Do glamour ao ativismo: a mudança dos influenciadores
Paula Gertrudes, da Cara de Conteúdo, e a atriz Taís Araújo falam sobre como o ativismo social e político dos influenciadores passou a ser aceito pelas marcas
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Isabella Lessa
11 de agosto de 2020 - 13h02
Se até alguns anos atrás o ativismo de uma personalidade reduzia a quase zero suas chances de fechar um contrato publicitário, a realidade atual é oposta, em um contexto no qual as próprias marcas são cobradas a não ficarem em cima do muro. Exemplo recente é o do ator Thammy Miranda, escolhido pela Natura para protagonizar a campanha de Dia dos Pais da marca, criada pela DPZ&T. Ao destacar um homem transgênero em sua comunicação, o anunciante sedimentou seu posicionamento diante de questões como diversidade de gênero, paternidade e masculinidade, atraindo reações polarizadas do público nas redes sociais e, sobretudo, gerando debates sobre esses temas na mídia.
Para Paula Gertudes, diretora artística da Cara de Conteúdo, o olhar das marcas em relação aos influenciadores começou a mudar cerca de cinco anos para cá. “Em 2014 o principal ativo era se o protagonista de novela ia ter repercussão ou não. A questão do ativismo entrava como ponto crítico a ser analisado e a personalidade era bem vista quando tinha causas amplas e menos polêmicas, como a paz no mundo, a ecologia, causas envolvendo crianças. Dependendo do grau do ativismo, havia um risco para a marca, o número de possibilidades de a campanha dar errado era grande”, afirma. De lá para cá, segundo ela, o consumidor passou a querer que as mascas se posicionassem diante de questões políticas e sociais e, nos últimos dois anos, essa responsabilidade passou a ser transferida também para as celebridades.
Colin Kaepernick, ao centro, e outros dois jogadores em protesto durante a execução do hino nacional norte-americano, em 2018 (Crédito: Reprodução)
No Brasil, essa tensão social também vem se intensificado nos últimos quatro anos, com as sucessivas crises políticas mobilizando a população. O cenário fez com que novas vozes políticas emergissem, vindas de outros lugares que não o Congresso. É o caso de Felipe Neto, influenciador e youtuber, que, por meio de seu Twitter, tornou-se uma das figuras públicas mais críticas ao governo Bolsonaro (nas últimas semanas, o apresentador foi alvo de ataques virtuais depois de gravar um vídeo para o New York Times em que disse que o presidente brasileiro é o pior do mundo no combate à Covid-19). Ele e Anitta, aliás, ocupam o segundo e terceiro lugar, respectivamente, como personalidades mais influentes na política nacional, atrás somente de Bolsonaro, de acordo com pesquisa realizada em junho pela empresa Quaest, divulgada pelo jornal O Globo.
Uma das figuras que tem transitado entre os universos da política e da parceria com marcas é Gabriela Prioli, mestre em direito penal, apresentadora da CNN Brasil e colunista da Folha de S. Paulo. Ela, que discorre nos veículos para os quais trabalha e em seu canal do YouTube sobre a política brasileira, fez publis para a farmacêutica Addera e estreou, em maio, como embaixadora para Quem disse, Berenice?, marca d’O Boticário.Há dois anos, Taís Araújo lançou, para a mesma marca, uma coleção de batons. Paula, que conectou a atriz à empresa na época, lembra que o período era de plena polarização, às vésperas da eleição presidencial, mas o posicionamento de Taís diante de questões políticas e sociais não impediu a parceria: pelo contrário, houve uma aceitação de ambas as partes quanto a liberdade que ela continuaria tendo para se expressar sobre esses temas.
Na visão de Taís, o fato de ela tocar nesses assuntos impacta diretamente sua decisão de se juntar ou não a uma marca. “Hoje, faço uma pesquisa para saber o posicionamento da marca. Há casos em que a marca se reposiciona e a reinserção a partir do erro é importante. Vejo que existe um olhar mais amplo e crítico dos dois lados, claro que escolho me associar a marcas que tenham valores parecidos com os meus. E, além disso, eu gosto de criar junto”, diz. Mas a atriz relembra que nem sempre foi assim. Ainda no início da carreira, na adolescência, com frequência viu sua imagem sendo colocada sob o ponto de vista de uma pessoa que havia conversado com ela por cerca de duas horas. “Ou seja, a imagem que ele ou ela construía de mim vinha carregada de coisas que diziam respeito a outra pessoa, a origens, conhecimentos e preconceitos de outra pessoa”, explica. Para ela, além da questão do ativismo, a internet deu a oportunidade às personalidades de “desglamourizar” suas vidas, o que cria uma relação mais direta e transparente com o público. Caminho esse, aliás, que tem sido buscado pelas marcas.
Antes da pandemia, Taís havia sido convidada para estrelar um comercial de Doril. Mas o isolamento social veio e ela propôs que seu marido, Lázaro Ramos, que, além de ator é diretor, a dirigisse em casa, capturando a vida real. “Não fazia mais sentido fazer uma campanha com roteiro, mas sim mostrar a vida da Taís como ela é hoje. Foi muito legal usar os elementos da vida real, aquilo que ela estava aprendendo e compartilhando. Ficou autêntico”, comenta Paula.
Para a consultora, a intimidade que se criou durante a pandemia, com a maior exposição das casas das pessoas nas videoconferências, é algo que tende a permanecer. No entanto, o lado aspiracional que permeia os universos da beleza e do lifestyle ainda é necessário, ainda que sem a pecha de beleza inalcançável.
Taís Araújo e Lázaro Ramos no making of da campanha criada para Doril (Crédito: Reprodução)
“Isso nem cabe mais. Meu olhar, enquanto consumidora, quer uma pessoa que me diga alguma coisa, quero saber quais os pensamentos e valores da marca. Já li nas minhas redes sociais que, se eu não tiver conteúdo, não engajo”, afirma Taís.
Com a intenção de aliar propósito e posicionamento de influenciadores e marcas, a Cara de Conteúdo fez, em julho, trabalhos com Nathalia Arcuri, do canal Me Poupe!, que estrelou a campanha da WMcCann para a Estácio sobre os benefícios do ensino digital. E, no mesmo mês, lançou o projeto #ComidaDeCasaCamil, da Camil Brasil, com a apresentadora e culinarista Rita Lobo. A campanha foi criada pela Lew’Lara\TBWA.
“As duas campanhas são com produtoras de conteúdo. A Nathália tem essa plataforma de educação financeira. E a Rita há 20 anos defende comida de verdade. Poderia ter escolhido alguém do MasterChef, mas a Rita faz um trabalho sério com o Ministério da Saúde e outras entidades”, ressalta Paula. Ainda que haja essa mudança de percepção do público e das marcas diante dos influenciadores, a profissional acredita que ainda há um caminho a ser percorrido pela publicidade brasileira em direção a caminhos mais autênticos e transparentes.*Crédito da imagem no topo: Divulgação
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