Penalidade Máxima: como as investigações impactam o futebol
Esquema de fraudes mancha a imagem do maior campeonato nacional e acelera debates sobre regulamentação das empresas de apostas
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Valeria Contado
12 de maio de 2023 - 13h55
A operação Penalidade Máxima, que começou em abril deste ano, quando o Ministério Público de Goiás (MPGO) iniciou uma investigação sob a suspeita de manipulação de jogos do Campeonato Brasileiro, nas Séries A e B. As acusações de fraude, que estão sendo consideradas por muitos como um dos esquemas mais graves envolvendo o futebol brasileiro, levantam debates sobre a importância da regulamentação das casas de apostas no mercado nacional.
No entanto, a notícia de supostos esquemas acabam manchando a imagem do Campeonato Brasileiro, segundo as palavras do presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ednaldo Rodrigues. Por esse motivo, a entidade que coordena o campeonato enviou um ofício à Presidência da República e ao Ministério da Justiça solicitando o acionamento da Polícia Federal ao caso com o objetivo de centralizar todas as informações a respeito da investigação.
A solicitação já foi respondida pelo Ministro da Justiça, Flávio Dino, que determinou que seja instaurado um inquérito na Polícia Federal, elevando a história para a esfera criminal. Além disso, o presidente da CBF espera que Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) – entidade que regulamenta e julga as leis no âmbito esportivo – sancione as punições cabíveis ao caso.
“Defendo a suspensão preventiva baseada em suspeitas concretas e até o banimento do esporte em casos comprovados. Quem comete crimes não deve fazer parte do futebol brasileiro e mundial”, disse Ednaldo em comunicado à imprensa.
Apesar disso, a CBF descartou qualquer possibilidade de paralisação da edição atual da competição, já que os jogos de 2023 ainda não foram alvos da primeira e segunda fase da operação Penalidade Máxima.
Vale reforçar, também, que até o momento foram investigados jogadores que atuam nas séries A e B da competição nacional e que agiram de forma individual. O número de acusados chega à 16 pessoas e clubes como Cruzeiro, Santos e Athletico-PR já anunciaram o afastamento dos suspeitos.
O Cruzeiro comunica que o atleta Richard está afastado preventivamente das atividades da equipe de futebol profissional.
— Cruzeiro 🦊 (@Cruzeiro) May 10, 2023
Com os desdobramentos dos casos de manipulação de jogos surgiu a urgência de uma regulamentação mais forte em relação às empresas de apostas. Por isso, nesta quinta-feira, 11, o Ministério da Fazenda divulgou a elaboração de uma Medida Provisória (MP) para regulamentar a atuação de casas de apostas esportivas no Brasil.
Segundo o texto, que será assinado pelos Ministérios da Fazenda, Planejamento, Saúde, Turismo e Esportes, o objetivo é estabelecer regras para a comunicação, publicidade e marketing das empresas de apostas esportivas e que essas sejam responsáveis por promover ações informativas e preventivas de conscientização de apostadores, bem como da prevenção do transtorno do jogo patológico, como forma de garantir a preservação da saúde mental dos deles.
A proposta é que essa regulamentação seja realizada em parceria com o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), que auxiliará na definição de regras para o horário de veiculação de propaganda e formato de anúncios online das empresas de apostas.
O CEO da Heatmap e especialista em marketing esportivo, Renê Salviano, acredita que essa é uma oportunidade para que a CBF e as entidades regulamentadoras se envolvam e profissionalizem mais o marketing esportivo. “Este pode ser mais um dos momentos importantes nesta caminhada rumo à profissionalização onde as marcas, instituições, veículos de comunicação, agências de marketing esportivo e todos stakeholders podem se unir para colaborar ainda mais pelo crescimento e desenvolvimento do segmento no país”, diz.
Atualmente, o Campeonato Brasileiro tem seis patrocinadores. O Assaí Atacadista é detentor dos naming rights da competição, enquanto a Galera.bet é a patrocinadora máster. Binance, Brahma, eFootball e Giroagro são as outras marcas na competição.
Até o momento, nenhum dos anunciantes se posicionou oficialmente sobre como está acompanhando ou entendendo a situação das investigações.
Para o professor de marketing esportivo da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Ivan Martinho, as acusações de manipulação geram notícias incômodas para os agentes envolvidos com o campeonato.
“Parceiros comerciais buscam lisura, transparência e alinhamento de propósito ao associarem suas marcas a produtos esportivos. Elas querem ter certeza que o ganhar versus perder seja definido somente por critérios relacionados a performance em campo”, destaca.
O especialista, no entanto, reforça que, apesar de o escândalo ser prejudicial para a imagem do campeonato, não é correto imaginar que todos são corruptíveis. “É possível imaginar que entidades, patrocinadores, detentores de direitos se reúnam para criar normas que mitiguem o risco, algo que já aconteceu em mercados mais maduros como o do futebol inglês, por exemplo”.
Com a expansão das casas de apostas no Brasil, essas empresas também ganharam força como grandes anunciantes do País. Por fazer parte do seu nicho, os campeonatos e clubes se tornaram alvos de seus investimentos financeiros.
“As marcas querem estar em projetos com valores alinhados aos que possuem em sua cultura organizacional. Acontecimentos como esse [das manipulações] trazem junto pontos negativos que devem ser apurados com extrema atenção e alto rigor de penalidade”, avalia Renê Salviano.
Atualmente, as marcas de apostas estão presentes nos intervalos, em veículos de mídia alternativa e tradicional, placas de publicidade, camisas de clubes e camarotes em estádios. Na série A do campeonato Brasileiro masculino, das 20 equipes participantes, 19 possuem relações de patrocínio com essas empresas.
Além dos clubes, algumas competições também são chanceladas por casas de aposta. A Copa do Brasil, por exemplo, tem a Betano em seu naming right.
Um estudo realizado pela Tunad analisou seis marcas e levantou as inserções publicitárias dessas empresas. A empresa que mais anunciou foi a Betnacional, com 13.317 veiculações na mídia. A segunda maior investidora foi a Betano, que teve 9.514 inserções publicitárias. Depois delas aparecem Sportingbet (7.816 inserções), Esportes da Sorte (3.931 inserções), Bet7.com (2.518 inserções) e Betfair.net (1.920 inserções).
Não é a primeira vez que o principal campeonato de futebol do País se vê em meio a polêmicas envolvendo combinações e apostas. Em 2005, o principal torneio nacional ficou marcado pelo escândalo da “Máfia do Apito”. Na ocasião, 11 jogos apitados pelo árbitro Edílson Pereira de Carvalho foram anulados por acusação de fraude. O esquema foi revelado pelo jornalista André Rizek, que trabalhava na revista Veja.
Além de Edílson, que foi preso na manhã seguinte à publicação da reportagem, o empresário Nagib Fayad, o “Gibão” e o árbitro Paulo José Danelon também foram detidos como participantes do esquema. A acusação era de interferência no resultados de jogos a fim de favorecer apostadores.
As partidas anuladas por decisão da Justiça Desportiva tiveram que ser revisitadas, ação que alterou a classificação na tabela. O Corinthians venceu dois clássicos (contra Santos e São Paulo) e conquistou pontos importantes para se consagrar campeão da edição.
Todos os personagens foram banidos do futebol e se tronaram réus em uma ação penal. No entanto, apenas cinco anos depois, em 2010, as fraudes esportivas foram tipificadas no estatuto do torcedor. Atualmente, a regra pode ser encontrada no Artigo 41-C na Lei nº 13.155, de 2015, que diz:
Solicitar ou aceitar, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem patrimonial ou não patrimonial para qualquer ato ou omissão destinado a alterar ou falsear o resultado de competição esportiva ou evento a ela associado. A pena é de reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos e multa, segundo a Lei nº 12.299, de 2010.
Já em 1982, a Placar revelou a Máfia da Loteria Esportiva. A fraude envolvia jogadores, técnicos e dirigentes cooptados a acertar resultados das partidas que estavam nos cartões da loteria oficial da Caixa Econômica Federal.
Na época, o meia Iago Padilha e o técnico Gregory Machado, sob a alegação de que atletas e dirigentes teriam vendido a partida em que foram derrotados pelo Bagé, deixaram o clube gaúcho Farroupilha .
O então repórter Sérgio Martins comandou a investigação que revelou a participação de 125 pessoas na manipulação de resultados também a favor de apostadores.
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