas empresas: a área de criação. Considerando as grandes agências do Brasil, a presença feminina na criação é, em média, inferior a 20%.
Entre os dias 14 e 22 de dezembro, a reportagem de Meio & Mensagem ouviu 30 agências listadas entre as maiores do País. Perguntou quais eram os profissionais líderes das áreas de criação, quantas pessoas atuavam em seus departamentos criativos e quantas delas eram mulheres. No total, são 1531 criativos, sendo 301 mulheres.
As 30 empresas envolvidas informaram haver 192 profissionais de criação em funções de liderança – de presidentes , vice-presidentes ou diretores de área. Deste total, apenas 11 são mulheres – menos de 6% do total.
Entre as pesquisadas, a única equipe de criação comandada por uma mulher é a da FCB Brasil, que tem à frente a CCO Joana Monteiro (considerada a mulher mais criativa do mundo em 2014 pela Business Insider e vencedora do Prêmio Caboré 2015 na categoria Profissional de Criação. Coincidentemente, uma das quatro únicas agências onde o índice de presença feminina na criação é igual ou superior a 30% é a FCB (37%). – as outras são a Heads (32%), Grey (30%) e Escala (30%). Veja o quadro, elaborado de acordo com informações fornecidas pelas próprias agências:
Histórias de sempre
A resistência do mercado publicitário em assimilar as mudanças sociais e fazer um retrato mais fiel de homens e mulheres na comunicação pode ser atribuída a pouca diversidade no departamento criativo. Este não é, no entanto, um problema particular do Brasil. Globalmente, a questão já foi observada e vem despertando iniciativas para tentar reverter o desequilíbrio.
Nos Estados Unidos, a publicitária Kat Gordon usou a clareza numérica para comprovar a pouca representatividade feminina na publicidade e criou a The 3% Conference. O número representa a realidade daquele país: apenas 3% do grupo de diretores de criação das agências norte-americanas é formado por mulheres.
“Precisamos trazer essa discussão à tona e sermos agentes e não vítimas dela. Os homens precisam fazer parte dessa conscientização e, junto com as mulheres, compreender porque isso acontece”, pontua Ana Paula Cortat, chief strategy officer da Pereira & O’Dell.
Para Maíra Liguori e Nana Lima, sócias da consultoria Think Eva, cuja função é auxiliar marcas a se comunicarem com o universo feminino, são duas as principais razões que afastam as mulheres das bancadas de criação. A primeira é a própria hostilidade do ambiente de trabalho. “Trabalhei em agência e existe muito preconceito, muita opressão. A grande quantidade de homens que reproduzem comportamento machistas acaba afastando as mulheres”, conta Nana.
Outro fator seria a exaustiva carga de trabalho. “Nas agências, existe a cultura de que quanto mais horas a pessoa trabalha, mais valorizada ela é. Para a mulher, que geralmente tem de conciliar a carreira com a rotina de casa e com a maternidade, aquilo se torna inviável”, complementa Maíra. Carla Alzamora, diretora de planejamento da Heads, concorda com o raciocínio. “Historicamente, a criação foi incentivada a ser um ambiente pouco convidativo às mulheres”, diz.
Sem presença feminina, segundo ela, é natural que os velhos estereótipos continuam sendo reproduzidos. “São pessoas parecidas, com histórias de vida semelhantes, classes sociais iguais, que tendem a passar adianta as piadas e os clichês que já não servem mais”, pontua Carla. “Não dá para esperar que apenas homens, em sua maioria brancos, heterossexuais, de classe alta, com intercâmbios e experiência internacionais, compreendam o que uma mulher deseja e como ela deve ser abordada”, pontua Maíra.
*Colaborou Isabella Lessa
A íntegra desta reportagem está publicada na edição 1692 de Meio & Mensagem, disponível para assinantes nas versões impressa e também para tablets iOS e Android.