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Opinião

A melhor campanha de todos os tempos (que ninguém viu)

Nem o keynote mais poderoso já imaginado e nem os consultores da Master Intelligence of Universe adiantaram


14 de setembro de 2016 - 12h52

Sonhava-se, desde sempre, com esse momento. Finalmente seria construída a melhor campanha de todos os tempos. Estavam todos em polvorosa. Mal podia-se dormir. Seria uma dominação total. Um tapa na cara da concorrência. Mudaria a história da marca. Colocaria a agência no Olimpo. Carreiras iriam para outro patamar. O mercado nunca mais seria o mesmo.

Dinheiro não era problema. Seria usado o keynote mais poderoso já imaginado. Seriam slides e mais slides de pura disrupção estratégica. “Quero Harvard, quero frases de Stephen Hawking, contratem dezenas de consultores da Master Intelligence of Universe e cotem George Clooney para fazer a apresentação”.

Sabia-se muito bem do desafio criativo, precisava-se dos melhores.“Sim, tem de ser do tamanho de nossa ambição, vamos fazer um hackathon criativo. Quero Nizan, Olivetto e Serpa, imersos num mar gigantesco de post-its, cocriando o roteiro do filme”. A produção seria apoteótica. “Aprovado: vamos de Game of Thrones like”.

Na mídia, comprou-se todo o inventário disponível. Às 21hs, em todos os meios, de todas as formas, programáticas ou “desprogramáticas”, com nomes em inglês ou em português — tudo dominado. O país iria parar para assistir ao lançamento da campanha. “Vamos mudar o jeito de fazer publicidade no País. Temos de pensar grande. Temos de cercar a audiência por todos os lados. Cannes é nosso sobrenome. 360o o nosso apelido. Awarness é o nome do jogo, amigos.”

O dia chegou. Conforme planejado, a campanha foi ao ar. Release bombástico. Champagne a rodo na festa de lançamento. Anúncios do case se sucederam. A equipe rodiziava-se em premiações e palestras ao redor do mundo. Ventilava-se até um carregamento extra de Leões em Cannes. No mercado, só se falava nisso: a melhor campanha do mundo era deles.

Mas, fora daquela bolha, lá longe, lá na vida real, algo estava estranho. Havia-se batido todos os recordes de views, mas ninguém parecia ter visto. Liderou-se por semanas o ranking de lembrança, mas ninguém se lembrava muito bem. A campanha tinha gabaritado na pesquisa, mas não virava bordão, ninguém fazia meme para sacanear, na mesa de bar nada se falava sobre ela.

Até hoje, não se sabe ao certo o que pode ter acontecido — historiadores tentam entender o fenômeno da melhor campanha de todos os tempos que ninguém viu. O grupo de WhatsApp esteve imperdível bem na hora do comercial? As imagens da sétima temporada de GOT vazadas pelo figurante no YouTube eram tão esperadas assim? Seria o conteúdo novo daquele garoto (que eu não lembro o nome) que bomba no Snapchat mais urgente do que era o lançamento nacional daquele novo posicionamento da marca? Foi bem o dia onde descarregaram toda segunda temporada de Stranger Things? Estava a timeline em plena discussão sobre #foraalguém? As pessoas estariam caçando Pokémons bem nessa hora?

Quem sabe no futuro venhamos a saber. Mas, suspeita-se de que algo (ainda mais espetacular do que aquela campanha criada para ser espetacular) aconteceu. E, pasme: aconteceu de verdade e foi relevante para as pessoas.
Nota do autor: Cada vez mais, nós que cuidamos de marcas precisamos calçar as sandálias da humildade. Compra-se espaço de mídia, mas não no coração das pessoas. Entender, aprender e tentar fazer parte da cultura popular é o único jeito de ser relevante, virar conversa e quem sabe um dia ser pauta na timelife das pessoas — seja lá o que isso signifique, seja lá onde isso esteja. Que venham as melhores campanhas de todos os tempos, que, provavelmente, nem campanhas serão.

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