15 de janeiro de 2025 - 6h00
Passados os primeiros dias da NRF 2025, pude observar que o tema dominante nesta edição é, conforme esperado, inteligência artificial. Muitas novidades empolgantes têm sido apresentadas, permitindo vislumbrar um pouco do que o futuro reserva para o varejo nos próximos anos. Alguns dos avanços e tópicos tecnológicos que mais me chamaram a atenção foram:
Computer vision, ou visão computacional. Trata-se da tecnologia na qual robôs e computadores capturam imagens e processam dados a partir delas. Um exemplo prático é o checkout feito apenas colocando o produto num carrinho, em que um computador compreende quais itens estão sendo levados e permitindo pagar apenas aproximando o cartão.
Agentes digitais, que são sistemas autônomos inteligentes que não exigem comandos humanos para executar funções. É um dos tópicos mais quentes e importantes da feira. Há muitos casos sendo explorados de maneiras diferentes, mas os principais são de assistentes de compra, seja por chat ou por vídeo, que utilizam avatares muito parecidos com pessoas.
Digital twins, ou gêmeos digitais. Aqui a ideia é replicar um objeto físico num ambiente digital, permitindo que a IA proponha melhorias e ganhos de eficiência. Um exemplo que me chamou a atenção foi o case de uma varejista de materiais de construção. Utilizando gêmeos digitais de centros de distribuição, espaços de armazenamento e lojas – e câmeras em real time que atualizam constantemente o que está acontecendo em cada local –, a IA faz propostas de melhoria de volume de estoque, posicionamento dos itens e até contenção de danos no caso de algum acidente.
Muitas das novas tecnologias apresentadas na NRF ainda têm poucos casos consolidados de uso, que já tenham gerado resultados reais para os negócios. Algumas são ainda provas de conceitos, outras já estão em estágios mais avançados de adoção. De todo modo, já podemos entender, com alguma nitidez, para onde o mundo está indo e quais são as possibilidades futuras.
Na NRF, outros temas entram de forma mais indireta na conversa sobre IA, como, por exemplo, a hiper personalização – seja da jornada de compra ou dos produtos que as pessoas podem consumir. O termo “hiper personalização” pode ser até mais antigo que algumas ferramentas de IA, mas a coleta e processamento de dados via inteligência artificial ajudam muito a gerar insights mais rápidos e recomendar conteúdo durante a jornada de compra. O processo de compra se torna também uma troca rica, em que as partes aprendem, conversam e criam emoções e experiências.
E, aqui, chegamos àquele que, na minha avaliação, é o ponto mais crítico que está por trás de praticamente todas as discussões da NRF 2025: a utilização de dados. É impossível falarmos de uso de IA sem uma base sólida de dados que serão responsáveis por treinar e evoluir os modelos utilizados. Essa é uma conclusão especialmente relevante para o mercado brasileiro. Vemos poucas empresas no país, hoje, com maturidade de coleta e utilização de dados em patamares aceitáveis para fazer o mínimo uso de ferramentas como essas.
Na média da maturidade digital e de dados dos players brasileiros, casos que poderiam ser considerados simples – em que o treinamento do modelo é feito com dados em teoria já disponíveis, como, por exemplo, informações de catálogos de produto e sortimento loja a loja – acabam ficando complexos e de difícil implementação, levando a investimentos longos ou resultados frustrados. Tudo isso por causa da falta de uma boa estrutura de dados.
Ou seja, fica uma provocação para as empresas: é necessário priorizar o estabelecimento de uma estratégia de coleta e tratamento de dados. A partir disso, e colocando a experiência do cliente no centro, será possível redesenhar discussões estratégicas, aproveitando os insumos e caminhos valiosos apontados pelos times de dados e tecnologia.
É claro que nada disso é fácil. Há dois desafios principais que se impõem para as empresas que desejam adentrar nesse universo. O primeiro é que tudo isso exige investimento, capacidade técnica e uma cultura empresarial que abrace a mudança e dê a devida atenção para a coleta e estruturação de dados. O segundo diz respeito à privacidade e uso desses dados – existe uma grande discussão e preocupação em como captar e utilizar esses números respeitando as preferências e os limites impostos pelos consumidores.
Os primeiros dias de NRF, portanto, nos mostram que os avanços tecnológicos trazidos pela IA são empolgantes, mas exigem uma sólida base de dados – e cultura corporativa – que poucas empresas no Brasil têm. Somente a partir dessa estruturação é que será possível mergulhar de cabeça na nova era tecnológica do varejo.