Aos 50 anos, Jornal Nacional celebra futuro
Telejornal que inaugurou conceito de rede do Brasil, hoje apresentado por William Bonner e Renata Vasconcellos, segue experimentando tecnologias e formatos
Telejornal que inaugurou conceito de rede do Brasil, hoje apresentado por William Bonner e Renata Vasconcellos, segue experimentando tecnologias e formatos
Igor Ribeiro
30 de agosto de 2019 - 19h15
O Jornal Nacional nasceu em 1º de setembro de 1969, em preto e branco, com algumas poucas capitais conectadas num sistema terrestre de micro-ondas. Hoje, em tempos de imagens 4k via satélite e interatividade digital em tempo real, aquela tecnologia dos anos 1960 pode parecer simplória. Mas não só era o que de mais avançado havia na época, como o JN representava a primeira transmissão de TV em rede nacional.
Para celebrar a data, sua influência sobre a sociedade brasileira e seu pioneirismo tecnológico, o telejornal inicia um rodízio na bancada no sábado, 31 de agosto, com apresentadores de afiliadas e emissoras todos os estados do País. A partir da segunda-feira, 2, o Jornal Nacional também leva ao ar o primeiro episódio de uma série especial de reportagens que vai explorar, em perspectiva histórica, cinco grandes temas: educação, cidades, trabalho, saúde e relação com o outro.
Sendo o próprio programa um marco em avanço tecnológico, fica também uma curiosidade sobre a perspectiva de futuro para o JN. Para Letícia Renault, professora doutora do departamento de jornalismo da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília, o programa tem cruzado com facilidade a fronteira digital. “Nesse contexto de smartphones, redes sociais, ele passou sem problema”, diz. “Mas houve uma inversão da figura do apresentador: na internet, o telejornal não demanda mais o imediatismo do broadcasting. O conteúdo está à disposição do internauta que o aciona quando quiser, e o apresentador se torna algo dispensável. Então, precisa ser revisto.”
Segundo Letícia, o próprio modelo de broadcasting atravessa transformações que devem impactar o formato. Mas mesmo hoje, ela pondera que há o desafio de rever um modelo “anacrônico”: “Sabemos que o telejornalismo não tem problema com a internet: ele transbordou para o ciberespaço com muita facilidade, pois é multimidiático por natureza. Porém, o modelo ainda está em definição.” A professora — que já foi jornalista por mais de 20 anos na Band, CBN, SBT e na própria Globo — acredita que a reportagem de qualidade será a garantia de interesse da audiência durante essa transição.
Humanização dos âncoras
João Luis Gago Batista, professor e mestre em comunicação pela USP, que também já foi jornalista das TVs Globo e Cultura, não corrobora a impressão de que o Jornal Nacional se adaptou naturalmente à internet, atribuindo justamente à revolução digital o desinteresse de parte do público. Ele concorda, no entanto, que houve ajustes de linguagem que são, hoje, bastante visíveis. “Ninguém aguenta o mesmo formato por tantas décadas; era preciso ‘humanizar’ os âncoras, tirá-los da postura rígida por trás das bancadas”, diz, referindo-se ao fato de William Bonner e Renata Vasconcellos andarem pelo estúdio e interagirem de modo mais espontâneo com repórteres, por exemplo. Ele acrescenta, porém, que são necessárias mudanças mais intensas: “Era e é preciso fazer inovações para atrair o receptor ou, pelo menos, manter os que permaneceram”.
Para Thell de Castro, CEO do site TV História, as mudanças mais intensas dos últimos anos, incorporando o dinamismo tecnológico e com os apresentadores se movimentando no cenário, seguiram um padrão de informalidade de outros telejornais e ocorreu na medida certa. “A seriedade é um ativo importante do JN e ainda é o telejornal de maior audiência, ele não podia fazer mudanças muito drásticas”, afirma. Segundo ele, o telejornal não deve nada a similares de grandes redes como BBC, ABC, CBS, NBC, Fox e CNN. Thell destaca que o Jornal Nacional é muito antenado com o que se desenvolve no exterior e deverá ter ciclos de renovação mais frequentes e ágeis na comparação com os anteriores, que foram mais lentos.
“Já comentaram que a Globo tende a adotar um apresentador único, como é nos Estados Unidos, em que esses telejornais têm um só âncora no comando de tudo… Não é certeza, mas não acho difícil”, fala. Maju Coutinho — que hoje comanda a previsão do tempo, mas já esteve atrás da bancada nos rodízios de sábado — é um nome crescente e a aposta de Thell, mas ele lembra que no auge de sua passagem pela Globo, Carlos Nascimento também era cotado para assumir como âncora oficial, o que nunca chegou a acontecer.
Para Ali Kamel, diretor-geral de Jornalismo da Globo, o sucesso de audiência do Jornal Nacional é reflexo, justamente, de sua sincronia com as revoluções tecnológicas. “Hoje, na Era Digital, os brasileiros recebem informações de todos os lados: de sites de jornais, em notificações de celulares, em redes sociais, numa conversa com amigos, ouvindo o rádio enquanto vai ao trabalho, e grande parte das pessoas nem sempre tem tempo de parar ao longo do dia para se aprofundar, embora haja boa oferta de grande qualidade”, explica. “O papel que o JN assumiu nesses anos foi de reunir essas informações dispersas e contextualizá-las, com início, meio e fim. É por esse motivo que os brasileiros param diante do JN: porque aquilo que para muitos estava disperso, se encaixa como num quebra-cabeça. A missão que o JN se dá hoje é essa.”
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