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Como as marcas dialogam com a economia circular

Empresas estão resgatando embalagens retornáveis, criando materiais a partir de resíduos e se aliando a agentes civis para reforçar sustentabilidade


3 de junho de 2019 - 15h40

Foto: Pexels

O desenvolvimento de novos materiais industriais, o resgate de embalagens retornáveis e o diálogo entre empresas e o poder público são apontados como potenciais soluções para o desperdício de recursos e o descarte indevido de resídios na cadeia industrial. Sob muitos aspectos, marcas estão sendo pressionadas a adotar princípios da economia circular, tema que foi presente em diversos painéis do Festival Path, que aconteceu no último final de semana em São Paulo. No festival, representantes de empresas como Ambev e Coca-Cola, assim como especialistas em políticas sustentáveis, falaram do desafio de escalar estas práticas no Brasil e no mundo.

Em muitos casos,  polices empresariais começam pela reciclagem e pelo manejo do lixo, seja ele industrial ou do consumidor final. A Coca-Cola e a Ambev, por exemplo, há dois anos criaram a iniciativa Reciclar Pelo Brasil, que hoje conta outros dez parceiros, como Vigor e Nestlé. A iniciativa oferece apoio a mais de 160 cooperativas de catadores de material reciclável no País.

“Inovação não é sempre sobre tecnologia, mas sobre romper barreiras culturais entre empresas. Elas continuarão sendo concorrentes e competindo entre si, mas quando o tema é reciclagem e sustentabilidade, não vale a pena competir”, ponderou Thais Vojvodic, gerente de sustentabilidade da Coca-Cola Brasil, durante o Path. No Brasil,  estima-se que cerca de 95% do lixo reciclável passe pelas mãos dos catadores e cooperativas, e que apenas 5% passem por órgãos oficiais e iniciativas municipais.

Empresas também têm voltado a investir em embalagens retornáveis e em logística reversa. O problema, contudo, é reeducar o consumidor a adotar um modelo de consumo que, em geral, já foi abandonado. “No caso dos retornáveis, há o desafio de incentivar o consumidor a adotar um hábito antigo. A indústria levou um século para ser construída com base na conveniência. Agora, passa por um processo de se olhar no espelho de de não ter medo de se reconhecer como parte do problema”, diz Thais.

Em janeiro, o CEO da Coca-Cola, James Quincey, esteve no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, para compartilhar suas metas globais relacionadas à economia circular. Até 2030, a companhia quer coletar e reciclar 100% de suas embalagens. A Nestlé também tem a mesma meta, com prazo até 2025.

Richard Lee, head de sustentabilidade da Ambev, afirma que práticas ligadas à sustentabilidade devem deixar de ser vistas como branding, mas encaradas como parte do core business das empresas. “Se não tivermos uma bacia hidrográfica saudável, não conseguimos operar adequadamente”, exemplifica. Além da iniciativa de logística reversa, a empresa tem trabalhado junto a startups e universidades para incorporar soluções sustentáveis.

Novos Materiais

O desenvolvimento de materiais industriais de baixo impacto ecológico também está no radar de empresas e designers de produto. A pesquisadora holandesa Inge Slujs, mestre em novos materiais pela Central Saint Martins, de Londres, esteve no Path para mostrar opções de materiais fabricados a partir de resíduos. Um deles é o Plasma Rock, uma espécie de rocha processada a partir de resíduos de aterros sanitários e que pode servir como alternativa a objetos de plástico e metal. O material ainda está em teste, sem fins comerciais.

“Do ponto de vista econômico, pode parecer difícil e custoso desenvolver e criar valor em cima de um material novo, mas acredito que sempre é possível criar uma narrativa em cima dele”, disse Inge.

A Adidas, por exemplo, decidiu aproveitar um material sustentável e incorporá-lo ao storytelling de seus produtos: este ano, comprometeu-se a produzir 11 milhões de tênis a partir de plástico descartado no oceano. O design e as cores dos calçados da linha fazem alusão à vida marinha.

Diálogo integrado

Segundo o especialista em sustentabilidade urbana Fernando Penedo, que já atuou como consultor junto a mais de 400 empresas, há um descompasso entre a atuação de empresas, sociedade civil e governos no âmbito da sustentabilidade.

“É muito difícil vermos iniciativas de sustentabilidade das empresas sendo criadas junto à sociedade civil. Além disso, geralmente empresas privadas não querem se misturar com assuntos públicos, o que é necessário. Hoje em dia, quem cuida do pós-consumo no País é apenas o poder público”, ponderou. Como exemplo, ele cita a cidade de São Paulo, que gasta sozinha mais de R$ 1 bilhão anuais para coletar e transportar o lixo do município.

Daniela Lerário, bióloga e especialista em gestão de resíduos, afirma que outra lacuna é a falta de dados e de controle sobre o destino e fim dos resíduos recicláveis no País. “De tudo o que consumimos, cerca de 93% é reciclável, mas isto não significa que este material seja efetivamente reciclado”, conta. Daniela já atuou como gestora de sustentabilidade no Grupo Pão de Açúcar e hoje é CEO da TriCiclos Brasil, empresa especializada em economia circular.

Thais, da Coca-Cola, explica que a carga tributária a produtos reciclados é outro empecilho às iniciativas de reciclagem das marcas. “Um produto que já pagou toda a sua cadeia tributária, como uma garrafa de PET, quando é reciclado paga o mesmo valor novamente, enquanto o descarte de lixo tem custo menor. Se não houver um incentivo, a reciclagem sempre vai parecer economicamente inviável para algumas empresas”, finaliza.

 

 

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