14 de abril de 2023 - 9h00
A comunidade preta movimenta no Brasil cerca de R$ 1,7 trilhão (Crédito: Shutterstock)
Senhoras e senhores, peço que afivelem os cintos, pois iremos iniciar uma jornada de questionamentos neste maravilhoso mundo da publicidade.
Em meio a uma agenda corrida entre jobs, palestras e reuniões, lá estou eu em mais uma ponte área. Para passar o tempo e refrescar a cabeça, decido entrar na livraria do aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Até aí, nada demais!
Entre livros de autoajuda e grandes best-sellers, me deparo com uma prateleira de revistas e decido levar algumas para folhear durante o meu voo até Salvador. E é aí que a minha viagem começa. Aquelas três horas dentro do avião foram muito mais longas do que eu imaginava, afinal, as revistas me transportaram para uma série de questionamentos que, hoje, vou compartilhar com você, meu caro leitor.
Entre uma matéria e outra, fico empolgado em observar um anúncio publicitário com diversos modelos pretos e aquilo me deixa com um sentimento de que “estamos chegando”. Porém, ao continuar folheando a revista, o sentimento foi perdendo o fôlego e me trouxe uma reflexão: Onde estão os meus? Será mesmo que ninguém percebeu que não tem um rosto diferente aqui nessa publicidade?
Depois de algumas horas de voo, consegui folhear alguns dos principais veículos do país e, pasmem, a falta de rostos e corpos iguais ao meu ainda é sentida, o que me faz questionar os discursos e campanhas de diversidade em nosso maravilhoso mundo da publicidade.
Qual será o motivo da quase inexistente representatividade da população preta naqueles comerciais e mensagens publicitárias? Automaticamente, enviei mensagens para alguns companheiros que também batalham por uma publicidade mais diversa e o sentimento de muitos deles é justamente parecido com o meu: ainda há muito o que fazer para transformar esse mercado!
Talvez um dos motivos da falta de representatividade esteja nas cadeiras das agências de publicidade que, em sua maioria, ainda são ocupadas por pessoas brancas. Basta dar uma conferida nos tradicionais posts das festas de final de ano, para ter a confirmação e aquela sensação de: cadê o povo preto que deveria estar aqui?
Recentemente, a pesquisa da Pnad Contínua revelou que a população autodeclarada preta cresceu 32,4% no Brasil, em dez anos. Ou seja, a população preta cresce, porém a publicidade ainda não conseguiu acompanhar esse ritmo.
Infelizmente, esse não é o único mercado que nós, a população preta, não nos sentimos representados, afinal, rostos iguais aos nossos também são minoria nas novelas, nos filmes, nos livros, na cultura e nas principais premiações no Brasil e no mundo.
Porém, somos um mercado que movimenta muito dinheiro, e dinheiro é o que o povo preto tem para gastar. Segundo a pesquisa ‘Voz e Vez – Diversidade no Mercado de Consumo e Empreendedorismo’, a comunidade preta movimenta no Brasil cerca de R$ 1,7 trilhão.
Essa informação seria suficiente para causar uma grande turbulência na cabeça dos principais diretores do Brasil, né? Dinheiro de gente que quer se enxergar de verdade nas campanhas das marcas que amamos.
Inclusive, temos diversas marcas que já estão de olho nesse dinheiro. Nos últimos anos, surgiram diversos movimentos de afirmação e empoderamento negro no mercado, além de inúmeros produtos e serviços pensados, especialmente, para a negritude, como Quintal dos Prettos, Numanice, Afropunk, Feira Preta e Batekoo, que estão sendo responsáveis por movimentar a comunidade de empreendedores e consumidores pretos.
E a sua marca está de olho nesse movimento ou está perdendo o voo na sala de embarque por uma simples desatenção? Não quero que o piloto, que me representa, desapareça no próximo voo. Afinal, ele tem dinheiro para embarcar de primeira classe, se ele quiser.
Convido você, caro leitor, para uma viagem de questionamentos. Navegue pelas revistas, TV e redes sociais e tire as suas próprias conclusões. E nem vou entrar, desta vez, na questão dos estereótipos dos modelos e artistas inseridos e retratados nas peças e campanhas publicitárias, afinal, isso fica para o nosso próximo bate-papo.