Thaís Monteiro
4 de janeiro de 2024 - 20h11
Em entrevista concedida na tarde desta quinta-feira, 4, ao Meio & Mensagem, a CEO da Mynd, Fatima Pissarra, se posicionou em relação às polêmicas envolvendo a agência e o projeto Banca Digital. Mais cedo, a empresa divulgou um comunicado oficial, negando a associação da agência com o conteúdo não publicitário publicado nos perfis integrantes da Banca Digital.
Fatima Pissarra atribui crise a oportunistas e nega impacto sobre os negócios da agência (Crédito: Arthur Nobre)
Contexto da polêmica envolvendo Mynd e Banca Digital
A Banca Digital é um projeto criado em 2020 por Murilo Henare, no qual a Mynd firma parcerias com páginas na internet para potencializar a entrega das campanhas publicitárias contratadas via agência pelas marcas suas clientes. Fazem parte do projeto perfis como Rainha Matos, Alfinetei e Garoto do Blog.
Em dezembro, o perfil Garoto do Blog, até então parte da Banca Digital, publicou imagens falsas de uma conversa entre Jéssica Canedo e o humorista Whindersson Nunes, insinuando um suposto relacionamento entre eles – o que foi desmentido pelos dois. Após a publicação, outras páginas de fofocas e celebridades também republicaram a mesma postagem, como o Choquei, um dos de maior repercussão, que já integrou o casting da Banca Digital.
Com a viralização da fake news, a jovem, de 22 anos, começou a receber comentários negativos em suas redes sociais, inclusive de alguns dos proprietários das páginas que publicaram a notícia falsa, o que a teria induzido ao suicídio. O caso está sendo investigado pela Polícia Civil de Minas Gerais, local onde foi registrado o ocorrido, no dia 22 de dezembro.
Depois disso, foram publicados vídeos e comentários nas redes sociais atribuindo à Mynd a responsabilidade pelos conteúdos dos perfis nos quais a agência intermedia a veiculação de publicidade.
Posicionamento da Mynd
Ao Meio & Mensagem, Fatima Pissarra afirmou que o perfil Garoto do Blog foi afastado da Banca Digital enquanto ocorrem as investigações dos órgãos competentes. Caso seja absolvido, a CEO da Mynd diz que ele voltará a integrar o casting da agência.
Sobre as acusações, a empresária diz que a agência é alvo de notícias falsas articuladas por oportunistas. “São oportunistas, cada um no seu quadrado de oportunismo, que usaram um fato tristíssimo, que foi a morte de uma menina, para interesses pessoais. Cada um no seu nível e no seu propósito”, alegou.
Fatima reforça que a Mynd não tem interferência na linha editorial das páginas agenciadas ou em qualquer conteúdo que não seja relacionado à publicidade. “O que não tem #publi, a Mynd não interfere, não olha, não edita, nem fica sabendo. Eu nem sei o que as pessoas postam”, pontua.
À reportagem, a CEO afirma que não faz julgamento sobre os perfis antes de firmar parcerias com eles e que mantém um contrato para respaldar a agência caso o parceiro cometa infrações às legislações vigentes no País. “Não pensamos se essa pessoa pode soltar uma fake news ou não. Nós não somos julgadores. Esses perfis, desde que assinaram o contrato, garantem que seguem as regras e legislação brasileira criminal, cível e tudo mais”, coloca.
Por enquanto, Fatima diz que a empresa não sofre com rescisão de contratos ou pedidos de adiamento de parcerias com anunciantes, influenciadores e páginas agenciadas. A agência, segundo a CEO, está respondendo eventuais questionamentos das marcas e agências parceiras e reforçando estruturas de compliance, procurement e sua equipe de gestão de crise.
Desde o início de 2024, o site da empresa está fora do ar, por uma opção própria, como contingenciamento da crise. A agência também bloqueou comentários em suas publicações nas redes sociais. Segundo a empresária, essa medida foi tomada após a agência receber ataques de hackers e ela, diretamente, ter sofrido ameaças de morte. Ela diz ainda que a Mynd está avaliando os ataques à agência, colaboradores e agenciados para tomar medidas jurídicas.
A seguir, os principais trechos da entrevista de Fatima Pissarra ao Meio & Mensagem:
Meio & Mensagem – O perfil Garoto do Blog publicou primeiro e, depois alguns outros perfis replicaram quase que simultaneamente a fake news envolvendo a jovem Jéssica Vitória Canedo e o humorista Whindersson Nunes. Por que isso aconteceu?
Fatima Pissarra – Não sabemos por que isso aconteceu, porque não acompanhamos o conteúdo editorial de nenhum perfil. Não acompanhamos, aprovamos ou somos informados sobre nenhuma veiculação de nenhum perfil que não seja uma veiculação de uma marca e de uma publicidade que foi contratada. No caso do Garoto do Blog, que está no nosso grupo de agenciados, nós o afastamos até que sejam feitas as investigações pelos órgãos competentes, que estão investigando. Ele está dando depoimento para a polícia e está sendo investigado. Enquanto ele está em investigação, nós o afastamos do dia a dia de campanhas publicitárias. Nós nem perguntamos para não criar nenhum tipo de envolvimento. Em relação a ter soltado a notícia, ele foi afastado até que as investigações dos órgãos competentes sejam feitas.
M&M – Outros perfis também foram afastados diante dessa situação?
Fatima – O único perfil que chegou para nós, de agenciado que postou a fake news, foi ele. Não tivemos mais nenhum perfil que foi passado para nós que postou a fake news.
Controle das páginas
M&M – A Banca Digital e a Mynd orientam os perfis integrantes de seus castings a replicarem uma mesma postagem para ampliar seu alcance? Em que situações?
Fatima – Jamais. Não mandamos ninguém replicar absolutamente nada. Desde quando a imprensa é imprensa, a mesma notícia sai em todas os veículos, basicamente porque é uma notícia. A notícia que todo mundo está interessado em saber é a notícia que está na revista, na televisão. Os perfis, potencialmente, devem seguir a mesma coisa. Cada um posta a notícia que todos estão falando, seja no Fofocalizando, no Fantástico, na Record. Desde antes de existir social media já era assim. A Mynd não tem qualquer interferência nisso em qualquer veículo, nem em social, impresso, televisão. Somos uma agência de propaganda que faz um projeto de marketing de influência para marcas através de perfis de redes sociais. O que eles postam, nós não interferimos. E mesmo as publicidades, nós aprovamos com cada um deles. Pode ser que um não goste do produto, não use. Mesmo as publicidades são aprovadas e a palavra final em contrato dos influenciadores com a Mynd é deles. A decisão final da publicidade é do talento. Não é da Mynd. A Mynd intermedia. Levamos oportunidades que julgamos interessantes e o agenciado faz ou não, mas sempre com hashtag “publi”. O que não tem “#publi”, a Mynd não interfere, não olha, não edita, nem fica sabendo. Eu nem sei o que as pessoas postam.
M&M – No comunicado emitido pela empresa, vocês colocam que não controlam o editorial e que não concordam com a divulgação de notícias falsas. Por que a empresa decide se associar e associar marcas e agências parceiras com esses perfis?
Fatima – Na verdade, não podemos julgar. Não pensamos se essa pessoa pode soltar uma fake news ou não. Nós não somos julgadores. Esses perfis, desde que assinaram o contrato, garantem que seguem as regras e legislação brasileira criminal, cível e tudo mais. Não podemos falar que esse parece mais ou que parece menos. É um julgamento de valor que não diz respeito à Mynd. Os perfis têm seguidores. Esses seguidores estão ali porque acreditam que o perfil não faria algo de errado. De alguma forma, ele endossou um tipo de credibilidade para ter seguidores. Analisamos dessa forma. Agora, não só um perfil de notícia, com qualquer pessoa pode acontecer alguma coisa. Nos precavemos disso através do nosso contrato de que caso aconteça algo, nós afastamos o perfil. Mas em nenhum momento julgamos. É antiético julgarmos a pessoa antes do fato ocorrido. Nós não concordamos em julgar as pessoas sem ter uma comprovação do fato. Por isso mesmo, o Garoto do Blog está afastado e será julgado pelos órgãos competentes. Caso se comprove, ele sai do casting. Caso ele seja absolvido, ele permanece no casting. Isso é baseado na lei, não na Mynd. Os perfis que agenciamos vêm indicados, vêm com endosso, têm muitos seguidores.
Suspeitas em relação às notícias falsas
M&M – O site da Mynd está fora do ar nesses primeiros dias do ano e as redes sociais da empresa bloquearam a publicação de comentários. Por que essas medidas foram tomadas?
Fatima – Tiramos o site do ar porque estávamos tomando cerca de cinco mil ataques por minuto. Eram tentativas de hackeamento para colocar mensagens. Fechamos os perfis porque estamos recebendo ameaças de morte. Eu recebi e ainda estou recebendo ameaças de morte, assim como meus filhos estão recebendo ameaças de morte. Pedi para meus filhos fecharem as redes sociais, assim como meus familiares, colaboradores da Mynd. Familiares de colaboradores da Mynd estão sendo ameaçados de morte. Falamos para fechar os perfis porque não temos absolutamente nada a ver com essa guerra que se montou usando o nome da Mynd, que é uma agência ética, de credibilidade, que trabalha no mercado há 14 anos, com marcas credenciadas, influenciadores credenciados. Através de uma fake news que remeteram a nós, estão fazendo um linchamento virtual e ameaçando a integridade de 400 funcionários e 400 agenciados. Não entramos em linha editorial de perfis e afastamos o que está envolvido na investigação e estamos sendo atacados como se fôssemos os donos desses perfis e de uma conspiração de que mandamos no universo. Não sei de onde vem e por que fomos escolhidos, mas vemos as bases dos ataques de onde vêm e que é uma coisa completamente de uma máquina de ódio de divulgação de fake news que está nos usando como bode expiatório porque somos uma empresa do mercado pequena, séria, comprometida.
M&M – Você mencionou que a empresa sabe quem está por trás disso. A quem vocês atribuem o conteúdo gerado em torno da Mynd?
Fatima – Eu acho que não tem uma atribuição de uma pessoa. São uma série de oportunistas, cada um no seu quadrado de oportunismo, que usaram um fato tristíssimo, que foi a morte de uma menina, para interesses pessoais. Cada um no seu nível e no seu propósito. Foi uma avalanche de fake news. Aconteceu uma tragédia por conta de outra fake news e eles estão alastrando essa tragédia através de uma oportunidade de usar a fake news para se autofavorecer, seja qual for seu propósito.
Impacto nos negócios
M&M – Como esse caso está afetando os negócios da agência?
Fatima – Ainda não temos dimensão de onde essas fake news e mentiras podem levar, porque estão acontecendo agora. As marcas estão pedindo esclarecimento e estamos dando esse esclarecimento que as notícias não são verídicas. A empresa tem um sistema de compliance super bem estruturado. Temos compliance e procurement dentro da empresa e aberta a todos os parceiros e marcas. Estamos respondendo aos que estão questionando: que os ataques são mentirosos e não interferimos no editorial. 100% do nosso faturamento é baseado em contratos com marcas que são idôneas e éticas. Temos o procurement e compliance reforçados e estamos respondendo os questionamentos que estão vindo, mas não sabemos o impacto futuro disso.
M&M – Desde o início dessa crise, alguma marca parceira cancelou ou adiou projetos que tinham com a Mynd?
Fatima – Estamos fazendo um monitoramento de postagens nos perfis. Até o momento, não houve cancelamento de job. Até agora, não. Quando alguém faz algum questionamento, nós mandamos que nos últimos três posts de marcas não tiveram problemas. Nós munimos a marca de informação para mostrar qual é a situação do que ela está contratando.
M&M – Houve rescisão de contratos com marcas, agências ou perfis e influenciadores agenciados?
Fatima – Não, até o momento não.
Gestão de crise e defesa
M&M – Quais outras medidas de gestão de crise a Mynd está adotando?
Fatima – Num resumo geral, temos o fortalecimento do compliance. Todas as coisas são abertas, para analisar a qualquer instante. Entraram novas frentes que não tínhamos no dia a dia, principalmente análises governamentais, porque envolveu coisas políticas. Na parte dos agenciados, estamos fortalecendo as regras do mercado, de boas práticas de redes sociais, de crimes e fake news para que diminuamos isso onde possamos atuar, dividindo com eles as informações disponíveis, reforçando. Dentro do Comitê de Ética, que já existia antes disso, estamos fortalecendo a comunicação com os agenciados sobre qualquer regra nova, qualquer norma nova para que eles sejam abastecidos de informação. Com os clientes também, para informar que eles estão contratando perfis confiáveis, sendo da Mynd ou de fora, e fortalecendo o mercado para que ele se fortaleça cada vez mais.
M&M – Quais são os passos jurídicos tomados pela Mynd?
Fatima – Estamos com advogados e advogadas trabalhando nisso. Estamos analisando o que tem saído de fake news, separando os crimes da esfera cível e criminal e definindo as ações tomadas a partir disso. Foi tudo agora e a justiça está em recesso. De alguma forma os contratos da Mynd com a Spark foram obtidos e expostos. Estamos analisando para entender como estes contratados foram vazados. Na Mynd, isso não aconteceu. ntão, o que estamos fazendo é usar o time para ir mensurando e definindo o que pode ser feito ou não. Separando as coisas para, a partir da semana que vem, entrar com as medidas cabíveis.