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Songs from the big screen

Em compasso de espera pelos resultados dos primeiros eventos-teste no País, anunciantes aprimoram conceito de multiverso com experiências no digital em plataformas de streaming e games para manter diálogo com fãs de entretenimento


8 de junho de 2021 - 12h04

Por Carolina Huertas e Thaís Monteiro

No final de maio, o Governo de São Paulo anunciou a realização de 10 eventos-testes em parceria com o setor privado no modelo piloto para verificar as consequências e possibilidades de retorno do segmento no segundo semestre. Entretanto, assegurou que essa decisão não representava uma retomada, mas uma forma de ter um planejamento seguro, “com responsabilidade, baseado na ciência e baseado em dados”, segundo a secretária de desenvolvimento econômico, Patrícia Ellen.

Como São Paulo concentra a parte brasileira de diversas turnês musicais internacionais e shows nacionais, o anúncio representa uma esperança para o setor. De acordo com Duda Magalhães, vice-presidente do Grupo Dreamers, não se constrói uma marca apenas com lives e elas não entregam a mesma emoção do ao vivo. “Quando os estádios estiverem abertos ao público, os grandes shows, as corridas, teremos uma sociedade esperando ansiosamente para viver isso novamente”, assegura. O Grupo Dreamers é responsável pela realização do Rock in Rio. O festival teve de ser cancelado em 2020 e 2021. A próxima edição está marcada para setembro de 2022 e leva a assinatura “Em 2022, o mundo será nosso outra vez”. Em locais como Austrália e Nova Zelândia, a realização de shows está praticamente normalizada e até no Brasil há turnês programadas para o final do ano.

(crédito: Giovana Papariello)

Enquanto a realização de festivais foi vetada em boa parte do mundo, o mercado musical passou a oferecer experiências gratuitas e pagas em plataformas de streaming e videogames. O conceito de multiverso começou a ser discutido com a realização de shows no Roblox, como o de Lil Nas X, e em videogames, como Fortnite. No entanto, o evento virtual não oferece ao público a possibilidade de estar junto e compartilhar emoções. “Foi uma solução que o mercado encontrou para suprir a necessidade de entretenimento durante a pandemia, uma solução que certamente veio para ficar por conta do alcance incomparável que o virtual tem, mas nada se compara a emoção de ver seu artista preferido de perto em show com seus amigos, ou de uma competição esportiva. O ser humano é gregário e sempre valorizou isso”, defende Magalhães.

Diferentemente do Rock in Rio, o Coala Festival realizou uma edição televisionada em 2020. De acordo com a organização, quando começou a pandemia, a edição física de 2020 já estava programa da, então, não haveria adiamento. Com a evolução dos casos, o Coala decidiu se desafiar a criar uma edição transmitida no YouTube e na TNT. A exibição já era uma estratégia da edição do Coala Festival. O acordo com a TNT era vigente e evoluiu para uma parceria de transmissão da edição virtual. O line-up foi formado por Gilberto Gil e o trio Gilsons, Novos Baianos, Nego Bala, MC Tha com Rico Dalasam, Mariana Aydar com Mestrinho e quatro DJ sets.

“Tivemos um grande aprendizado e conseguimos manter a marca e o ecossistema do festival ativos, o que também era uma premissa dessa decisão”, diz Gabriel Andrade, sócio-fundador do Coala. Segundo o executivo, a organização conseguiu explorar o processo criativo de transpor o evento para o digital e ferramentas que poderão auxiliar a empresa a voltar preparada com a retomada dos eventos e explorando todos os pontos de contato e de experiência que o digital oferece, como transmissão, podcasts, salas de reunião. “Acredito muito em uma retomada forte, com um grande anseio da população pela experiência ao vivo como sempre foi, mas com o complemento dessas camadas digitais”, projeta.

No último ano, as gravadoras também redirecionaram seu investimento de eventos para lives, eventos online e ações que pudessem engajar o público que consome música, mesmo sem sair de casa. A Universal Music aderiu à tendência com a iniciativa “Festival Música em Casa”, evento de música online com line-up formado por talentos da GTS, empresa de gerenciamento artístico. O festival remoto aconteceu em março com apresentação e entrevistas realizadas por Sabrina Sato, Gominho e outros influenciadores, interagindo com os artistas, além de lives próprias dos artistas da gravadora.

Atualmente, a companhia já programa turnês de artistas brasileiros fora do País como Vitão e Bruno Martini, pois países em que a retomada já está avançada apresentam oportunidade de receita e novos públicos. “Estamos buscando parceiros locais de gestão de carreira e vamos fazer tour para conseguir movimentar o negócio”, explica Paulo Lima, presidente da Universal Music Brasil. Para o executivo, a volta dos eventos é imprescindível até para novos artistas. “Eles precisam do ecossistema funcionando para que sua música seja reconhecida. Perdemos o ecossistema do mundo físico. Como o fã se apaixonará, de fato, pelo conceito de um artista se não consegue ver o show? O Brasil é uma força continental e preci sa de música”, afirma.

Show do rapper norte-americano Lil Nas X na plataforma social Roblox registrou mais de 34 milhões de visualizações (crédito: divulgação)

Em 2020, a Sony Music Brasil promoveu mais de 20 lives e criou projetos sob a marca Filtr, plataforma de shows da gravadora, como o “Filtr em Casa”, em que artistas interpretam suas canções favoritas em versões intimistas; a “Festa Junina by Filtr”,” arraial virtual com lives, brincadeiras e vídeos de artistas e influenciadores; a websérie “Filtr Next”, que aborda o desenvolvimento da carreira musical de um artista; e o “Casa Filtr”, que visa unir talentos de diferentes gêneros para colaborações.

De acordo com Wilson Lannes, vice–presidente da Sony Music Entertainment no Brasil, o mercado digital já era relevante e correspondia a quase totalidade do mercado de música gravada do País antes. “Durante a pandemia mantivemos a nossa estratégia, pois já atuávamos no mercado digital há vários anos. Adicionalmente, reforçamos os nossos esforços na marca Filtr, que é uma comunidade de entretenimento que tem o objetivo de aproximar artistas e fãs via curadoria de conteúdo e música”, explica. Em outro movimento, já neste ano, a gravadora adquiriu a Som Livre, que antes pertencia ao Grupo Globo.

Com o retorno dos eventos, o executivo acredita que a demanda reprimida resultará em venda de ingresso e ativações de marcas fortes, e as lives se manterão como alternativa para o público que não pode comparecer presencialmente, tornando os shows e festivais híbridos. Outras tendências observadas pelo VP são as experiências em realidade virtual ou plataformas de games, como shows virtuais de Lil Nas X, no Roblox, e de Travis Scott, no Fortnite. “Assim, num futuro não muito distante, aposto na junção da realidade virtual e na maior utilização de inteligência artificial e machine learning na concepção de produtos ligados às experiências com música”, diz Lannes. Para Lima, da Universal, o universo dos games sempre foi povoado de música, mesmo que de pano de fundo, mas a tendência é que ambos os segmentos se aproximem cada vez mais.

nterativo, show do DJ Marshmello no game Fortnite reuniu cerca de 10 milhões de usuários simultaneamente, segundo estimativas (crédito: divulgação)

Rotas da ativação
A paralisação dos eventos não só afetou o próprio setor, mas também a estratégia dos anunciantes patrocinadores e apoiadores que confiam boa parte da sua visibilidade e experiência com o consumidor em festivais e shows. O Digio foi uma das marcas que adaptou sua participação no setor para o online. Como patrocinador do festival João Rock, que em 2020 teve sua edição de forma virtual, o banco criou a “Sala Digio”, espaço de interação dos artistas com público via live e bate-papo no Instagram respondendo às perguntas enviadas durante a transmissão. Ainda no mesmo ano, a empresa esteve presente em outras lives, porém, em 2021, tomou a decisão de redirecionar esses investimentos para o universo de games, outro setor que a marca investe. “Decidimos focar em games e quando os eventos presenciais voltarem, reavaliaremos, ainda não sabemos como ou quando, mas está no nosso plano retomar assim que possível. Estamos olhando o que está acontecendo e sabemos que teremos um efeito champagne, onde viveremos quatro anos em dois em número de eventos”, comenta Loreta Caporrino, head de marketing do Digio.

A Elo é outra marca que tem no setor de shows e entretenimento como um de seus pilares de investimento. Segundo o Luis Cassio, diretor de comunicação e marketing da marca, a transição para o modelo digital foi algo natural do mercado, onde a Elo conseguiu alcançar bons resultados através das lives e manter presença de marca. Porém, nesse ano, não seguiram pelo mesmo caminho. “Apesar do sucesso do ano passado, entendemos que 2021 não é um ano de lives e sim um ano para construirmos a marca de outra maneira. Porém, todas as nossas parcerias continuam vigentes, não rompemos com ninguém e retomaremos assim que for viável”, adianta o diretor.

Neste momento de estagnação, a Elo decidiu atuar através do projeto Elo Do Bem, que em 2020 forneceu cinco mil cestas básicas para seus parceiros do setor de turismo, também muito impactados. Neste ano, a marca decidiu ampliar a ação para os profissionais que trabalhavam com shows e entretenimento, doando 15 mil cestas para profissionais de iluminação, montagem de palco etc. e que estão sem trabalhar desde o começo da pandemia.

O Grupo Heineken também atuou de forma solidária. Com o cancelamento da edição de 2021 do Rock In Rio, os patrocinadores realizaram uma doação de R$ 4,5 milhões ao projeto Salvando Vidas, que visa minimizar o impacto da pandemia no sistema de saúde. Além do redirecionamento de verbas, o grupo enfrentou o desafio de se conectar com o público realizando eventos Drive-in como na final da Champions League de 2020, projetos de branded content, drive-thrus de ativação e mais de 70 lives. Ainda explorando o ambiente digital, foram desenvolvidos podcasts como o da marca Heineken, que apresenta artistas para falar sobre música, e a plataforma Devassa Tropical, onde a marca uniu Duda Beat e Nando Reis num show e criou uma plateia em telas de led, onde os fãs se cadastraram para aparecer.

“Estamos nos preparando para uma grande volta e, com certeza, esses foram anos de muito aprendizado, estudo e desenvolvimento de tecnologias voltadas para o entretenimento. Teremos eventos sempre entregando uma experiência física, mas também algo específico em uma segunda tela para as plataformas digitais e aqui está a grande riqueza dessa evolução: conseguir conectar com diferentes consumidores e entregar diferentes conteúdos. Acredito que teremos um novo mundo de entretenimento”, diz Guilherme Bailão, head de brand experience e sponsorship do Grupo Heineken.

Fatima Pissarra, CEO da Mynd, também acredita que esse foi um momento de descoberta para artistas e marcas entenderem que é possível levantar outras frentes, conhecer as ferramentas e explorar as opções do digital, e que, no momento de retomada dos eventos, veremos uma transformação e mistura dos dois modelos. Ao contrário do que algumas marcas enxergam, ela não acredita que o momento das lives acabou. O formato teve seu auge, mas não pode ser descartado e é preciso ter uma melhor percepção, pois muitos só consideram sucesso audiências de milhões de pessoas, mas um show físico tem, em média, cinco, dez mil pessoas, ou seja, uma live de 100 mil pessoas já poderia ser considerada um sucesso.

“As marcas precisam aprender também a entender que existiu um boom, mas não acabou, show é algo que não vai acabar. É preciso entender como adaptar e unir. Acredito que teremos uma adaptação nos modos de patrocínio, não mais restringido só localmente, por exemplo, patrocinando um show em Salvador, mas transmitindo em live de forma nacional, falando com mais pessoas e amplificando esse patrocínio”, afirma.

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