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“Racismo é um problema de toda a sociedade”, diz Aline Nascimento do ID_BR

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Marketing

“Racismo é um problema de toda a sociedade”, diz Aline Nascimento do ID_BR

Líder do pilar de empregabilidade do ID_BR comenta sobre a importância de as ações das marcas irem além do mês de novembro


23 de novembro de 2022 - 16h51

Segundo dados do relatório “Ações Afirmativas no Mundo Corporativo: um estudo sobre o impacto da diversidade no mercado de trabalho”, para cada 10% de elevação da diversidade étnico-racial, observa-se um aumento de quase 4% na produtividade das empresas. Com uma mudança do olhar para diversidade, incluindo a questão como elemento também de negócio, o tema é cada vez mais presente nas empresas. Se antes o mês de novembro era a única data em que as companhias tocavam no assunto, o cenário começa a mudar e o papel das marcas na pauta racial também. 

Para entender sobre os bastidores dessa transformação, Aline Nascimento, líder do pilar de empregabilidade do Instituto Identidades do Brasil (ID_BR), comenta a experiência da organização ao lado dos negócios nessa caminhada. De 2020 a 2022 a consultoria atendeu mais de 99 empresas, selando 39 empresas, atuando com treinamento de letramento em 82 e em 25 através do censo Étnico-Racial Interseccional.

 

Aline do ID_BR fala sobre o papel das marcas na pauta racial

Aline Nascimento, líder do pilar empregabilidade ID_BR (Crédito: Divulgação)

M&M – De que forma o fato de algumas marcas se posicionarem sobre a pauta racial apenas em novembro atrapalha a causa?  
Aline – Existem dois caminhos importantes que precisamos analisar. O primeiro ponto é que a galera, tanto o cliente externo quanto o público interno, já não aceitam mais. Existe uma pressão, uma geração que traz novos perfis profissionais, e estamos falando sobre inovação e construção de um ambiente mais agradável. Não adianta falar da pauta racial só em novembro e acreditar que todos os problemas do racismo acabarão ao longo do ano. Mas quando eu acendo ali a primeira luz, eu preciso entender que ela não se apaga com facilidade. Estamos em uma sociedade em que não tem como não cuidar. O exemplo que tivemos em 2020, com o caso da morte do George Floyd, é que não é aceitável que marcas utilizem situações de racismo para se promoverem. Para quem não lembra, muitas pessoas postaram telas pretas dizendo que apoiavam a luta contra o racismo. Tá, mas o que faziam efetivamente no dia a dia para a transformação? Qual é a estrutura? Quem está por trás? Outra coisa que também não adianta é chegar em novembro e colocar uma pessoa negra para falar com outra pessoa negra para falar sobre ‘o problema de vocês’. Isso também não adianta porque o racismo não é um problema das pessoas negras: é um problema da sociedade. Existe uma mudança de cobrança também. Não dá para as pessoas negras resolverem o problema do racismo, porque o problema do o racismo não é um problema só de pessoas negras. Precisamos nos aproximar para fazer algo de verdade. O segundo ponto é que não dá para se esconder [na desculpa] do’ estamos começando’.  Por que estamos começando há três anos trabalhando só como uma palestra?, Será que a marca não está sempre se resguardando no lugar do desconhecimento para não avançar com a pauta? Não adianta só falar sobre ignorância, não adianta dizer ‘eu não sei fazer vacina, então por isso eu não tomo vacina’, Não adianta estabelecer uma relação de distanciamento da pauta. O problema do racismo é um problema nosso porque ele é burro. O racismo faz com que a gente tenha cada vez mais problemas econômicos e que a gente nunca avance. Estamos sempre em crise, sempre em uma situação que cada vez mais delicada de saúde pública, porque não tem como cuidar de um vírus como a Covid protegendo só um grupo e deixando comunidades, como as as favelas, a mercê. Então, ou a gente trabalha de uma forma séria e conjunta, ou a gente não trabalha. Ou as marcas começam a transformar a sociedade e pensar isso como impacto ou elas podem ser cobradas mais tarde. Eu não quero que as pessoas sintam pena de mim, quero que a gente pense numa solução.

Meio & Mensagem – Hoje as marcas já olham pra questão racial durante o ano todo de uma forma mais ampla ou se muitas ainda atuam apenas em novembro?
Aline Nascimento – Não diria que a as marcas mudaram. Acho acho que a sociedade mudou e a forma de gerir negócio muda a partir de uma mudança de mercado. O avanço da tecnologia também faz com que a pauta racial não seja vista como a questão sazonal. Ainda temos o evento, mas essa pressão está acontecendo em todos os lugares e aí se a empresa não se posiciona e se comete alguns erros, vamos ter um público consumidor questionando-as em todos os lugares, cobrando e também não comprando. É preciso essa maturidade de perceber que não é uma bondade das empresas e sim uma estratégia de negócio frente a uma a sociedade consumidora que também está se modificando. E como o mercado está mudando, algumas instituições têm buscado mecanismos pra garantir que diversidade e inclusão sejam vista e estruturadas dentro das suas empresas. O que também não significa que a mudança não é genuína. 

M&M – Qual a importância dessa mudança de posicionamento diante do papel das marcas na pauta racial? 
Aline – As empresas acabam influenciando o cotidiano. A Unilever, por exemplo, está nos produtos que usamos no cotidiano e, portanto, trazer essas dinâmicas para o nosso cotidiano é trazer a pauta racial de uma forma mais frequente. Um exemplo é da marca Seda e como ,ao fazer suas propagandas, ativações e trazer cada vez mais essa percepção racial, faz com que a gente também tenha uma mudança, seja para o cuidados da beleza, para falar do cabelo, da importância dos cachos, de como é que a gente valoriza uma identidade negra. O impacto não é só na esfera corporativa, mas no cotidiano da sociedade. Falar sobre a importância das marcas incluírem é falar da transformação e da construção de uma sociedade mais justa, mais ética, mais equilibrada. Se as marcas possuem esse peso, eu diria, quase de um quarto poder institucional, não conseguimos nem mensurar esse impacto. Hoje, para falar de construção de carreira, qualquer profissional precisa colocar diversidade e inclusão como parte da sua trajetória. Aí, quando se começa a ter que falar sobre isso, é como uma sementinha que pega e que não conseguimos mais. Ao transformar a percepção de carreira a gente também impulsiona as mudanças de sociedade. Mas não pode ser só isso. As marcas também têm um poder gigante de fazer com que a gente tenha outras causas legislativas que também deem respaldos para mudanças estruturais que a sociedade precisa. Estabelecer um debate sobre a pauta racial é falar sempre de desenvolvimento econômico. Quando falo que preciso de política para aumentar a representação de pessoas negras nas universidades, ao mesmo tempo eu estou falando de capacitação de mais profissionais para atuar no mundo dos negócios. As marcas atuarem e se posicionarem é uma urgência de vida pra além de governos, para além de estruturas políticas.

M&M – Qual a importância das marcas atuarem com parceiros externos ?
Aline – O desafio de fazer de verdade tem a ver com mm se despir dos valores que já tinham dado como certos. Existe uma etapa inicial onde muitas das empresas vão falar sobre letramentos racial, aqueles momentos em que vamos usar experiências de pessoas negras ou experiências raciais diversas para conseguir dialogar com outros  conhecimentos de mundo. Então, se  estou em uma empresa que vai trabalhar com varejo, preciso entender como a pauta racial dialoga com a pauta do varejo. Ai, estarei falando tanto sobre a venda para o fornecedor direto, mas também de justiça climática e de impacto paras comunidades negras. É algo muito mais amplo porque tem a ver com diversidade enquanto negócio, mas também com ESG, como é que olhamos para a foto racial de uma forma mais ampla. O ID_BR tem hoje 39 empresas seladas. Temos um selo chamado “Sim a igualdade racial” com o qual construímos métricas de como as ações precisam ser construídas e como precisamos acompanha-las porque, muitas vezes as empresas vão acreditar que basta contratar pessoas negras. Nossa preocupação não é só com essa etapa inicial de contratar profissionais negros, mas com desenvolvê-los para assumirem outras posições e, principalmente, lugares de liderança. Estamos muito preocupados que pessoas negras estejam com o poder da caneta e que, daqui a três, cinco anos, exista uma quantidade maior de presidentes negros em grandes organizações no Brasil. Como trabalhamos em ecossistema, nós conectamos as nossas empresas para que elas possam conversar e trocar experiências. É importante que elas entendam como fazem a diferença, como participam desse ecossistema. Para integrar, o ID_BR tem eventos entre CEOs e presidentes de empresas para que possam conversar e dialogar sobre o que tem sido feito pra transformar e acelerar a pauta racial. Temos eventos feitos com CMOs, com pessoas que estão trabalhando com áreas de marketing nessas empresas que assumem uma posição estratégica e estão conjuntamente construindo e transformando essa pauta como prioridade nas suas empresas. Estamos ali para instigar a mudança, recomendar transformações, acompanhar esse cotidiano e entender como é que a gente pensa essas estratégias, mas também como é que conectamos outros colaboradores negros ,de outros tantos lugares, porque precisamos estabelecer uma rede em meio a uma ilha. 

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