Meio & Mensagem
7 de novembro de 2019 - 6h01
Mark Zuckerberg (crédito: Justin Sullivan/Getty Images)
Por Garett Sloane, do AdAge*
Um novo acervo de mais de sete mil comunicações internas do Facebook oferece uma nova visão das deliberações da empresa sobre privacidade e dados e repete alegações de que a rede social recompensou os parceiros com acesso às informações dos consumidores enquanto frustrava os rivais ao limitar sua capacidade de jogar em sua plataforma.
Os documentos divulgados na quarta-feira compreendem a segunda rodada de um processo judicial na Califórnia, no qual um desenvolvedor de aplicativos chamado Six4Three está processando o Facebook por supostamente restringir sua capacidade de usar a plataforma, cortando o acesso aos dados disponíveis para outros desenvolvedores.
Na quarta-feira, milhares de páginas de documentos judiciais e e-mails foram divulgados online, oferecendo a oportunidade de aprofundar nas deliberações do Facebook, de 2008 a 2016, período que incluiu o esforço da empresa para abrir o capital, em 2012, quando precisava crescer receita.
Em uma comunicação, o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, se preocupa com os próximos aplicativos de mensagens que pegam carona no Facebook para aumentar seus serviços em 2013: “Acho que devemos bloquear os anúncios de WeChat, Kakao e Line”, escreveu Zuckerberg. “Essas empresas estão tentando construir redes sociais e nos substituir. A receita é irrelevante para nós em comparação com qualquer risco. Concordo que deveríamos usar anúncios para promover nossos próprios produtos, mas ainda assim impediria que empresas que competem com nosso core obtivessem qualquer vantagem de nós. Também continuaria bloqueando o Google, mas não estenderia o bloqueio a mais ninguém”.
O procurador-geral da Califórnia, Xavier Becerra, apresentou na quarta-feira um processo contra o Facebook, apelando à suprema corte do estado para impor uma intimação contra a empresa. Becerra está entre as dezenas de procuradores gerais que investigando as práticas de compartilhamento de dados do Facebook.
Becerra disse que o Facebook não cooperou na entrega de documentos internos relacionados ao caso. “O Facebook não está apenas continuando a se arrastar em resposta à investigação do procurador-geral, mas está falhando em cumprir intimações e interrogatórios legalmente emitidos”, segundo a petição de Becerra.
A Becerra está solicitando e-mails e outros documentos internos de Zuckerberg e Sheryl Sandberg, diretora de operações do Facebook. O procurador-geral quer ver como os executivos do Facebook elaboraram suas políticas de dados entre 2012 e 2015. Becerra está interessado em saber se o Facebook aproveitou os dados para beneficiar os parceiros e se alguma vez usou dados como incentivo para gerar receita com anúncios.
O procurador-geral está solicitando “toda comunicação de 2012 a 2015 referente ao acesso condicional a informações do usuário sobre gastos com publicidade ou outros pagamentos”, entre outros documentos.
Na maior parte, os novos documentos judiciais do Facebook jogam luz sobre preocupações acerca de rivais e proteção dos negócios. Muitos dos tópicos já foram revelados no ano passado, quando um parlamentar britânico os divulgou durante a investigação do Reino Unido no Facebook. O Reino Unido está entre muitos governos que pressionam o Facebook por lapsos de privacidade e proliferação de desinformação, principalmente da Rússia.
Os documentos também mostram como o Facebook trabalhava com marcas de grande nome – e contra rivais desprezíveis –, oferecendo um raro vislumbre da estratégia de uma das empresas mais valiosas do mundo.
Os advogados do Six4Three estão tentando vincular o caso a preocupações maiores sobre o Facebook coletar dados sobre os usuários. O caso tenta traçar uma linha direta de Zuckerberg redigindo políticas de privacidade em tempo real, enquanto a empresa se apressava em direção a uma oferta pública de ações, em 2012, e para abusos de dados em 2016 por empresas como a Cambridge Analytica. Essa foi a empresa de dados de terceiros acusada de acessar ilicitamente informações sobre consumidores em até 87 milhões de usuários do Facebook. A Cambridge Analytica foi acusada de usar os dados para influenciar a opinião pública durante a corrida presidencial dos EUA.
O Six4Three criou um aplicativo chamado Pikinis, que os usuários do Facebook poderiam instalar na rede social para ver fotos de seus amigos em trajes de banho. Em 2014, o Facebook desativou o acesso dos Pikinis à interface de programação de aplicativos (API) da rede, que fornecia os dados que permitiam pesquisar nas fotos dos amigos.
Essa briga por fotos de maiô está no coração do acesso à API que permitiu que empresas como a Cambridge Analytica acessassem os chamados “dados de amigos” e criassem perfis para milhões de usuários inocentes. A Cambridge Analytica distribuiu aplicativos de questionário de personalidade para milhões de pessoas e, ao fazer o download dos aplicativos, eles também teriam permissão para acessar listas de amigos e dados do Facebook desses amigos.
O Facebook atualizou suas políticas em 2014 para impedir que os desenvolvedores utilizem os dados de amigos. Após os problemas de privacidade descobertos pelas consequências do episódio Cambridge Analytica, o Facebook revisou todos os privilégios da API, restringindo o acesso de terceiros à plataforma e revisando as práticas de dados dos parceiros.
O Six4Three argumenta que o Facebook induziu os desenvolvedores a criar serviços na plataforma, apenas para alterar injustamente suas políticas e prejudicar seus negócios. “Em nenhum momento o Facebook gerenciou sua plataforma como um campo competitivo”, cobra a empresa.
Os e-mails internos do Facebook têm como objetivo mostrar que a rede social não estava tão preocupada com privacidade como uma receita. O autor da queixa alega que o Facebook alterou o acesso aos dados do consumidor a parceiros que gastaram dinheiro em anúncios. Enquanto isso, aos concorrentes estava sendo negado o mesmo nível de acesso.
O Facebook não fez comentários sobre os últimos e-mails divulgados, mas disse que documentos vazados anteriormente interpretam mal os fatos. Os documentos “…são apenas parte da história e são apresentados de uma maneira muito enganadora, sem contexto adicional”, disse o Facebook ao AdAge no momento do primeiro vazamento de e-mail.
* Tradução: Fernando Murad