Renato Rogenski
25 de março de 2020 - 12h00
Trabalhando em Paris, o brasileiro Ricardo Dolla está desde o dia 16 de março em quarentena (Crédito: Veroniquede-Vigueries_GettyImages)
A França é um dos países mais atingidos até o momento pelo coronavírus Covid-19 em todo o mundo. Além dos impactos na sociedade em geral e nos mais diversos aspectos econômicos da nação, a pandemia também foi responsável pelo adiamento do Cannes Lions, o mais tradicional festival de criatividade global, que acontece anualmente na Riviera Francesa. O evento, que aconteceria de 22 a 26 de junho, agora tem como previsão a realização entre os dias 26 e 30 de outubro.
Independentemente da premiação, o mercado publicitário local tenta enfrentar a crise e seguir seus caminhos. Desde agosto de 2018 morando na França, onde é diretor de criação EMEA da VMLY&R/ Red Fuse, em Paris, o brasileiro Ricardo Dolla compartilha a seguir sua nova rotina no trabalho remoto, as medidas adotadas na agência para lidar com o momento, e as percepções sobre a sociedade e o mercado francês.
M&M — Como a agência está conduzindo o trabalho neste período?
Ricardo Dolla — Estamos todos trabalhando de casa desde o dia 16 de março. Mas, mesmo antes, os funcionários já tinham a opção de fazer o home office. Não só a agência, mas o grupo todo em si está dando muito suporte aos funcionários. Temos uma ferramenta de troca de informação que está funcionando surpreendentemente bem. A coisa pega quando precisamos acessar o servidor local da agência, mas os clientes estão sendo superparceiros e compreensivos. O importante é preservar a saúde coletiva, e estamos fazendo isso sem parar a nossa entrega.
M&M — A campanha de algum cliente já sofreu reflexos?
Ricardo Dolla — Sim. Tivemos que adiar o lançamento da primeira campanha global de marca da Colgate aqui na Europa. O cliente sentiu que não era o momento de fazer esse movimento agora. E pessoalmente, concordo. A campanha está pronta, têm diversas peças redondas e creio que na hora certa será lançada. Nesse momento, um player importante como a Colgate-Palmolive pode ajudar de diversas maneiras, inclusive informando e educando a população. E acho que eles pretendem fazer isso.
M&M — Como está o clima e o sentimento das pessoas e do governo?
Dolla – Antes do pronunciamento oficial do governo (14 de março), estava todo mundo meio preocupado. E ficou ainda mais quando o presidente mandou fechar estabelecimentos não essenciais. Um dia depois, no entanto, houve eleições municipais e a população saiu para as ruas e se sentiu à vontade, até demais. Foi então que o presidente finalmente proibiu deslocamentos que não sejam a trabalho, visita médica e compras básicas por pelo menos 15 dias. A partir daí o isolamento começou a realmente funcionar.
M&M — Qual é o impacto inicial dessa pandemia por aí?
Dolla — Impossível medir as consequências agora. Mas serão enormes, uma vez que elas vão afetar os clientes e no fim devem nos atingir também. Queria ser otimista nessa resposta, mas acho que nem a Pollyanna iria conseguir.
M&M — O que já mudou no comportamento de consumo até o momento?
Dolla — Isso é muito louco. Uma rede de supermercado foi à TV pedir para comprarem menos. Porque essa busca desenfreada por estoque caseiro levou a falta de alguns produtos e as redes de logística não conseguem acompanhar. Acho muito legal o movimento de marcas que se posicionaram no sentido de ajudar a população. A LVHM, por exemplo, está usando parte da sua produção de cosméticos de luxo para fabricar álcool em gel e distribuir nas áreas mais sensíveis.
M&M — Quais segmentos devem ser mais afetados neste período de pandemia por aí?
Dolla — Eventos. Desde pequenas casas de show, museus, competições esportivas, entre outros. O turismo obviamente vai sofrer um baque inestimável, assim como o setor de alimentação. É bem verdade que por aqui foi lançado um plano de apoio financeiro e o cancelamento de taxações básicas como água, eletricidade, gás e aluguel. A única certeza é que agora a melhor coisa a ser feita é ficar em casa. E agora, sendo Pollyanna, esse momento vai nos ensinar como trabalhar de casa pode ser supereficaz.
Crédito da imagem de topo: DKosig/iStock