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Inteligência artificial no cinema brasileiro ainda é incipiente

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Inteligência artificial no cinema brasileiro ainda é incipiente

Enquanto grandes estúdios apostam em startups para certificar suas apostas, mercado no Brasil ainda avalia a qualidade e aplicabilidade dos dados


7 de fevereiro de 2020 - 6h27

No início do ano, a Warner Bros. confirmou uma nova parceria com a Cinelytic, startup que usa machine learning e inteligência artificial para ajudar na tomada de decisão na produção de filmes para prever seu desempenho comercial. Em 2018, outro grande estúdio, a 20th Century Fox, teve um artigo publicado por seus pesquisadores explicando como a companhia analisa o conteúdo de trailers por frame, lista os objetos presentes no vídeo e os compara demais trailers para, assim, ver que tipo de público irá atrair. O uso dessas empresas ou ferramentas tem ganhado força em Hollywood nos últimos dois anos, mas permanece uma ideia a ser desenvolvida no Brasil.

 

Além da Warner Bros., Cinelytic já trabalhou também com Ingenious Media (Avatar, X-Men: Dias de um Futuro Perdido, Planeta dos Macacos: O Confronto, A Vida de Pi) e outras produtoras (Crédito: João Silas/Unsplash)

Na percepção de Paulo Barcellos, diretor da O2 Pós, braço da O2 Filmes, há pesquisadores brasileiros trabalhando em projetos parecidos com os citados anteriormente e, provavelmente, em um ou dois anos as produtoras brasileiras terão acesso a dados interessantes nesse quesito. “Ainda é algo experimental no Brasil”, diz. No exterior, a ScriptBook, por exemplo, prevê o sucesso de longas baseado em seu roteiro, a Vault, avalia qual público demográfico irá às salas ao analisar a resposta online do trailer, e a Pilot indica o número de bilheteria, são outros exemplos de empresas oferecendo serviços semelhantes aos grandes estúdios de cinema.

Uma das empresas que está iniciando um movimento brasileiro neste sentido é a Desbrava Data, do CEO Paulo Pereira, que tem experiência no setor com passagens pela Warner Bros., Cinemark e Cinépolis. A Desbrava possui um banco de dados com roteiros de filmes através do qual identificam palavras usadas nas falas dos personagens e, com base nisso, indicam tendências de termos e textos de personagens femininos e masculinos. “Isso pode ajudar qualquer empresa na identificação de seu publico alvo. Por exemplo: um distribuidor lança um filme direcionando 70% da campanha para o publico feminino, sem conseguir identificar que no roteiro, a participação das personagens femininas é de apenas 40%”, contextualiza Pereira.

Ao acompanhar o uso de IA no mercado internacional, o executivo teve a percepção que esses temas não estavam inseridos no cotidiano do audiovisual brasileiro e viu a oportunidade de iniciar esse projeto no País. Segundo ele, o Brasil está atrasado em um ano e meio ou dois em relação ao que está sendo feito na China e nos Estados Unidos, começou a explorar a tecnologia mais recentemente, em 2018.

“O Brasil tem por cultura esperar acontecer primeiro nos Estados Unidos ou então, esperar os líderes de mercado aplicarem algo para avaliar depois, isso em qualquer mercado, não apenas no cinema. Porém, esse cenário tem mudado muito, temos aqui no Brasil profissionais excelentes de IA e Data Science e muitos projetos já estão sendo exportados para outros países. Mas, veja, já não são aqueles dez anos de diferença que víamos na década de 1980 e 1990”, coloca.

Ele espera que daqui um ano o mercado já não se imagine trabalhando sem tais soluções. Atualmente, a Desbrava Data trabalha com customização da comunicação para público-alvo, principalmente para o varejo, enquanto educa o mercado cinematográfico a aceitar novos padrões e modelos de negócios com análises mercadológicas gratuitas que oferece à indústria.

Percepções dos bastidores
Paulo Barcellos, da O2, diz que as tecnologias diminuem o risco de investir em projetos, porém o setor ganha um outro risco: fazer filmes cada vez mais parecidos baseados em roteiros que foram bem sucedidos. Além disso, ainda com os dados, é difícil ter uma garantia de êxito por conta de variáveis imensuráveis como a emoção ou até mesmo o clima.

O ponto é que não sabemos quais variáveis são responsáveis pela fórmula do sucesso. Se chove muito no final de semana de estréia em de um filme, por exemplo, a bilheteria pode sofrer. Como saberemos se as pessoas se emocionam num filme? Vamos instalar uma câmera no cinema e filmar a reação delas? Vamos distribuir smart watches para medir o pulso e sincronizar com o filme? Isso é possível em sessões controladas, mas na hora que você começa a lidar com dados do mundo todo, a qualidade desses dados não será a mesma”, questiona.

Para Geórgia Costa Araújo, CEO da produtora Coração da Selva, o fator emocional ainda não mapeado será estudado através da neurociência. O big data trará temas e universos que se relacionam com o interesse do público e a neurociência acessará a “sutileza e a delicadeza do impacto de cada imagem e história”. “A tecnologia tem muito a acrescentar, não é a toa que chegou o momento em que o Silicon Valley (Apple e Amazon) está invadindo Hollywood”, comenta.

São essas empresas, em especial, os streamings que abriram espaço para os dados interferirem na produção audiovisual. Stranger Things, série da Netflix, foi roteirizada com base em algoritmos de consumo, por exemplo. Para Geórgia, os estúdios estão correndo atrás deles, que foram os vanguardistas no movimento. “São elas que detém esse tipo de algoritmo, que sugere criar sob demanda. Já faz parte do nosso universo. Trazem informações que impactam o audiovisual como um todo, da campanha, à produção, seja mapeando onde o público está, ao que o público gosta”, afirmou Renata Brandão, CEO da Conspiração Filmes, em entrevista ao Especial Next, Now de Entretenimento.

Ainda assim, Renata opina que o cinema é um dos espaços em que a arte, a livre expressão e a abstração ainda impera mais intensamente frente à elementos ligados à tecnologia de dados. Já Paulo Pereira defende que tanto na distribuição quanto na exibição, os dados e a inteligência artificial têm sua aplicabilidade, mas o mercado ainda não aceita sair dos padrões já estabelecidos por décadas. “Na produção, muitos dos que já conversei sabem que há potencial, mas não sabem como começar”, diz

Relatando um caso de streaming brasileiro, a Globo revela que usa técnicas de inteligência artificial para monitorar o consumo, maximizar e recomendar conteúdo e mapear os hábitos do público no Globoplay.  Trilhando o caminho para se tornar uma “media tech”, a empresa diz que inteligência artificial, técnicas de big data e machine learning são o foco de 600 profissionais de tecnologia que trabalham no hub digital do grupo. “Estamos colocando a tecnologia no centro das nossas decisões de negócio. Ela passa a ser vista por nós como protagonista no processo de transformação, na busca por inovação e performance, em toda a cadeia de valor”, comunica a empresa.

Paulo conta que a O2 já prepara seus dados para implementar tais ferramentas futuramente e a Coração da Selva está em contato com uma empresa indiana que faz testes de audiência para realizar experimentos no Brasil. Segundo ele, tais tenologias são fonte de constante pesquisa na produtora. Em entrevista ao Meio & Mensagem, Kondizilla anteviu: “Ser cientista de dados é a profissão do futuro. E no entretenimento, ler um algoritmo, antecipar tendências, ver o que está rolando e entregar esse tipo de conteúdo é fundamental”.

**Crédito da imagem no topo: Denise Jans/Unsplash

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