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Web Summit e incentivos públicos foram molas propulsoras para tornar Portugal polo de inovação atrativo para startups e empreendedores, servindo como porta de entrada para a Europa
Web Summit e incentivos públicos foram molas propulsoras para tornar Portugal polo de inovação atrativo para startups e empreendedores, servindo como porta de entrada para a Europa
Meio & Mensagem
28 de outubro de 2022 - 20h12
Carolina Huertas e Thaís Monteiro
O Web Summit foi criado em 2009 em Dublin, na Irlanda, mas passou por Lisboa em 2016 e 2017. O sucesso na capital portuguesa foi tanto que, ao se deparar com uma disputa com a Alemanha para ser sede do evento, em 2018, o governo português anunciou um investimento público e anual de € 11 milhões na contratação do Web Summit por dez anos. Em 2021, o evento se consolidou como a maior conferência de tecnologia da Europa e Portugal, por sua vez, como um polo de inovação. Mas não foi sem esforço.
O país vive situações econômicas delicadas há alguns anos. Em 2008, se viu em sua maior queda devido à crise imobiliária iniciada nos Estados Unidos. Ao não conseguir se recuperar, o governo solicitou um pacote de resgate no valor de € 78 bilhões à União Europeia e ao Fundo Monetário Internacional (FMI). O resgate não sanou os desafios relacionados aos salários de funcionários públicos e aposentadorias, aumento de impostos, desemprego, entre outros. Nas trocas de governo e reajustes de planos, Portugal viu na tecnologia a oportunidade de voltar a crescer, principalmente pelo capital estrangeiro que se interessou nos salários mais baixos, qualidade de vida, maior segurança e no território como porta de entrada para a Europa. Assim, o poder público passou a criar incentivos para a formação de hubs de inovação.
“As crises econômicas recentes alertaram o estado português sobre a necessidade de diversificar sua economia. Forte em turismo e com algumas vertentes industriais ou ainda ligadas a produtos tradicionais como o vinho, cortiça etc., Portugal, com uma dívida pública alta, sempre foi muito vulnerável a choques externos”, descreve Benicio Filho, sócio e country manager no Brasil da Atlantic Hub, empresa que, em conjunto com a Federação das Câmaras Portuguesas de Comércio no Brasil e a NoGap Ventures, organiza a Missão Web Summit, iniciativa de negócios, tecnologia e inovação que conecta empresários brasileiros com o ecossistema empreendedor de Portugal. Segundo ele, um dos pilares deste novo movimento econômico é o fluxo de entrada de profissionais de demais países em terras ibéricas.
A iniciativa privada não ficou longe dessa ressurreição. Empresas e venture capitals também atuam na criação de hubs ou funcionam como incubadoras para a entrada de novas empresas no mercado. As Câmaras de Comércio Brasil-Portugal e parceiros auxiliam no diálogo entre empresários de ambos os países, assim como nos processos de internacionalização e instalação da empresa no continente europeu.
Os esforços de ambas as partes deram origem a um polo de inovação localizado na ponta da Europa do lado do Ocidente, que é o que Benicio Filho descreve como o maior diferencial. “Cada polo tem suas diferenciações, mas o que torna Portugal mais atraente é, sem dúvida, ser a porta de entrada para a Europa, mercado com mais de 500 milhões de habitantes, ser um ótimo local para validar soluções B2B e ter boas condições para empreender”, descreve. Em resumo, os elementos atrativos são: condições para empreender, acesso a crédito e recursos, mão de obra, universidades, incentivos públicos, condições de moradia e acesso a qualidade de vida.
CEO da startup brasileira Alana AI, que estará nesta edição do Web Summit, que acontece de terça-feira, 1º, a sexta-feira, 4, Marcel Jientara comenta que Portugal é visto como um espaço de oportunidades tanto para uma melhor qualidade de vida, como sendo uma porta de entrada para o mercado Europeu para as startups brasileiras, pelas semelhanças culturais, de língua e compatibilidade de fuso horário. Porém, o empreendedor afirma que é preciso ter clareza sobre o objetivo da empresa na região, pois se o interesse for focado em vendas, por exemplo, talvez não seja uma movimentação interessante, uma vez que é um mercado menor que o brasileiro. A Alana está prestes a abrir seu primeiro escritório no interior do país, em Leiria. Ele aponta que o objetivo na região é o desenvolvimento de talentos e a ida ao evento também fará parte da construção desse novo momento.
Como resultado da consolidação de Portugal como um hub de inovação, hoje, mais de 70% das startups portuguesas são compostas por estrangeiros, diz o executivo, o que gera novas conexões globais e a mistura de cultura acaba trazendo um novo olhar para as estratégias. “Pensar global é uma exigência e em Portugal essa é a regra do dia”, afirma.
Caio Noronha, CFO da startup Educbank, também brasileira, comenta que para as startups gerarem valor em uma economia, é necessário contar com alguns players te ajudando a operar de forma sustentável. Ele afirma que muita coisa vem das próprias políticas do governo de incentivo a criação de desburocratização da geração de novos negócios, do fomento das redes de empreendedorismo para a geração de conhecimento e da formação de uma comunidade de investidores, além dos custos iniciais que costumam ser altos.
“Vem muito da política de cada país. Portugal, especialmente, vem fazendo um trabalho interessante nesse sentido e Lisboa possui parte da câmara com essa meta de ser cada vez mais um celeiro de startups, com o desejo de ser a capital do empreendedorismo. Quando você tem o governo e pessoas importantes da sociedade enxergando valor nessa tese, fazendo tudo que é possível para gerar um ambiente competitivo para as startups, tem um grande potencial de acontecer”, reflete.
O Web Summit contribuiu com a atração de pessoas e players internacionais para Portugal com o objetivo de discutir o que há de mais moderno. Na perspectiva de Felipe Matos, presidente da Associação Brasileira de Startups e CIO na neouniversidade tech Sirius, Portugal se tornou importante porta de entrada dos brasileiros para a Europa, e os incentivos públicos abriram as portas para suas empresas. “Há comunidades de discussão com ambas as comunidades. Startups brasileiras interessadas no mercado português têm participado do próprio Web Summit como uma forma de se aproximar desse mercado. Existem alguns programas do governo português que oferecem visto, apoio com aceleração e espaço de escritório, dentre outros benefícios para startups brasileiras que queiram se instalar no país”, coloca.
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