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Opinião

A mudança climática e o seu plano de mídia

Apesar das evidências cada vez mais concretas da urgência climática e social e do hype do ESG, a pauta ainda segue sendo tratada por muitas empresas como algo marginal


28 de maio de 2024 - 7h00

O conceito de carbon footprint – pegada de carbono individual-, ou seja, a ideia de que todas as pessoas são responsáveis por uma emissão de gases de efeito estufa no seu dia a dia e, portanto, contribuem para as mudanças climáticas, surgiu a partir de uma campanha publicitária global e multimilionária de 2004 assinada pela BP – British Petroleum e criada pela Ogilvy & Mather.

Pode-se dizer que a BP e a Ogilvy inauguraram a era do greenwashing pelas marcas e, 20 anos depois, a campanha segue sendo um exemplo do que não fazer quando o assunto é marketing de causa. Falta de verdade e legitimidade ao levantar uma bandeira para uma marca é erro primário.

A campanha, ao mesmo tempo em que comunicava uma mudança do nome da marca, – a British Petroleum passaria a se chamar BP – Beyond Petroleum -, também trazia uma calculadora digital para que as pessoas pudessem descobrir a sua pegada de carbono. Todo mundo poderia saber o quanto emite de gases de efeito estufa a partir dos seus hábitos diários.

O trocadilho publicitário com o nome da empresa ficou apenas na comunicação e não materializou nenhuma mudança significativa no modelo de negócio da empresa. O objetivo era criar uma inversão de papeis, colocando as pessoas praticamente em pé de igualdade com a empresa no assunto emissão de gases de efeito estufa.

Enquanto as pessoas se preocupam com a sacolinha do supermercado, os canudos de plástico e ficam culpadas por comprar um tênis novo, esquecem que a petroleira em questão é uma das maiores poluidoras do mundo.

Apesar das evidências cada vez mais concretas da urgência climática e social e do hype do ESG, a pauta ainda segue sendo tratada por muitas empresas como algo marginal, restrita aos departamentos de sustentabilidade e a campanhas de efemérides como o Dia da da Terra.

Nos próximos 2 anos, o mundo corporativo vai passar por mudanças estruturais em relação ao tema. As novas regulações dos EUA e União Europeia sobre relatórios de ESG e impacto climático a que todas as empresas de capital aberto vão ter que se submeter, são bastante rigorosas e detalhistas.

O objetivo das novas regras é trazer mais transparência e gerar mudança de comportamento corporativo com foco na descarbonização da operação das empresas.

Por convicção ou obrigação, as novas regras vão trazer grandes mudanças na estratégia e nos modelos de negócios das empresas e vão exigir um esforço interno que vai além das áreas técnicas. Todos os executivos vão ter que ser um pouco especialistas em ESG.

Considerando que essas empresas são responsáveis pela maioria do ad spend global, os efeitos da mudança climática vão chegar no seu plano de mídia

Nesse novo cenário, vale a reflexão sobre o papel das marcas, dos marketeiros e publicitários nessa transição e o quanto esses exemplos toscos do passado nos ajudam a criar novos parâmetros para o marketing e para a comunicação.

Como os profissionais de marketing devem se preparar para essa transição e que função estratégica podem ter dentro desse novo modelo de atuação das empresas?

A boa notícia é que algumas das habilidades inerentes ao universo da comunicação vão ser fundamentais para enfrentar os desafios dessa transição: análise de comportamento, construção de boas histórias para mobilizar pessoas e capacidade de liderar processos criativos em cenários complexos.

Dessa forma, podemos pensar em algumas oportunidades:

1/ Green Skills: Habilidades corporativas para a transição para um mundo carbono neutro vão ser cada vez mais importantes na promoção e contratação de pessoas. Os profissionais de marketing e comunicação vão precisar se antecipar no letramento do assunto para liderar e participar de conversas estratégicas com profissionais técnicos.

Conhecimentos de marketing e comunicação combinados com conhecimentos técnicos de ESG tem a oportunidade de colocar esses profissionais numa posição mais estratégica e de provocar iniciativas e pautar soluções ao invés de apenas atuarem de maneira reativa a briefings específicos.

2/ Pipeline de impacto: Produtos e serviços vão precisar ser desenhados desde o início para serem sócio-ambientalmente responsáveis. Processos de inovação construídos a partir de insights do consumidor, objetivos de negócio para trazer uma proposta de valor forte vão ser decisivos para construir uma marca com autenticidade.

O posicionamento e a comunicação precisam ser cada vez mais calcados em ações concretas, refletindo o comportamento da empresa da porta pra dentro.

Para evitar o greenwashing e liderar movimentos de transformação, marketing e agências têm a oportunidade de liderar processos criativos que criem soluções e impactam o negócio da empresa para uma transição verde bem-sucedida.

3/ Sustentabilidade em rede: A crise climática é um problema sistêmico e complexo que exige um trabalho colaborativo e em rede. A única saída é unir forças com especialistas, governos, organizações do terceiro setor, consumidores, influenciadores e até mesmo concorrentes. Não vamos sair dessa enrascada com soluções simples e individuais.

O trabalho em rede exige mais esforço para garantir coerência para a marca. Marketeiros e publicitários já navegam em contextos complexos, traduzindo conhecimento em linguagem acessível e orquestrando diferentes manifestações das marcas.

O desafio nesse cenário é unir a lógica publicitária tradicional de flights de comunicação, métricas de alcance, impacto e frequência com a lógica editorial do universo do conteúdo e se pautar por muito conhecimento, pesquisa e aprofundamento para trazer mais verdade na construção das marcas.

Se tem algo de positivo na infame campanha da BP é a afirmação de que precisamos ir além. Ir além do petróleo, da inércia e da falta de senso de urgência.

Beyond Petroleum? Beware of Petroleum!

E você, já adaptou seu budget de marketing para as mudanças climáticas?

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