Qual é o papel das marcas na volta do culto à magreza?
Depois da valorização da pauta, com o avanço do movimento Body Positive, mercado estaria vivendo um momento de triagem
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Taís Farias
13 de maio de 2024 - 6h00
Desde o ano passado, a moda e a beleza vêm acompanhando o retorno da estética característica do início dos anos 2000. Entre as sobrancelhas finas e as calças de cintura baixa, reside um conceito preocupante: o culto à magreza excessiva. Evidências desse movimento podem ser vistos nas redes sociais, nos desfiles de moda e em outras referências estéticas e culturais.
Em paralelo, um levantamento da Kinea, divulgado pela Reuters, indica que o mercado de produtos voltados para o emagrecimento pode chegar a US$ 100 bilhões na próxima década. Os protagonistas desse movimento são remédios destinados a diabetes tipo 2, mas que causam o emagrecimento. Nas redes sociais, não são poucos os usuários que dividem como remédios, como Ozempic, Wegovy e Mounjaro, podem ser usados para fins estéticos.
A exaltação da magreza nas redes coloca em alerta, mais uma vez, as discussões sobre a pressão estética e o quanto as marcas de beleza e moda estão, de fato, trabalhando para incluir a diversidade de corpos na sua comunicação e estratégia.
Para Mônica Gregori, cofundadora e coCEO da Cause, é preciso considerar que essas companhias, junto com outras fontes, foram responsáveis por construir os padrões que se perpetuaram ao longo dos anos. “São séculos de construção para pouco tempo de desconstrução”.
Nesse sentido, o mercado viveria agora um momento de triagem entre as marcas que se apropriaram do tema como um recurso estético e discursivo — e aquelas que realmente estão comprometidas em minimizar os danos causados no passado. “Não chamaria de retrocesso, mas de um ajuste natural para diferenciar quem faz realmente pela causa e quem estava navegando na superficialidade”, resume Gregori.
Krizia Gatica, especialista em tendências na WGSN, defende que é preciso refletir sobre uma falsa sensação de que a associação entre moda, beleza e magreza foi superada. “Embora tenhamos vivido um período de forte questionamento sobre essa relação tóxica, o retorno desse arquétipo só prova que esse assunto ainda não foi resolvido, apenas mascarado”, explica.
Ela ressalta que a cobrança, nos últimos anos, foi importante para que as companhias estabelecessem a discussão com o público e criassem mais identificação, já que uma grande parcela da população não se sentia representada pelos corpos expostos nas publicidades. Mas é preciso evoluir a estratégia com ações que vão além da comunicação.
“A indústria como um todo precisa ser povoada de corpos e mentes diversas, em todos os pontos da cadeia, para que isso comece a ganhar consistência na prática”, aponta Gatica.
Nesse cenário, as redes sociais e a tecnologia criam um efeito duplo. Se, de um lado as redes serviram como plataforma para que mulheres expusessem os efeitos negativos da pressão estética nas suas vidas — e se colocassem como exemplos menos hegemônicos de beleza–, elas também serviram para amplificar o número de estímulos e reforços de ideais inalcançáveis e procedimentos invasivos.
“O que essas pessoas estão postando e o que estão reproduzindo impacta muito no imaginário das mulheres e meninas. Elas se inspiram no que estão vendo lá”, explica Andreza Graner, diretora de marketing de Dove, marca da Unilever. No início do ano, viralizou nas redes sociais o perfil de algumas influenciadoras virtuais criadas em inteligência artificial com a proposta de serem “mulheres ideais”. É o caso de nomes como Emily Pellegrini e Lexi Love.
Esteticamente, o resultado é parecido com os ideais que moldaram o padrão de beleza contemporâneo. Figuras extremamente magras, mas com curvas desenhadas. “A inteligência artificial tem todo o potencial de desenvolver a criatividade e o acesso, mas ao mesmo tempo reflete os estímulos que nós estamos construindo como sociedade”, considera a executiva de Dove.
A proposta foi mote da campanha “The Dove Code”, criada pela Soko, que marca os 20 anos do movimento Real Beleza de Dove. A ação se propõe a transformar as mulheres geradas por IA, já que suas aparências continuam refletindo estereótipos. A plataforma de Dove pela beleza real nasceu em 2004, com uma campanha criada pela Ogilvy.
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