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Opinião

Ansiedade e reparação

Em meio à angústia de criativos e executivos pela conquista de prêmios, o Brasil surge como protagonista no movimento que empurra o Cannes Lions a avançar mais rapidamente em diversidade, inclusão e equidade


20 de junho de 2023 - 15h00

Publicitários negros cannes

Brasil empurra o Cannes Lions a avançar em diversidade, inclusão e equidade (Crédito: Divulgação)

Esta semana, de 19 a 23 de junho, é um dos momentos de maior ansiedade do ano na indústria de comunicação, marketing e mídia. A angústia aumenta entre os criativos, diretores, maestros, executivos de marketing e de negócios que dependem da reputação criativa de suas marcas, produtoras, agências, redes e holdings — impacto que atinge, em última escala, até mesmo ações de empresas de capital aberto. Antes disso, os efeitos podem mudar a carreira de muitos profissionais, desde a valorização imediata de criativos e diretores novatos até a decepção com contratações quando são feitas para o incremento em premiações e o objetivo não é consumado.

O foco da aflição é a 70ª edição do Festival Internacional de Criatividade de Cannes e seu principal centro nervoso: as salas de júris que definem os cases vencedores. O nervosismo se justifica, pois o caminho até os Leões — troféus concedidos aos ganhadores — é longo e caro. O custo inclui não somente as altas taxas cobradas para inscrições no Cannes Lions, que vão de pouco mais de 600 euros até quase 3 mil euros por peça, além de uma preparação prévia também custosa, que mobiliza agências, produtoras e anunciantes. Muitos profissionais não envolvidos nas campanhas são recrutados para a construção das apresentações das ações que serão exibidas aos jurados, especialmente para as produções de versões em inglês e dos fundamentais vídeo cases — é mais provável o sucesso de um trabalho mediano com um ótimo vídeo case do que o de uma excelente ação mal argumentada —, mas também com relações públicas, divulgação e busca de engajamento em projetos promissores, para que cheguem às salas dos júris já chancelados de algum modo pelo público.

Com a vigilância atual muito mais severa das empresas com os custos envolvidos em empreitadas como o Cannes Lions, o festival nem sonha mais com os números do passado. O total de 26.992 peças inscritas é 6% maior que o do ano passado, mas muito distante das 43.101, recorde registrado em 2016. Os números completos da participação brasileira estão na reportagem da página 41.

A ansiedade que envolve o festival não se restringe à expectativa pelos Leões, mas permeia toda a atmosfera do Cannes Lions, passando pelo fechamento de negócios, assinaturas de novos contratos e prospecção de talentos e clientes. Também há efervescência em grupos e movimentos que veem no festival um momento de atenção global para expressar suas reivindicações por mudanças na indústria. No ano passado, entre os fatos que mais repercutiram a partir de Cannes — até mesmo mais do que muitos Leões — estiveram os protestos do Greenpeace contra empresas que produzem ou usam combustíveis fósseis.

Nesse ativismo que surge da necessidade de reparação, passa pela mobilização de vozes importantes e chega aos palcos e salas de júris do festival, o Brasil é protagonista no movimento que empurra o Cannes Lions a avançar mais rapidamente em diversidade, inclusão e equidade, como mostra a reportagem de Taís Farias, nas páginas 38 e 39. A pressão de grupos organizados do mercado levou o evento a destinar 30% das cadeiras do Brasil nos júris a profissionais negros. Os oito que são jurados em 2023 formam não apenas um recorde, mas são em maior número do que os negros que representaram o País nos júris de todas as 69 edições anteriores do Cannes Lions somadas.

Mais avançada, no caso da composição do júri brasileiro, está a equidade de gênero: as 15 mulheres são maioria. Como estamos numa edição histórica, é bom lembrar que até o ano 2000, quando o Cannes Lions já somava 45 anos, somente duas mulheres brasileiras haviam integrado os júris: Christina Carvalho Pinto, em 1990; e Ana Carmen Longobardi, em 1992.

Os jurados são peça importante dessa engrenagem porque representam a linha final da pressão que envolve uma cadeia ampla de interessados nos Leões e começa muito antes, quando brotam as ideias nas cabeças dos criativos das agências, executivos das marcas ou produtores das campanhas. Suas decisões também alimentam o jogo de influenciar e ser influenciado, numa articulação constante que mantém vivo o festival, mais ou menos saudável na medida em que consegue ou não se conectar aos movimentos da indústria e da sociedade.

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