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“Além de Vale Tudo, não temos outras propostas de remake”, diz Amauri Soares

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“Além de Vale Tudo, não temos outras propostas de remake”, diz Amauri Soares

Diretor geral da TV Globo fala sobre os desafios pela atenção do público ao longo dos 60 anos e afirma que métricas de audiência não contemplam o alcance do conteúdo


24 de abril de 2025 - 15h37

Globo Amauri Soares

Diretor geral da TV Globo e dos Estúdios Globo, Amauri Soares fala sobre os desafios da emissora, que completa 60 anos no próximo sábado (Crédito: Manoela Mello/Globo)

A TV Globo completa 60 anos no próximo sábado, 26, com a convicção de que o alicerce sobre o qual estruturou sua estratégia de programação – a tríade jornalismo, entretenimento e esportes – seja mais potente do que nunca para a captação da atenção da audiência.

Responsável por planejar e levar ao ar todo o conteúdo da emissora líder em audiência no Brasil, Amauri Soares, diretor da TV Globo, dos Estúdios Globo e de Afiliadas, pontua que o mix de atrações e o fato de a empresa ser uma produtora de conteúdo brasileiro, voltada a entreter e informar os brasileiros, é o que acaba sendo seu maior diferencial.

A respeito da maior competição pela atenção das pessoas, o executivo da Globo admite que nunca houve tanta oferta de conteúdo em vídeo, mas acredita que, ainda que seja em meio a esse amplo cardápio de opções, o conteúdo da Globo se sobressai. “O problema é que a métrica de audiência não alcança isso”, pondera Soares, em entrevista concedida ao Meio & Mensagem há 15 dias.

Amauri Soares ainda falou sobre algumas estratégias de programação. Apesar de satisfeito com a repercussão inicial de Vale Tudo, o executivo garante que não existe outro remake aprovado e que as próximas novelas devem ser inéditas.

O líder da Globo também comentou sobre a fragmentação dos direitos esportivos, a criação de produções para múltiplas telas e o peso de tentar errar o mínimo possível nas estratégias de programação e negócios. Veja:

Meio & Mensagem: Como a atuação multiplataforma (em TV, canais pagos e meios digitais) orienta a produção da Globo atualmente?
Amauri Soares: Existir de maneira multiplataforma impacta o conteúdo e a distribuição. A TV Globo é a televisão da sala de casa, do quarto, mas também é a televisão que está no celular, por conta do Globoplay, que está em todo o lugar. Os canais pagos, como Multishow e GNT, idem. No caso do Premiere, que é um canal de futebol, ele está até em plataformas de terceiros, como o Prime Video. A tecnologia trouxe essas possibilidades de distribuição. Do ponto de vista do conteúdo, e aí falo como head dos Estúdios Globo, é uma tremenda oportunidade porque, ao mesmo tempo em que possibilita levar o conteúdo para outras pessoas, em outros momentos, também cria a oportunidade de produção de conteúdo específico. O Globoplay, eventualmente, encomenda dos Estúdios Globo um tipo de série diferente da que será feita para a TV Globo e isso enriquece muito as possibilidades dos criadores. Agora, por exemplo, estamos produzindo filmes nos Estúdios Globo e alguns deles serão exibidos tanto no Globoplay quanto na TV Globo, mas outros que serão exclusivos de acordo com a plataforma.

M&M: Ao longo dos anos, a competição pela atenção do público aumentou muito e já há algum tempo ela deixou de ser restrita apenas à TV. Como a Globo vê essa disputa?
Soares: Essa é a economia da atenção, um grande mercado de disputa pela atenção das pessoas, já que o dia só tem 24 horas. Enxergamos isso como um enorme desafio e endereçamos isso, a começar, pelo nosso DNA: somos os contadores de histórias brasileiras; os brasileiros que falam com outros brasileiros. Nosso jornalismo, esporte e entretenimento, em suas várias camadas, são histórias de brasileiros, feitas para brasileiros e procuramos valorizar muito isso como diferencial. O segundo ponto é o mix de conteúdo que oferecemos, que é muito diferenciado. Veja o conteúdo oferecido gratuitamente pela TV Globo, que junta o local com nacional e internacional, reunindo o melhor do futebol, jornalismo, programas de auditório, telenovelas, séries, realities. Esse mix é único do ponto de vista estratégico. E a terceira camada é a tecnologia, de buscar estar com os brasileiros, onde eles estiveram, para que ele consuma o conteúdo da forma que melhor couber em sua rotina. Se ele puder acompanhar ao vivo, tudo bem, mas se ele tiver que ver depois, pelo Globoplay, porque chegou tarde em casa, tudo bem também.

M&M: Ao longo de boa parte desses 60 anos, a TV Globo estruturou sua programação em três pilares: Jornalismo, Entretenimento e Esportes. Essa divisão ainda faz sentido?
Soares: Esses pilares estão mais sólidos do que nunca porque eles sustentam um mix de conteúdo construído junto à sociedade ao longo desses 60 anos. A televisão brasileira é criada a partir da relação de troca com a população brasileira. O futebol é o esporte de grande paixão nacional, então ele segue relevante porque está no coração das pessoas. A telenovela é o grande formato audiovisual brasileiro, que dialoga com as pessoas, gera conversas, gera assuntos nos grupos de WhatsApp, provoca diálogo entre gerações, gera uma quantidade infinita de memes. E o jornalismo, que é cada vez mais valorizado pelo público, para separar o fato do fake, para separar o que é notícia do que é opinião, o que é invenção do que é apuração profissional. Oferecemos muitas horas diárias de jornalismo local e nacional. Então, esses pilares da nossa entrega são ainda mais relevantes do que já foram no passado.

M&M: Qual o desafio de ser um veículo de massa em um momento de opções nichadas de consumo? Como impactar uma população tão ampla, com gostos e preferências tão diferentes?
Soares: Nosso desafio, que também acaba sendo nosso diferencial, é falar com o conjunto da sociedade. Não trabalhamos para segmentos, para grupos específicos. Criamos conteúdo que mobilize e seja relevante ao conjunto da sociedade e, para seguir fazendo isso, é importante que a gente aperfeiçoe e aprofunde a nossa conexão com a sociedade, para entender o que nos une e não o que nos separa. Aquilo que nos une é muito forte e muito rico para produzir uma TV aberta como a Globo. A paixão pelo futebol nos une; a paixão pelo Brasil nos une; os brasileiros amam telenovela, gostam das histórias, dos vilões, da mocinha. Os brasileiros amam suas regiões, sua terra e por isso temos 120 emissores de televisão, nossas afiliadas, que colocam seu sotaque local na Globo. Assim como a relação dos comunicadores de auditório com o público. Mantemos o desafio e compromisso de falar com o conjunto olhando sempre para o que nos une.

M&M: De que maneira a TV Globo tenta acompanhar as demandas e entender o que a audiência está querendo?
Soares: A medição de audiência minuto a minuto traz muita informação a respeito de quem está assistindo. Além disso, a Globo também faz muitas pesquisas para entender comportamentos e tendências da sociedade. Essas informações nos atualizam sobre o andar do País e ajudam a calibrar o laço social da Globo com o Brasil ao longo das décadas. Andar junto com a sociedade é importante porque a Globo não abre mão de ser a propositora de temas para a discussão, de debates, seja na dramaturgia, no jornalismo ou em programas de auditório. Nos vemos como uma praça pública na qual todo brasileiro entra e sai, a hora que pode e quer, e na qual sempre haverá uma conversa que o enriquece, de aprendizado e descoberta, mesmo concordando ou não com o ponto de vista da outra pessoa. Ao exercitar a escuta, exercitamos também a convivência entre pessoas diferentes. Fazer a Globo é andar com a sociedade, calibrando o tempo todo o laco construído entre a rede de TV e a sociedade que a assiste.

M&M: E como é possível equilibrar esse acompanhamento das mudanças da sociedade ao mesmo tempo em que é preciso preservar o estilo e essência da TV Globo?
Soares: Acompanhar a sociedade é compreender, por exemplo, que hoje, de cada três domicílios brasileiros, em um moram pessoas de três diferentes gerações ou mais. A convivência entre o avô, filho e neto nunca foi tão presente na sociedade. Ao entender isso, sabemos a importância de construir histórias que possibilitem o diálogo multigeracional. Andar junto com o País é entender o protagonismo da mãe-solo brasileira, pobre, quase sempre negra, que sustenta sua família – e como a representamos em nossas histórias. Calibrar o laço com o Brasil é isso. Nós somos a televisão que se vê no lugar de uma TV brasileira, que propõe conversas, assuntos e amplia as pautas, que gosta de alimentar as discussões. Não somos algoritmos, não recortamos a realidade em micro pedaços para entender micro interesses das pessoas. A televisão aberta é anti-algoritmica. Trabalhamos sempre buscamos ampliar o repertório, as pautas, e isso não vai mudar.

M&M: Quando você fala que a TV é anti-algoritmica, significa que é impossível atender aos interesses de nichos?
Soares: Significa que, por maior sucesso que uma novela faça, ela vai acabar, ali pelo capítulo 170 ou 200. E que, se ela for rural, a próxima será urbana. E após essa novela urbana, por mais sucesso que ela tenha feito, após ela entrará uma novela nordestina. A alternância, alteridade, isso que é anti-algoritmico, porque isso alimenta a proposição de temas e assuntos e mantém a praça pública sempre ativa e movimentada. Essa é a vocação da televisão aberta.

M&M: Recentemente a Globo teve exemplos de novelas bem-sucedidas, outras não. Como avalia os movimentos mais atuais da emissora em relação à teledramaturgia? É possível, de alguma maneira, tentar evitar erros?
Soares: Infelizmente não existe fórmula para fazer conteúdo audiovisual, muito menos novela. A criação é livre, muito humana, que vem da emoção de quem olha para a sociedade para criar suas histórias. Isso sempre foi assim. As histórias mobilizem e comovem, algumas menos do que imaginávamos, inicialmente. Mas isso faz parte da magia de fazer televisão. O que fazemos, como profissionais, é trabalhar para que tenhamos os criadores necessários para ter a melhor carteira de histórias, o melhor portfólio de sinopses para ter a possibilidade de escolher a melhor entre elas, e para que tenhamos os melhores atores, diretores, figurinistas, iluminadores, para fazer a novela com a melhor qualidade. Essa é uma característica da qual a Globo não abre mão. Isso continua muito vivo e seguirá a partir de agora. Temos uma nova geração de autores de novelas chegando em um momento muito bonito, na minha opinião, porque eles estão convivendo com alguns dos mestres do gênero que ainda estão ativos, como Walcyr Carrasco, Ricardo Linhares, Aguinaldo Silva. Esses novíssimos autores passarão a contar suas histórias, fazer as novelas delas e essa é a grande renovação do gênero.

M&M: E falando sobre novela, como avalia a repercussão inicial de Vale Tudo? A TV Globo pretende continuar investindo na fórmula dos remakes?
Soares: Remake não é uma fórmula e nem um gênero: remake é oportunidade. Quando um autor pensa em um remake e apresenta a visão dele de atualizar aquela obra do passado e aquela ideia faz sentido, a gente avança. A ideia de fazer o remake de Vale Tudo nasceu, primeiramente, como uma série. Depois, a autora [Manuela Dias] viu que não daria para ser uma série, porque reduziria demais a história, e então propôs a telenovela. Então, é um processo. Todas as ideias boas, que achamos que fazia sentido produzir um remake, nós fizemos. Além de Vale Tudo, não temos mais nenhuma proposta [de remake]. Mas temos muita sinopse inédita e boa, para fazermos. Mas, se amanhã ou depois algum autor tiver uma ideia boa de um remake, que faça sentido recontar a história, podemos pensar. Mas temos muitas ideias boas na mesa. Quem tiver uma nova ideia de remake vai ter que trabalhar bastante para que ela passe [risos]. Vale Tudo é um sucesso imediato, sabíamos da capacidade de mobilização. Os personagens são muito bons e ela traz o questionamento, que ainda é muito atual, a respeito de vencer na vida a qualquer preço. É um sucesso muito grande, estamos muito satisfeitos. A autora e o diretor estão conseguindo manter as intenções da obra original, mas dialogando com o Brasil de agora. Estamos vendo uma nova versão de uma obra-prima, que também tem características de uma obra-prima. A a Odete Roitman ainda nem chegou [risos]!

M&M: Você falou sobre a preocupação de acompanhar a sociedade. Como isso vem se refletindo na abordagem da diversidade e inclusão pela TV Globo?
Soares: Diversidade é um compromisso central da Globo porque, se nosso negócio é representar a sociedade no vídeo, na tela, ela é central. Não representamos uma sociedade branca; ela é majoritariamente negra e muito diversa. E precisamos representar essa sociedade no vídeo de maneira adequada, fidedigna. O processo de diversidade é permanente e acontece não apenas no vídeo, mas também por trás das câmeras, entre os profissionais que criam os conteúdos, e seguirá como elemento central, sempre.

M&M: Ao longo desses 60 anos, a forma de consumir conteúdo mudou bastante. Os dados de audiência da TV aberta mostram números bem menores do que anos anteriores. A missão de fidelizar o público na TV, hoje, é mais difícil do que antes?
Soares: Não posso negar que a competição nunca foi tão grande. A disputa pela atenção por meio do vídeo está presente em tudo: nas redes sociais, na televisão, no streaming, em todo lugar. Por outro lado, verificamos que o conteúdo da Globo segue sendo central nas conversas do País. Todos os dias, um pedaço gigantesco da conversa brasileiras nas redes sociais, no transporte, nas ruas, tanto digital como presencialmente, vêm de conteúdos da Globo. No X (antigo Twitter), 96% de tudo o que se fala sobre audiovisual é sobre conteúdo da Globo. As pessoas podem até pensar que isso acontece por causa do Big Brother Brasil. Mas, depois que acaba o BBB, esse percentual cai de 96% para 94%, 93%. Claro que a disputa pela audiência é maior e que a oferta cresceu muito. Mas vamos que nosso conteúdo segue central no País. O problema é que a métrica de audiência não alcança isso. Aquilo que é consumido do nosso conteúdo fora de casa não é alcançado pela métrica atual. O conteúdo que é recortado e postado em mil versões diferentes, nas redes sociais, não é alcançado pela métrica atual. Tudo o que as pessoas acompanham do BBB pelas redes sociais não é alcançado. Há uma sub-representação. Isso não é uma crítica que faço a ninguém, inclusive estamos trabalhando nisso junto com a Kantar. É uma questão tecnológica e precisamos avançar em nossas métricas para que possamos dizer, realmente, qual foi a audiência daquele conteúdo, que não está mais restrita à sua exibição original. Isso vale para o BBB, mas também para o jogo do Flamengo ou para a novela das 21 horas.

M&M: No âmbito do esporte, estamos vivenciando uma fragmentação dos direitos de transmissão. Como é, para a Globo, ver as transmissões esportivas divididas com outros players.
Soares: No caso do Campeonato Brasileiro, por exemplo, de cada dez jogos da rodada, nós temos nove. Então não é tão fragmentado assim. A Globo segue sendo a casa do futebol brasileiro, mas haverá ofertas de jogos em outras plataformas. Isso faz parte da evolução do mercado e da tecnologia. Mas, ainda assim, 90% de todo o Campeonato Brasileiro está aqui, assim como também temos a Copa do Brasil, a Libertadores, os jogos da seleção brasileira, vários campeonatos estaduais. Temos uma oferta de futebol que não tem comparação no mercado.

M&M: Pela posição de liderança da Globo, existe naturalmente uma cobrança para que todos os projetos sejam bem-sucedidos. Em sua posição, como lida com isso?
Soares: Televisão é um trabalho muito coletivo. Isso parece clichê, mas é a pura verdade. Quando saímos para uma gravação, quem cuida do vídeo é uma pessoa, e do áudio, outra. É algo muito coletivo. Somos 14 mil pessoas na Globo e 10 mil nas afiliadas. São 24 mil profissionais brasileiros que fazem a Globo todos os dias. Somos um time grande e muito bom no que faz, com tradição e experiência, que está aqui há 60 anos e indo para os próximos 60 anos. É preciso ter a melhor equipe, estar atento, ouvir a sociedade, não ter medo de errar e respeitar o País em que vivemos.

M&M: De que forma você acompanha e avalia as críticas e comentários sobre a Globo feitos nas redes sociais? Há algo que seja aproveitado de todo esse feedback contínuo por parte das pessoas?
Soares: Toda crítica construtiva é muito bem-vinda e toda crítica que vem do público é sempre construtiva. O publico é especialista em televisão, ama novelas, então quando ele fala sobre algo da Globo, fala com o coração. Isso é uma coisa. Agora, fake news, boatos, invenções em redes sociais, aí já são outra coisa, que ocupam outro espaço. É importante separar bem as coisas. Todo dia há alguma informação falsa sobre algo que estamos fazendo, mas aprendemos a não perder tempo com isso. É importante ter a crença no que fazemos e a opinião do público a respeito, que sempre é muito generoso com a Globo.

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