Bruno Luperi, de Pantanal: “Meu respeito absoluto é à dramaturgia”
Formado em publicidade, autor da trama do horário nobre da Globo fala sobre a inserção de marcas na novela e o futuro do consumo do formato
Bruno Luperi, de Pantanal: “Meu respeito absoluto é à dramaturgia”
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Roseani Rocha
8 de setembro de 2022 - 6h01
Desde março, Bruno Luperi assumiu a missão de apresentar, diariamente aos brasileiros, sua versão de Pantanal, remake da obra escrita por seu avô, Benedito Ruy Barbosa, e exibida pela TV manchete em 1990.
Ainda que considere a formação em publicidade algo que o aprimorou como comunicador, e que ajudou na compreensão da inserção de marcas no conteúdo de entretenimento, Luperi faz questão de exaltar que seu “respeito absoluto é à dramaturgia”.
A devoção é tamanha que, por ser neto de Benedito ele se afastou da escrita um tempo. Somente após o próprio avô fazê-lo ver que, ao atuar na propaganda, também contava histórias, Bruno abraçou de vez o que considera ser o ofício que ama.
Em entrevista ao Meio & Mensagem, o ator do remake de Pantanal comenta sua trajetória na dramaturgia e visão sobre o futuro das novelas no mundo marcado pelas múltiplas telas e pela conveniência dos streamings. Leia alguns trechos abaixo:
Meio & Mensagem — Sua formação em publicidade auxilia na inserção de marcas no conteúdo da novela? Até o 100º capítulo já eram 11, em Pantanal, e o 5G chegou lá antes que em São Paulo.
Bruno Luperi — A propaganda foi uma grande escola, porque trabalhar na criação das agências te incentiva a atingir diferentes públicos, a modular muito o tom de voz, às vezes, era um varejo, às vezes, um produto de luxo; às vezes, um carro, às vezes, um refrigerante. Você fala com muitos públicos e isso é muito bom para o comunicador. Tive oportunidade de trabalhar em grandes agências como a DM9 e a Africa, e isso me talhou para o homem que sou hoje, atento ao mercado, sensível aos interesses da marca, mas tendo também fidelidade sempre à história. Marcas coerentes com a história ajudam a engrandecer nosso trabalho, rentabilizam a empresa. Mas tem um limite que quem dita é a natureza da história. Meu respeito absoluto é à dramaturgia. Ela é soberana. Pantanal foi um caso atípico, porque a novela já estava toda escrita, antes de ir ao ar o primeiro capítulo. E o mercado começou a se interessar demais ao longo do processo. Então, conseguimos mexer muito pouco na história. Havia um interesse muito grande de marcas e eu disse mais não do que sim.
M&M: Aqueles a quem diz ‘sim’ dão trabalho no fator “respeito à história”?
Luperi: Por novela ser um gênero muito popular e com o qual o Brasil tem uma história longa, temos o hábito de fazer inserções comerciais que não considero as melhores para a marca e para a novela. Minha formação me ajuda a buscar coisas mais agradáveis ao público, que não sejam uma interrupção na história sendo contada. Tento fazer essa conciliação da melhor forma. Nem sempre é possível, porque, às vezes, são grandes contratos e tem que ceder um pouco de um lado para conseguir o outro. Mas o mercado terá de se adaptar à nova realidade, porque a questão multitela, mais do que alterar a audiência final, altera a maneira como as pessoas se relacionam com a novela e o horário comercial perde um pouco a relevância. Num futuro breve, as marcas terão de sair do horário comercial e voltar à “soap opera”, se integrarem ao conteúdo, como foi lá atrás, com a Colgate-Palmolive e as primeiras empresas que trouxeram a telenovela ao Brasil.
M&M: Que mercados você considera referência para essa inserção?
Luperi: Vejo isso em algumas produções norte-americanas, pois dizendo menos acabamos dizendo mais. Mas tem que ser compreendido dentro do Brasil; uma vez que uma empresa investe dinheiro em uma ação comercial numa novela, espera ter um resultado. Não adianta querer entregar algo que não seja considerado relativo àquilo que foi investido. É necessário um balanço. O Brasil pode evoluir muito na forma como as inserções são feitas e tenho lutado por isso. Desde Velho Chico (novela que escreveu junto de sua mãe, Edmara Barbosa), tento ser muito criterioso com as marcas que fecham parceria comercial e faço o máximo para inseri-las no contexto. O mercado brasileiro tem o hábito de querer logo, slogan, nome da marca, tudo na mesma cena. Às vezes, o personagem usar o produto de maneira sutil é muito mais forte. Tivemos um caso interessante no banho da Juma. Eu disse ao cliente (Unilever, dona da marca Dove) que era melhor ela não dizer nada; era uma relação quase sinestésica com o banho, com a espuma. O cliente aceitou e a ação repercutiu muito nas redes sociais. É uma questão de o mercado aceitar um pouco essa inovação, os atores, a Globo e as produtoras se disporem a fazer soluções mais criativas, porque o público está pronto para isso, recebe muito bem. O dinheiro fica melhor investido dessa maneira.
M&M: Mesmo na atual realidade multitelas, que dificulta captar a atenção da audiência, Pantanal tem tido grande sucesso. Para o futuro, as novelas conseguirão manter protagonismo no entretenimento?
Luperi: A teledramaturgia tem espaço cativo no coração do telespectador brasileiro, assim como futebol é uma paixão nacional. Boas histórias cativam e continuarão cativando, seja qual for o formato: dramaturgia longa, série, minissérie, filme, livro, gibi, podcast. Onde houver uma boa história, vai angariar um bom público. O sucesso que estamos tendo é um indicativo disso. E a novela tem vida longa; é um gênero que começou com o folhetim, foi para radionovela e a teledramaturgia é mais um estágio natural do processo. O que muda é a democratização. Hoje, as pessoas podem assistir na hora e na tela que quiserem, parando, retomando. Muda o relacionamento com a obra, mas o interesse permanece, seja qual for o formato. E as telas abrem mais possibilidades, maiores janelas de produção, novas histórias podem ser contadas e reduz muito a barreira de entrada. É uma característica do nosso tempo, tem que aceitar e conviver com isso.
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