30 de outubro de 2023 - 15h38
Certa vez, em uma faculdade de comunicação social, discutia-se o que era um outdoor. O conceito dos painéis de propaganda que se espalham por estradas e avenidas se repetia nos “homens-sanduíche”, aqueles que divulgam o “Compro Ouro” ou o “Empréstimo sem Fiador” caminhando, entre dois cartazes pendurados como um avental. Os jovens estudantes, vestindo camisetas no estilo “I Love New York” ou “Rio de Janeiro”, de repente sentiram-se outdoors em movimento. Bem, é claro que o alcance daqueles outdoors era reduzido, influenciavam apenas a pequena roda de colegas da sala de aula. Mas a definição aceitava os estudantes como propagadores de uma ideia.
A digitalização da sociedade fez com que outro ramo da comunicação social ganhasse escala: o jornalismo. Mais especificamente a produção de conteúdo, sem as exigências do jornalismo “puro e duro”. Qualquer cidadão com um celular na mão é um meio. Registra fatos, desenvolve notícias em forma de vídeos, áudio, texto, e ainda publica – normalmente nas redes sociais de sua preferência. Claro que essa explosão de agentes produtores de conteúdo não substitui o jornalismo necessário, relevante, inteligente. Mas pode ocupar o espaço do entretenimento, da curiosidade, da opinião pouco qualificada. Aliás, já ocupa.
O novo comportamento da sociedade, nessa incessante produção de conteúdo em todas as frentes, provocou a morte lenta e gradual de meios de comunicação outrora relevantes, mas que não souberam entender a mudança. Vários jornais desapareceram das bancas e hoje sofrem para pagar as contas em edições digitais sem estratégia, apelando para o “click fácil” e algum dinheiro de programática. Esses têm pouco futuro. Alguns líderes conseguiram ver a oportunidade e se consolidaram. Nesse grupo estão The New York Times, The Guardian e The Wall Street Journal, por exemplo. Na América Latina os argentinos Clarín e La Nación, o colombiano El Tiempo e poucos aventureiros. Curiosa é a dificuldade que muitos têm em mudar a estratégia, aceitar que a concorrência é hoje qualquer pessoa minimamente organizada.
Empresas de outras indústrias – não jornalísticas – começam a entender essa lógica. O Banco Santander nos EUA, por exemplo, mantém a página Prosper and Thrive (Prosperar e Crescer) sempre atualizada, como uma base de apoio a novos investidores, sem ficar tentando a cada click vender seus produtos. É serviço, criação de comunidade, geração de valor em torno de uma ideia. A Unilever na Argentina tem o Cleanipedia, uma “enciclopédia” de serviços caseiros, de como tirar uma mancha até o cuidado com as plantas. São verticais de conteúdo, inteligência de produção agregada em uma página, para prestar serviço e ganhar confiança e relevância.
O cidadão é hoje um meio porque ele também pode organizar seus conteúdos em uma plataforma. E se fizer isso bem, com alguma lógica, estará criando um vertical, de nicho. Mais, se souber identificar uma audiência específica para esse conteúdo até corre o risco de ganhar dinheiro, além de se divertir.
Observando esses fatos, não é muito difícil de deduzir que:
* Os meios de comunicação que ainda querem ganhar audiência falando sobre o que todos já sabem – notícias commodity – tendem ao fracasso;
* O modelo de negócios de um meio moderno deve prever receitas da audiência. E para isso é preciso conteúdo inovador, criativo, exclusivo. Ou ninguém vai pagar;
* Se hoje está ruim para a maioria, é bem possível que piore pela dependência que se tem das BigTechs.
Enfim, cada cidadão é um meio. E só sobrevive nesse tsunami de informações quem conseguir ser relevante e criar uma audiência fiel. As regras mudaram, a estratégia também. E há quem insista nas velhas técnicas – e vê a relevância escapar entre os dedos.
É, os novos tempos são para os valentes.