Trump e big techs: o que esperar do governo do republicano?
Especialistas desenham impacto da vitória de Donald Trump sobre as empresas de tecnologia e possíveis desdobramentos sobre a mídia norte-americana
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Giovana Oréfice
12 de novembro de 2024 - 6h01
A vitória do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, foi reconhecida pelos principais nomes da insútria de tecnologia. Presidentes de grandes corporações, como Meta, Google, Microsoft e Amazon, vieram às redes sociais para parabenizar o republicano pelo resultado das eleições presidenciais, que tinham Trump e Kamala na corrida pelo posto.
Mark Zuckerberg, CEO e fundador da Meta, postou no Threads: “Temos grandes oportunidades à nossa frente como país. Estamos ansiosos para trabalhar com você e sua administração”. Já Jeff Bezos, da Amazon, desejou sucesso a Trump em “liderar e unir a América que todos nós amamos” e o parabenizou pelo “retorno político extraordinário e vitória decisiva”. Vale lembrar que Bezos é também dono do The Washington Post. Confira:
Big congratulations to our 45th and now 47th President on an extraordinary political comeback and decisive victory. No nation has bigger opportunities. Wishing @realDonaldTrump all success in leading and uniting the America we all love.
— Jeff Bezos (@JeffBezos) November 6, 2024
O segundo mandato de Donald Trump, com início em janeiro de 2025, traz à tona as possíveis implicações para o cenário da tecnologia nos Estados Unidos e, consequentemente, no mundo, para os próximos quatro anos. A relação do republicano com as big techs tem um histórico conturbado, sobretudo devido às acusações sobre parcialidade política, aponta André Miceli, coordenador do MBA de marketing e negócios digitais da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Crítico assumido de uma falta de liberdade de expressão nas redes sociais, em 2020 Trump chegou a argumentar que as gigantes da tecnologia estivessem interferindo em sua campanha eleitoral e levantar vieses políticos, ao alertar sobre possíveis informações falsas em postagens e até suspendê-las nas plataformas. Além disso, o então presidente assinou um decreto para a reformulação da seção 230 da Lei de Decência na Comunicação, que supostamente daria maior poder às big techs por não serem responsabilizadas pelos conteúdos publicados pelos usuários em suas redes sociais.
Miceli recorda, contudo, que as empresas de tecnologia estão bastante habituadas com os problemas com presidentes, partidos políticos e governos. Durante sua administração, Barack Obama enfrentou uma crise devido ao vazamento de informações sigilosas de segurança no país por parte de Edward Snowden, ex-técnico da CIA, que utilizou servidores de companhias como Google, Apple e Facebook para espionar a população.
Já o governo de Joe Biden buscou limitar o domínio das grandes plataformas especialmente nas questões de desinformação. A política, segundo o porta-voz da FGV, foi uma continuidade da visão de Trump, mas com a opinião democrata sobre o tema. Biden também nomeou líderes para agências reguladoras com o histórico de defesa das regulamentações mais rigorosas para essas empresas – os quais devem ser substituídos por representantes de Trump nesta nova etapa.
“O impacto dessa mudança e substituição de representantes pode ser a diminuição de restrições regulatórias. Talvez elas [as empresas] sejam autorizadas a operar com maior liberdade em expandir suas operações sem a ameaça de ações antitruste, pelo menos não tão significativa”, explica Miceli. Hoje, o Google enfrenta um processo na justiça norte-americana que pode levar ao desmembramento de sua divisão de anúncios digitais.
O que acontece nos EUA pode acabar reverberando no restante do mundo, sobretudo entre países com alinhamento político parecido com o de Trump, que mais uma vez assume como líder da maior potência global. É importante lembrar, também, que as principais big techs do mundo são norte-americanas.
A campanha de Donald Trump foi bastante endossada pelo bilionário Elon Musk. O X (antigo Twitter) foi palanque para que o CEO de empresas como Tesla e Starlink demonstrasse seu apoio ao republicano. Uma reportagem do The New York Times aponta que Musk realizou mais de 400 postagens em seu perfil na rede social entre a última terça-feira, 5, dia em que o resultado foi divulgado, e sexta-feira, 8.
Ainda, o proprietário do X foi convidado pelo presidente eleito para liderar uma nova comissão de eficiência governamental em sua administração. Neste sentido, Marcelo Crespo, coordenador do curso de direito da ESPM, cita um possível conflito de interesses na relação, à medida em que Musk tem um papel importante dentro das empresas em que é proprietário ou tem grande participação.
Já para Eric Messa, coordenador das graduações em Publicidade e Relações Públicas da FAAP/SP, a aliança sugere um possível realinhamento das políticas de comunicação digital, e é provável que a aproximação entre Trump e Elon Musk reforce a ideia de uma liberdade de expressão radical e irrestrita nas redes sociais.
“A aliança sugere um possível realinhamento das políticas de comunicação digital, onde a liberdade de expressão será interpretada de forma mais ampla e menos regulada. Essa perspectiva pode representar uma mudança significativa na forma como as plataformas tecnológicas lidam com conteúdo e moderação”, reitera.
Outro importante nome na nova configuração de governo dos Estados Unidos é Peter Thiel. Defensor do bitcoin, o também bilionário chegou a doar para a campanha de Donald Trump e, em 2016, esteve entre os conselheiros não oficiais de Trump para questões digitais.
Entre as promessas do novo presidente para as criptomoedas está manter o nível atual dos ativos de bitcoin da Casa Branca, criar um conselho consultivo presidencial para o assunto garantir que elas sejam mineradas e cunhadas nos EUA.
As demais promessas envolvem importantes sanções à China. O segundo mandato de Trump pode vir acompanhado de tarifas de até 60% sobre importações chinesas. No âmbito das redes sociais, ele também tentou banir a plataforma e o app chinês WeChat dos Estados Unidos.
Atualmente, o TikTok encara uma possível proibição nos Estados Unidos por questões envolvendo segurança nacional. Contudo, Trump se posicionou a favor da rede social em nome da concorrência junto a outras big techs, durante entrevista cedida à Bloomberg BusinessWeek em julho.
Houve também um reconhecimento da plataforma em disseminar conteúdos estrategicamente relevantes e que possam favorecê-lo, alerta Messa. Por isso, possíveis sanções e políticas protecionistas que possam significar obstáculos para a atuação do TikTok no país devem ser pensadas com cautela.
A China também está entre as nações que lideram os avanços em inteligência artificial. “Naturalmente essas questões com a China seguirão reverberando. Os Estados Unidos vão ter que criar condições para suprir a cadeia produtiva ou pelo menos parte dela, especialmente a que se concentra na China hoje”, pontua Miceli.
Ainda do ponto de vista econômico, há uma promessa de redução de impostos e da taxa de juros que, aliadas a uma possível desregulamentação, podem criar um ambiente mais favorável para empresas e startups, com investimentos migrando para iniciativas com mais apetite ao risco.
Ao parabenizar Trump pela vitória, Sundar Pichai, CEO do Google, apontou: “Estamos numa era de ouro da inovação americana e estamos empenhados em trabalhar com a sua administração para ajudar a trazer benefícios para todos”.
O posicionamento controverso de Trump é visto também junto à imprensa norte-americana. A desconfiança e, muitas vezes, limitações impostas à mídia tradicional, fez com que o magnata lançasse sua própria rede social, a Truth Social, em 2022 – um ano depois de ser banido do Twitter sob a antiga gestão da plataforma, antes da aquisição por Elon Musk. À época, ele também foi suspenso no Instagram, Facebook e Snapchat.
Apoiadores norte-americanos chegaram a apontar que a vitória de Trump neste ano significava uma eventual derrota da mídia tradicional norte-americana, que apostava na vitória da opositora Kamala Harris.
Durante a corrida eleitoral, por exemplo, o Washington Post, de Bezos, manteve-se neutro em relação a seu posicionamento político. A decisão custou ao jornal uma queda de 10% no número de assinantes.
Os especialistas defendem que, de acordo com o histórico e o cenário atual, o país deverá continuar vendo uma ascensão das redes sociais e estratégias de comunicação digital em detrimento de esforços voltados a veículos de imprensa. “Essa também pode ser uma estratégia para conquistar mais atenção das grandes empresas de mídia americana”, aposta Messa.
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