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Inclusão racial perde força – e investimentos – no marketing de influência

Profissionais do segmento apontam arrefecimento do interesse das marcas em falar sobre diversidade inclusive no mês da Consciência Negra


22 de novembro de 2024 - 14h59

O interesse – e também o investimento – das marcas na questão da inclusão racial em suas plataformas de comunicação diminuiu de forma considerável nos últimos tempos. Essa é a impressão relatada por todos os profissionais de marketing de influência ouvidos pela reportagem de Meio & Mensagem quando questionados sobre a evolução do tema.

inclusão racial

(Crédito: Shutterstock)

O segmento é um dos importantes termômetros para a avaliação do assunto uma vez que os criadores de conteúdo, de diferentes áreas, tiveram peso na divulgação dos assuntos de inclusão e equidade, sobretudo racial. Embora o assunto ainda seja presente nas estratégias de comunicação que envolvem creators, os profissionais notam a desaceleração dos investimentos e lutam para que o assunto entre na pauta e nas estratégias das marcas e empresas de forma perene.

Diretora de relacionamento artístico da MAP Brasil, empresa de marketing de influência, Juliana Dejesus admite que os diálogos acerca de investimentos em projetos e criadores de conteúdo que envolvam diversidade e inclusão têm reduzido consideravelmente.

“A questão da diversidade não pode ser encarada como uma tendência de mercado, caso contrário estará sujeita a essas flutuações. É necessário que as empresas assumam compromisso de longo prazo, com o propósito de colaborar com uma sociedade mais diversa e justa.

Ricardo Silvestre, CEO da Black Influence, conta que tem percebido a diminuição do interesse sobre o tema da inclusão racial desde o ano passado. Segundo ele, as marcas que abordavam o assunto passaram a falar cada vez menos e direcionaram os investimentos para outras frentes.

“A situação é tão desafiadora que muitas marcas não estão trabalhando com influenciadores negros nem em novembro, com a justificativa de que não querer se apropriar da pauta, quando isso nunca foi uma preocupação. Há, a meu ver, uma enorme falta de compromisso e responsabilidade com o tema”, reforça Silvestre.

O problema da sazonalidade

A abordagem das pautas de diversidade e inclusão de forma sazonal – quando, por exemplo, se fala sobre liderança feminina no mês de março, perto do Dia Internacional da Mulher, ou então quando as ações e campanhas sobre inclusão racial são voltadas somente ao período da Consciência Negra, em novembro – já era um problema há tempos destacado por quem atua no segmento de influência.

Agora, porém, a situação parece ter ficado mais crítica. Assim como apontou Silvestre, outros profissionais do segmento de influência destacam que o volume de trabalho para creators pretos, por exemplo, tem caído inclusive no mês de novembro.

Julio Beltrão, diretor artístico da Mynd, conta que, antes, muitos creators negros eram chamados para trabalhar quase que exclusividade no mês da Consciência Negra. Só que, neste ano, a agência tem visto uma queda significativa nos briefings até mesmo focados nesse tema.

“Recebemos briefings, é verdade, mas relacionados, por exemplo, a Black Friday e não ao mês da Consciência Negra. Inclusive, muitos criadores estão comentando em suas redes sociais que esse ano praticamente não chegaram propostas, o que mostra um retrocesso explícito”, avalia Beltrão.

O que já era limitado a um período específico, portanto, ficou ainda mais raro, o que, segundo o executivo da Mynd, sinaliza que as marcas não abraçaram a diversidade de dentro para fora.

Em 2020, o mercado parceria estar vivendo uma grande fase em termos de inclusão no mercado de trabalho, como lembra Tiago Trindade, sócio, CCO e cofundador da Digital Favela. Essa percepção, segundo ele, não ganhou o fôlego necessário sobretudo por que incluir passa pela colocação de pessoas negras e diversas também nos postos de alta liderança do setor.

Hoje, segundo ele, vemos o reflexo dessa falta de inclusão. “Nas lideranças, ainda é raro encontrar pessoas pretas ocupando posições de decisão. Além disso, muitos profissionais, especialmente aqueles de origem periférica, acabaram deixando esses espaços. Sem mudanças reais na liderança, essa transformação perde força e continuará demorando para acontecer”, pontua.

O que fazer?

De forma geral, os profissionais apontam que só será possível mudar essa realidade quando as marcas deixarem de enxergar a questão da inclusão racial e da diversidade como estratégias de marketing. E isso, naturalmente, exige mais comprometimento e investimento.

“Sem isso, não veremos avanços”, sentencia Ricardo Silvestre, da Black Influence. “Comprometimento, para termos a pauta trabalhada dentro das empresas de forma efetiva, e investimento para conseguirmos amadurecer os negócios, crescer e alcançar ainda mais pessoas”, complementa.

Juliana, da MAP Brasil, destaca que as empresas precisam revisitar as suas estratégias de negócio e marketing para se manterem competitivas e que parte dela precisa considerar a questão racial em todas as suas especificidades, para garantir que os criadores de conteúdo façam parte das conversas de maneira genuína.

“Em primeiro lugar, é preciso entender que os criadores de conteúdo negros abordam assuntos diversos e essas vivências múltiplas agregam muito valor ao negócio. Em segundo, é primordial termos especialistas em cargos de liderança e que estejam à frente do processo decisório para garantir que o investimento em marketing de influência seja proporcional às entregas e aos objetivos de negócio”, explica a diretora.

Outro ponto trazido pelos profissionais é a necessidade de ampliar a percepção a respeito dos assuntos e temas abordados pelos influenciadores negros. O sócio e cofundador da Digital Favela, por exemplo, cita que a agência trabalha com creators que falam sobre beleza, gastronomia, viagens, moda e outros assuntos diversos.

“É necessário incluir essas pessoas em campanhas de forma ampla, não apenas quando há uma demanda explícita por diversidade e inclusão. Todo jovem merece se ver representado em campanhas e influenciadores pretos precisam fazer parte disso, independentemente do tema”, avalia Trindade.

inclusão racial

Gil do Vigor: “Muito se tem falado sobre marcas que não estão colocando a diversidade no centro do debate. Isso impacta muitas vidas, produtores de conteúdos e estabilidade de carreira” (Crédito: Divulgação)

E os creators negros, o que pensam?

Mesmo influenciadores e criadores de conteúdo negros que conseguiram uma visibilidade maior na mídia – e nas estratégias das marcas – não deixam de reconhecer que o debate sobre inclusão ainda não atingiu a potência necessária.

Gilberto Nogueira, o Gil do Vigor, é exemplo de influenciador que constantemente figura nas campanhas e ações de marcas. Ainda assim, ele, que também é economista, avalia que a inclusão racial evoluiu em alguns pontos, mas retrocedeu em outros.

O ex-BBB aponta que muito se tem falado sobre marcas que não estão colocando a diversidade do centro do impacta e que isso impacta vidas, produtores de conteúdo e também a estabilidade na carreira.

“Sou muito grato pelas oportunidades que tive e tenho, embora saibamos que pessoas pretas não são remuneradas da mesma forma, nem valorizadas no tempo de exposição de uma campanha, por exemplo, nem protagonizam alguns espaços de relevância e prestígio, entre outros fatores que ainda nos fazem ver que seguimos lutando”, avalia o influenciador, que participou do BBB 21.

Outra participante do reality da Globo, porém, na edição deste ano, Giovanna Pitel destaca alguns avanços, como o fato de vermos muitos influenciadores pretos em destaque. No entanto, ela pontua que ainda há muito a ser feito.

Inclusão racial

Giovanna Pitel: “A tecnologia, em grande parte, é desenvolvida com base em bancos de dados predominantemente brancos, o que gera dificuldades até para o reconhecimento de rostos negros” (Crédito: Divulgação)

“Nas redes sociais, por exemplo, somos constantemente bombardeados por filtros e efeitos que, muitas vezes, clareiam a pele ou afinam o nariz, deixando as pessoas com traços mais próximos aos de pessoas brancas. Há alguns anos vem sendo discutido o racismo nos algoritmos das plataformas. A tecnologia, em grande parte, é desenvolvida com base em bancos de dados predominantemente brancos, o que gera dificuldades até para o reconhecimento de rostos negros, por exemplo”, pontua Pitel. Apesar disso, a ex-BBB e assistente social se diz acolhida pelas marcas e pelo público.

Beltrão, da Mynd, analisa só irá evoluir, de fato, quando agências, marcas e creators atuem de forma constante e genuína, integrando a questão racial no dia a dia dos negócios.

“É essencial colocar pessoas pretas, periféricas, LGBTQIA+, em destaque nas telas e também nas equipes de criação e decisão. A máxima, ‘se eu me vejo, consumo’ é real e poderosa. E marcas que investem nisso veem resultados não só no impacto social, mas também em suas metas e nos seus ponteiros de negócio”, finaliza.

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