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“Repor o primeiro semestre não existe”, diz diretora da Lupo

Carolina Pires, comenta as adaptações à pandemia, como a produção de máscaras


10 de julho de 2020 - 6h00

Carolina Pires: apoio à população e aos clientes (Crédito: Divulgação)

O primeiro nome da Lupo, empresa fundada em 1921 em Araraquara, no interior paulista, pelo imigrante Henrique Lupo, foi Meias Araraquara. Em 1937, mudou para Meias Lupo S/A, ambos indicando a categoria de produtos com que a companhia cresceu. Neste 2020, quando a empresa previa iniciar as celebrações para o centenário, que ocorre em março do próximo ano, veio o turbilhão da pandemia e a empresa teve de adaptar os planos da comemoração, feitos com a WMcCann, e desenvolver em tempo recorde uma nova habilidade: a produção de máscaras para prevenir o contágio pelo novo coronavírus. Na entrevista a seguir, Carolina Pires, diretora de marketing, produto e vendas da Lupo, conta os movimentos que levaram a marca a estar agora dos pés à cabeça dos consumidores.

Meio & Mensagem – Qual era o planejamento de marketing da Lupo para o primeiro semestre de 2020 até antes da pandemia e o que se tornou depois dela?

Carolina Pires – Havíamos planejado uma campanha belíssima para comemorar o centenário, que acontecerá em 21 de março de 2021. As ações, na verdade, iam durar um ano, começando em março de 2020. Mas tivemos de mudar todo o planejamento no sentido de apoiar a sociedade e as 472 lojas que temos com as marcas Lupo e Scala e os cerca de 35 mil pontos de venda multimarcas e pequenos varejistas onde atuamos. Fizemos muitas ações de comunicação, muito WhatsApp, muitos Stories, para ajudá-los a manter a conexão com seus clientes finais também.

M&M – A Lupo lançou produtos (máscaras e itens da linha Lupo Sport) com tecnologia antiviral e antibacteriana. Como tem sido a adesão dos consumidores a esses produtos?

Carolina – O que pandemia ensinou – a Lupo já tinha como valor, mas elevou à décima potência – foi a questão da empatia. Essa história começou, na verdade, em conversas que tivemos com a Santa Casa de Araraquara e vimos que havia uma necessidade urgente por máscaras, porque as farmácias começaram a vender para as pessoas e o preço começou a subir muito, saía de R$ 0,17 para R$ 1,17, R$ 1,50 – a máscara com TNT cirúrgico. Na mesma semana, o então ministro Mandetta deu uma declaração conclamando a indústria têxtil a colaborar na produção de máscaras de uso social, que seriam para a necessidade da população. Aí tomamos a decisão de ir para cima desse produto com toda força e nossa capacidade produtiva, mas com o que tivesse de melhor no mercado. Numa corrida contra o tempo, saímos conversando com nossos principais fornecedores, inclusive a Rhodia, com quem lançamos a primeira versão da máscara totalmente adaptada, com respirabilidade, sem concentração de umidade, preocupação com os gaps e com zelo pela modelagem. Desenvolvemos internamente o elástico para que tivesse a maior suavidade possível. Foi uma correria para fazer em 15 dias o produto “mais Lupo possível”. Já saía daqui bactericida, pronta para uso, e foi um sucesso. Rapidamente, produzimos 2 milhões de máscaras. Há umas quatro semanas, a Rhodia mostrou as aprovações e laudos deles para o fio “Bac off”. Ficamos encantados com o produto e fizemos os primeiros testes, a conversão e transferimos a tecnologia para essa nova máscara, que além de bactericida também inativa os vírus encapsulados. E o aditivo está no DNA do fio. É lavável quantas vezes for e continua inativando o vírus. Muitos tecidos do mercado só recebem um tratamento, um acabamento que sai na lavagem. A da Lupo, não. Esse aditivo do nosso fio está até numa lista dos órgãos americanos, entre os que combatem o coronavírus. Foi um sucesso e o que posso dizer é que o céu é o limite. Temos uma demanda gigante, as pessoas estão amando e estamos correndo para atender. Também percebemos que nossos pequenos varejos Brasil afora estavam sofrendo muito com o fechamento das lojas. Conseguimos direcionar esse produto para eles, às franquias e ao nosso e-commerce. A gente está concentrando nesses canais para, além de chegar à população, porque é um canal muito capilarizado, também ajudá-los a ter um produto para gerar um contato, publicar no Instagram, mandar por WhatsApp para seus clientes. Tanto que, com o produto, estamos mandando materiais para Instagram, ajudando nossos clientes varejistas a se comunicar. Todo nosso marketing macroestratégico virou microestratégico, para apoiar a pontinha de cada cliente – multimarcas e pequenos varejos – a se relacionar, a fazer um contato digital. Fiz um manual de como usar o Instagram, como abrir uma conta comercial para ensinar todos eles a fazerem isso.

Máscara social: item básico no processo de retomada (Crédito: Divulgação)

M&M – Preveem lançar outros itens com essas características agora no 2º semestre?

Carolina – Estamos com parte da coleção esportiva desenhada e desenvolvida. Temos linhas de produtos desenvolvidas com esse fio. Ainda não lançamos, porque ainda estamos concentrando toda a capacidade produtiva e matéria-prima nas máscaras, que são uma necessidade na retomada. A máscara antiviral vai ser um grande apoio à população para achatar a curva. Tão logo se estabilize essa demanda, a gente parte para o lançamento das outras linhas que já estão desenvolvidas.

M&M – Quantas máscaras a Lupo tem produzido?

Carolina – Aproximadamente 50 mil máscaras por dia. A princípio tomamos o cuidado de fazer apenas duas cores, preta e branca. Na máscara preta o fio vem tingido da Rhodia, e a branca é feita dentro da Lupo. Isso garante que a gente tenha mais certeza dos componentes do corante que a pessoa inala, não precisaria desenvolver esses testes; foi para ser mais rápido. A infantil virá com coloração, não foi lançada ainda, porque foram feitos testes para identificarmos o corante elegível. Será lançada em azul, uma única cor, para crianças de sete a 12 anos, pensando em apoiar a retomada das aulas em setembro, ensaiada por alguns estados. Deve chegar ao mercado em dez dias.

M&M – Imagino que com esse baque econômico violento, o orçamento de marketing tenha diminuído ou até sido destinado a outras ações. O que foi possível fazer nesse período, como foi reajustada também até a relação de vocês com a WMcCann?

Carolina – Seguimos com a parceria tranquila, a WMcCann entendeu a questão. Tivemos, sim, uma redução de investimento em mídia de massa, mas uma agenda em redes sociais seguiu com força. Como nossa campanha estava toda orçada, aprovada e dimensionada para o centenário, houve toda uma reviravolta para um novo planejamento e captação. Agora, será olhar mês a mês o caixa da empresa e ir aprovando as próximas campanhas. Não temos mais aquele planejamento com o horizonte de toda a verba planejada. Estamos fazendo “boi a bife”, como se diz aqui no interior. Vamos nesse super-horizonte estratégico que a gente tem hoje, de três meses, e vamos criando as campanhas. Estamos preponderantemente no digital, dentro daquele cenário do centenário em “stand by”.

M&M – Uma vez que o comércio agora, na maioria das cidades, já começa a ser reaberto, o tom da comunicação já poderá mudar um pouco, será possível aproveitar melhor as datas de varejo no 2º semestre?

Carolina – Dado o fato de a Lupo ser continental, com presença forte em todas regiões e estados do Brasil, que é um país imenso, temos uma não-compensação. Há locais que estão reabrindo e outros fechando agora. Temos uma campanha de retomada muito bonita e aprovada, que usa a hashtag #essencialmentebrasileira. Estamos trabalhando com essa questão de os nossos produtos serem essenciais, a Lupo originalmente trabalha com moda íntima, que as pessoas precisam. E associamos à brasilidade. As pessoas estão atentando para produtos locais, de origem nacional, e a Lupo se orgulha muito disso. O centenário era uma declaração de amor da Lupo pelo Brasil. Criamos uma campanha de retomada também com o “Lupo, essencialmente brasileira”. Estabeleci uma chave: quando tiver mais de 80% da rede Lupo com venda mais constante, sem abre e fecha, soltaremos a campanha. Para nos comunicar, falarmos um pouco de como acreditamos que tem que ser essa retomada: com amor, respeito pelo próximo. Por que é importante usar máscara, por que manter distância. Vamos trabalhar muito essa questão do amor, do respeito e da essencialidade.

M&M – Quais serão as principais mudanças no marketing no PDV antes de termos uma vacina para o coronavírus?

Carolina – Já desenhamos um enxoval de trade marketing todinho. Temos a rádio Lupo em todas as lojas, já fiz várias gravações de informações de comportamento, do que a Lupo espera dos seus clientes. Estamos gerando materiais de trade, como dispenser de álcool em gel, manual de controle do fluxo de clientes dentro da loja. Temos uma força de trade, com 100 promotoras de vendas, que estão sendo treinadas em distanciamento, pois elas percorrem todos os grandes clientes multimarcas; as consultoras de franquias também estão sendo treinadas para explicar ao franqueado a questão de como manejar loja, quantas pessoas podem entrar. Estamos criando materiais para que eles tenham condições de fazer essa retomada com consciência. Queremos que nossas lojas abram, mas na hora certa. Estamos muito zelosos neste momento, para que tudo aconteça da melhor forma possível.

M&M – A companhia ainda patrocina times de futebol ou migrou para os e-sports? Existe algum outro tipo de patrocínio?

Carolina – Reduzimos nossa participação no esporte. Temos patrocínios pontuais nos grandes jogos que fazem sentido e mantemos o time da cidade, a Ferroviária, que é o time do coração de Araraquara. Além de endomarketing com nosso funcionário, que é apaixonado pela Ferroviária, o time é querido nacionalmente. Gostamos de estar com eles, mas aumentamos muito os investimentos em e-sports. Atualmente, estamos com o INTZ e Team One, que são grandes parceiros. A entrega dos e-sports é incrível, quanto mais a gente vai para esse mundo, mais feliz fica com o retorno. A Lupo tem essa estratégia desde o lançamento não só para a marca esportiva, como também para a Lupo Urban, inspirada na realidade geek, mas que na verdade é para todo mundo, não somente para aquele “hard geek”. É uma marca para quem quer se expressar, e o geek se expressa dessa maneira incrível. Já fizemos três Comic Con e uma BGS. Essa linha, atrelada a nosso investimento em e-sports vem comunicando e trazendo a presença da Lupo para um público mais jovem.

M&M – A Lupo já teve de se reinventar uma vez em sua história. Como analisa aquela grande crise do passado, com esta que muitas empresas estão tendo de enfrentar agora?

Carolina – São crises. Ninguém comemora uma crise, mas a gente fica melhor, tira forças de onde não existe, cria coisas incríveis. A resiliência e a capacidade inventiva da cultura da Lupo nas duas é muito parecida. O que se reinventou, baseado no que ela tem de capital humano, é similar. A grande diferença é que naquela época havia uma crise financeira prévia na empresa, que teve de se reinventar porque existia um mercado, mas não existia como atender esse mercado. Agora, a Lupo é uma empresa sadia, caixa sólido, e é o contrário: o mercado fechou. A gente está se reinventando para estar disponível ao mercado de maneira diferente. Mas a capacidade inventiva, a cultura de não esmorecer e resiliência são as mesmas.

M&M – Acredita que as datas de varejo deste 2º semestre ajudarão até que ponto remediar perdas do primeiro? Já começaram a planejar as principais, Black Friday e Natal?

Carolina – Estamos com pensamento em Dia dos Pais, Dia das Crianças, Black Friday e Natal, mas são campanhas que terão a missão, no máximo, de atingir a média histórica do ano passado. Remediar o primeiro semestre, não deposito isso em campanha ou sazonalidade nenhuma. O que se perdeu no primeiro semestre… Temos de nos esforçar para matar no peito essa bola, porque não há reposição dessa venda. No segundo semestre, chegar à média do ano passado já será um sucesso inenarrável. Repor o primeiro, já aceitei que não existe. Minimizar um pouco o reflexo no ano, acho possível.

M&M – E o canal de e-commerce, como tem funcionado?

Carolina – Temos venda por e-commerce, cresceu muito, mas ainda é um canal muito pequeno em relação ao faturamento do grupo. Registramos crescimento, versus 2019, de 343%, em abril; 356%, em maio; e 215%, em junho. Mas ainda é pequeno, porque temos uma pulverização muito grande. O grupo, ano passado, faturou R$ 1,1 bilhão e o e-comerce, R$ 4 milhões. É muito incipiente, lançamos e-commerce há cinco anos. E existe um acesso muito fácil, porque temos grande presença física nos vários clientes. Agora, a partir deste ano, começamos a fazer a integração dos canais, a vender o comportamento omnichannel ao nosso cliente. Comprar num lugar e pegar em outro, escolher na loja e mandar entregar. A loja online nasceu, em princípio, para atender quem tem esse comportamento de compra e não necessariamente como um canal onde íamos investir horrores.  Agora, ele vai ser a cola que vai unir todos os canais de venda.

M&M – Em 2021, como vão tentar aproveitar a ideia – ou parte dela – para celebrar o centenário?

Carolina – A ideia é totalmente flexível para o ano que vem. O momento em que ela entrar será muito pautado pelo momento que o mundo e o Brasil estarão. É uma campanha linda, declaração de amor pelo Brasil, mas não deixa de ser uma festa. Então, a gente tem que fazer festa na hora certa. Brinquei que tenho licença poética para fazer 100 anos durante 2 anos, 2020 e 2021. A empresa, os parceiros, os varejistas, anseiam por essa festa. É uma relação muito querida. Tenho um cliente na Bahia que compra Lupo há 63 anos. Ele tem a primeira nota fiscal num quadro. Tem casos incríveis assim pelo Brasil afora, porque é uma marca centenária, cujo principal canal é o pequeno varejo do Brasil. Muita gente conhece a Lupo por nossas lojas exclusivas, mas elas representam 25% da Lupo; 60% são esses 30 mil pequenos varejos Brasil afora. É o nosso pilar e a gente quer sim uma campanha bonita, homenageando essas pessoas. A grande sacada era que por meio da campanha com o varejista íamos contar uma história ao consumidor final, colocar todos na mesma festa.

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