20 de janeiro de 2023 - 15h38
Crédito: Divulgação
Passados alguns dias do evento provavelmente mais importante do varejo mundial, escrevo ainda aqui de New York após algumas reflexões acerca do “so what?” que fica de legado natural de um encontro dessa magnitude.
Poucos entendem que a NRF não é um evento para tentarmos “assistir todas as palestras” ou apreender e registrar cada detalhe apresentado por participantes, expositores ou fóruns paralelos. Um evento de uma associação centenária (NRF surgiu em 1911) e que se repete há décadas precisa ser entendido quase como um fluxo, em uma era pautada pela instantaneidade não-linear registrada digitalmente e potencializada pelas redes sociais.
Não foram coincidências, por exemplo, termos as palestras plenárias pautadas desde o início do evento por grandes temas, tais como:
– Preocupação com as questões da macroeconomia e o onipresente tema da inflação (e a brilhante palestra de Kate Ancketill e seu conceito dos 3C’s para explicar o contexto de crises em que vivemos foi um dos pontos altos do evento);
– Carinho e cuidado com as pessoas, tão afetadas pela pandemia – e o foco em não somente cuidarmos bem de nossos clientes, mas principalmente de nossos colaboradores, frequentemente esquecidos e cujo bem-estar possui enorme impacto nas comunidades e nos negócios. Nesse contexto, a brilhante Simone Biles foi uma muitíssimo bem-vinda participante de destaque, dada a profusão de casos de doença mental surgindo nas organizações;
– Sustentabilidade, preocupação com o meio-ambiente, questões como reparo de roupas, consumo consciente, reutilização, economia circular e afins (poucos estiveram por lá, mas a última palestra plenária com a presença do ator Kal Penn foi simbolicamente fundamental);
– Varejistas tradicionais disruptados pelo digital falando sobre como precisaram rever emergencialmente suas estratégias de colocar o cliente no centro e entender que a proposta de valor de suas organizações precisava ser reconstruída.
E vários outros recados importantes de tendências ou questões às quais todos os líderes de negócio deveriam estar cada vez mais atentos, apresentadas dentro da curadoria e pautas temáticas previamente pensadas para o evento e que são complementares, ano após ano, às pautas anteriores – compondo esse fluxo mais macro de “recados” que tão poderosa e estratégica associação deseja compartilhar ao longo de seu “Big Show”.
Entretanto, para mim os dois recados que realmente marcaram e que gostaria de ressaltar nesse texto são outros, pois acredito que finalmente atingimos um ponto de inflexão sem retorno nessas questões. Foram eles:
– Tecnologia e dados: nenhuma tecnologia ou solução apresentada nessa NRF foi, a princípio, absolutamente nova. Porém, nunca antes houve tamanha profusão de exemplos concretos de aplicação de tecnologias cada vez mais baratas (exemplo: câmeras computacionais) em prol do entendimento profundo de como mapear a jornada do consumidor com dados também nos canais físicos, anteriormente uma “fronteira inacessível”. A AmazonGo e sua loja onde praticamente todos passaram para ver, comprar e interagir dentro do conceito “Just Walk and Go” foi um dos outros temas “onipresentes” do evento – mas qualquer passeio nos stands de expositores ou mesmo no “innovation lab” (soluções de start-ups mais early stage) demonstrava soluções até há pouco tempo impensáveis para alavancar melhorias operacionais em todas as categorias do varejo, com soluções logísticas e de automação baseadas em tecnologias cada vez mais acessíveis – e que além disso permitem proporcionar diversas experiências únicas para os consumidores;
– O Advento da Geração Z no Mercado Consumidor: a primeira geração nascida na era digital e sua chegada mais presente ao mercado de consumo a partir de seu natural fortalecimento do poder de compra ao longo dos anos foi um tema discutido em praticamente todas as palestras e fóruns. Sua ânsia por novidades instantâneas vitaminadas pela “tiktokzação” da forma de produzir e consumir conteúdo, a maneira de se relacionar dentro do grupo de amigos e sua valorização da coletividade (física e virtual) em conjunto com a microcomunidade em que estão inseridos foram um assunto presente em tudo – pois ficou nítido que as empresas ainda estão aprendendo como reagir a consumidores que naturalmente entendem o digital como extensão do físico, e vice-versa. O painel com participação da Roblox para falar sobre metaverso e a diversidade de participantes do mercado de moda falando sobre o consumidor junto com influenciadores em inúmeros painéis sempre lotados foram testemunhas da ansiedade dos participantes em tentar entender melhor um pouco de toda a transformação em curso.
Ainda que o rápido envelhecimento populacional seja um tema igualmente importante (e, para mim, o grande “gap” dentro do conteúdo dessa NRF), ficou evidente que o varejo em geral ainda não sabe como integrar dados e tecnologia para prover as melhores experiências de engajamento e consumo de forma alinhada aos valores, desejos e necessidades dessa nova onda de consumidores-Z, ávida por interagir com marcas que professem e pratiquem autenticidade em tudo o que fazem, desde tornar o mundo melhor até apoiar os colaboradores da microcomunidade de bairro.
O varejo precisará cada vez mais, em sua enorme resiliência histórica (também ressaltada nesse evento), ser capaz de novamente se reinventar para passar da mera venda de produtos para organizações que busquem uma quota efetiva da vida de seus clientes, e não somente de sua cesta de consumo.
Espero poder estar daqui a 5 anos na NRF-2028 e ver que esse setor econômico, tão fundamental para definir o mundo em que vivemos, haja entendido profundamente essas mensagens e siga proporcionando experiências incríveis de consumo e lazer com real engajamento junto aos clientes e resultados financeiros superiores.
Mr. Javitz, que tão generosamente nos recebe anualmente no Centro de Convenções que eternizou seu nome, certamente ficará muito contente no plano em que de hoje nos observar.