NetLab: transparência da publicidade online é opaca
Conclusão é do relatório da indústria da desinformação e seu impacto nas relações de consumo no Brasil, elaborado pelo NetLab UFRJ e Senacom/MJSP
NetLab: transparência da publicidade online é opaca
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BuscarConclusão é do relatório da indústria da desinformação e seu impacto nas relações de consumo no Brasil, elaborado pelo NetLab UFRJ e Senacom/MJSP
Sergio Damasceno Silva
28 de novembro de 2024 - 6h03
O NetLab UFRJ, que é o Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e a Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública (Senacon/MJSP) elaboraram relatório a partir de projeto sobre a indústria da desinformação e seu impacto nas relações de consumo no Brasil.
Com base nisso, estabeleceram dois índices: o Índice de Transparência Digital (ITD) e o Índice de Transparência de Publicidade (ITP).
O ITD, com base em 40 parâmetros, avaliou critérios como acessibilidade, conformidade, completude, consistência, relevância e atualidade, destacando a escassez de transparência nos dados das redes sociais e alguns pontos foram observados nas plataformas analisadas.
O ITP avalia o nível de transparência e de qualidade dos dados de anúncios das principais redes sociais que operam no Brasil.
São elas: Meta (cuja publicidade inclui Facebook, Instagram, Messenger e Audience Network), Telegram, LinkedIn, Google (cuja publicidade inclui anúncios veiculados em sites e aplicativos de terceiros, buscadores, vídeos no YouTube, Google Discover, Play Store, Google Maps, Google Shopping e Gmail), X/Twitter, TikTok, Kwai e Pinterest.
No gráfico, as redes e usuários no Brasil:
Em relação à transparência, nenhuma plataforma atingiu o nível ideal (conforme o gráfico abaixo).
O YouTube foi a única plataforma que obteve a classificação satisfatória na transparência.
As demais redes, em relação à transparência de dados, tiveram classificações como irrelevante ou nula, precária e regular.
No índice ITP, todas as empresas sob avaliação ficaram em níveis insatisfatórios no teste.
De acordo com o laboratório, o índice, que mede a clareza e a honestidade na publicidade, revelou que muitas big techs sequer alcançaram o nível mínimo de transparência, e obtiveram nota zero.
O principal objetivo de ambos os índices é prover insumos que embasem políticas públicas de proteção dos consumidores.
O NetLab UFRF usa o ITP para medir o grau de proteção dos consumidores e do ecossistema publicitário nas plataformas digitais.
A professora da Escola de Comunicação da UFRJ e diretora do Netlab UFRJ, Rose Marie Santini, e o pesquisador associado do Netlab UFRJ, Marcio Borges, detalharam ao Meio & Mensagem como anunciantes, agências e demais agentes do mercado publicitário podem agir para que a transparência de dados na publicidade melhore.
Meio & Mensagem – De que forma as marcas anunciantes podem trabalhar com as redes para que a transparência de dados na publicidade melhore?
Rose Marie Santini e Marcio Borges – Existem dois indicadores que nós, no NetLab UFRJ, lançamos esse mês e vamos começar a apresentar regularmente para conhecimento público.
Um é o ITD, Índice de Transparência de Dados, que é muito útil para a permitir a pesquisa acadêmica e a inovação no setor.
O outro é o ITP, índice de Transparência de Publicidade, que é fundamental para medir o grau de proteção dos consumidores e do ecossistema publicitário nas plataformas digitais.
Vamos nos concentrar no ITP para efeito das respostas.
O que temos claro é que, para melhorar a segurança das marcas e dos consumidores nos ambientes online, devemos caminhar para solução coletiva, porque estamos falando de problema sistêmico, e não individual.
Não há atitude efetiva que possa ser feita por empresa de forma isolada.
Nenhum agente do mercado conseguirá reivindicar transparência e sistemas de controle de brand safety às plataformas apenas para seus negócios.
Portanto, a transparência deve ser de toda a publicidade veiculada nas plataformas para que seja passível de observação de forma independente.
Mais do que isso, a transparência deve ser o mais simples possível, sem as complexidades que podem ser inerentes ao ambiente digital.
Para isso os anunciantes, os consumidores ou qualquer agente externo ao processo, deve poder verificar todas as peças publicitárias que foram publicadas e pagas.
Cabe às plataformas oferecerem meios de se obter acesso a esse material e os repositórios de anúncios oferecidos na Europa são um caminho bastante interessante
M&M – A polícia de SP prendeu, recentemente, uma quadrilha que criava sites clones de empresas conhecidas para vender produtos que não eram entregues.
E a publicidade desses sites acontecia nas redes Facebook e Instagram, da Meta.
Como expandir a segurança dos dados, no caso, desses sites que foram clonados e coibir a publicidade de falsos sites?
Rose Marie e Borges – O que percebemos é que os fraudadores se sofisticaram.
Muitas vezes, sequer usam uma única plataforma para aplicar o mesmo golpe.
É comum termos golpes que usam anúncios na Meta, mas, também, tem links patrocinados no Google.
Nesse caso, por exemplo, se o consumidor sair do ambiente da Meta para fazer busca no Google, é capaz de validar a fraude e cair no golpe mesmo ao fazer busca adicional.
Não podemos transferir para a vítima a responsabilidade dos golpes.
O fraudador já aprendeu que, com as ferramentas de publicidade digital, consegue-se segmentar exatamente as pessoas mais vulneráveis aos golpes e garantir seu anonimato.
Também não podemos delegar aos anunciantes a responsabilidade de procurar os anúncios que estão sendo veiculados com a sua marca de forma fraudulenta.
A melhor forma de combater isso é trazer mais observadores ao ecossistema, por isso a transparência se torna fundamental.
A própria concorrência entre anunciantes estimula essa observação.
Explicamos de forma melhor: como o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) atua em casos de propagandas abusivas ou enganosas?
Às vezes, através de denúncias dos concorrentes que, ao monitorar o mercado, denunciam os abusos.
Aumentar o número de observadores através da transparência fará com que a gente iniba os anúncios tóxicos desse ambiente.
A transparência também facilitará, em casos criminosos, que organismos de combate ao crime possam atuar com mais agilidade.
M&M – O relatório da UFRJ ressalta que nenhuma plataforma publica relatórios de transparência sobre serviços de publicidade no Brasil.
No Congresso Nacional, está em debate o Projeto de Lei 123/24 (PL 123/24) que determina que as relações de consumo entre o usuário de internet e os provedores de aplicações (como sites e redes sociais) serão subordinadas ao Código de Defesa do Consumidor, especialmente em relação à propaganda.
Qual sua opinião sobre a evolução desse debate e a efetiva regulamentação?
Rose Marie e Borges – Para nós, esse debate precisa ser qualificado, sair da discussão ideológica, para que a sociedade e os agentes de mercado compreendam os riscos e as perdas financeiras que implicam ambiente online sem transparência e sem responsabilidade.
Todas as empresas precisam ser responsáveis pelos produtos e serviços que vendem. Esse é o requisito de um mercado ético e saudável.
Porém, no Brasil, as plataformas não se responsabilizam pelos serviços que oferecem porque se protegem por meio do artigo 19 do Marco Civil da Internet.
Esse artigo indica que os provedores de internet não são responsáveis por conteúdo de terceiros, e as plataformas entendem que a publicidade entra nesse critério.
Entretanto, é importante garantir que as big techs, como qualquer outra empresa, também se responsabilizem pela integridade dos seus serviços – que são basicamente oferta e recomendação de conteúdo e publicidade online – e ofereçam segurança para seus clientes: os consumidores e os anunciantes.
Para que isso aconteça, não precisamos necessariamente criar leis, mas garantir que as regras que valem no mundo off-line também valham no online.
Ou seja, se há relações de consumo dentro das plataformas digitais, essas devem se subordinar ao Código de Defesa do Consumidor como qualquer outra empresa.
Assim, não podemos criar um regime de exceção para essas empresas em detrimento de todo o mercado.
Mas, de fato, reconhecemos que o mercado das plataformas digitais tem uma série de especificidades que devem ser tratadas em leis específicas.
Nosso ponto é: aquilo que já está regulado no Brasil deve ser respeitado.
M&M – Qual é o papel das entidades do setor publicitário, como o Conar, e players como as agências de publicidade para que as big techs tenham tratamento equitativo no que se refere às regras publicitárias brasileiras?
Rose Marie e Borges – O ecossistema publicitário inteiro perde quando aumentam as fraudes online e se perde a confiança do consumidor no ambiente das plataformas.
Portanto, as fraudes abalam até segmentos que nasceram nesse ecossistema, como a creator economy.
Assim, se as plataformas permitem o uso da imagem de uma pessoa manipulada artificialmente para vender produto falsificado ou aplicar fraude, o problema não se extingue na descoberta dessa ou daquela fraude.
Contudo, ao contrário, o problema se desdobra na medida em que os consumidores passam a duvidar na próxima vez que forem impactados pela imagem da mesma celebridade porque não conseguirá distinguir se o anúncio é legítimo ou fraudulento.
Ou seja, as audiências passam a duvidar do que é falso ou verdadeiro.
Os mecanismos de verificação que as plataformas criaram, tais como selos digitais de autenticidade, estão sendo ineficientes para coibir isso.
O fato incontestável é que todos os veículos de mídia são passíveis de verificar a totalidade da publicidade, por maior que seja, exceto as plataformas digitais.
Além disso, a publicidade nos veículos de comunicação é pública, nas plataformas digitais é individualizada.
Um anúncio digital (de qualquer formato) é entregue de forma micro segmentada no seu feed, na sua busca, ou no seu pré-roll, e só será visto por você.
De fato, se não houver uma forma desses anúncios personalizados serem observados por agentes externos, não teremos equidade.
A verdade é que não conseguimos nos debruçar sobre esse modelo e aperfeiçoá-lo porque não há transparência e acesso a dados.
Portanto, com o que temos em mãos, buscamos demonstrar que ambientes com mais transparência tendem a ser mais éticos e mais seguros, ainda que tenham problemas.
Assim, acreditamos que o mercado anunciante e as agências devem começar a priorizar ambientes mais saudáveis de mídia e com menos riscos para suas marcas e consumidores.
Os índices de transparência que lançamos podem ser um dos instrumentos para tomada de decisão.
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