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Opinião

Criatividade e espírito crítico como ferramentas à prova de futuro

O mês de maio começou com declarações controversas do fundador da Meta, Mark Zuckerberg, envolvendo o mercado publicitário e não parou por aí


26 de maio de 2025 - 6h00

Escrevo este artigo no início da terceira semana de maio e uma rápida lida em algumas notícias que até esta altura do mês tiveram grande repercussão no nosso mercado dão uma pista de que alguma coisa está fora de ordem na nossa indústria e no bom e velho ofício de ser gestor de marketing atualmente.

O mês começou com declarações controversas do fundador da Meta, Mark Zuckerberg, em uma série de podcasts, entrevistas e aparições públicas. Na visão de mundo do ex-aluno de Harvard, amizades por inteligência artificial (IA) devem superar as humanas. E, foi além. Declarou que experiências com chatbots poderão substituir terapeutas, agências de publicidade e programadores. E lançou uma proposta que, segundo ele, pode redefinir o futuro da publicidade digital: uma plataforma na qual empresas fornecem apenas seus objetivos e orçamento, e a IA da Meta cuida de todo o restante — da criação à entrega dos anúncios, passando por segmentação, testes e otimização.

Alguns dias depois, a Jaguar, uma das marcas mais icônicas da indústria automotiva, decidiu encerrar a parceria com a Accenture Song, agência que liderou a recente reformulação de marca da fabricante britânica. O rebranding, lançado no final de 2024, foi criticado por se distanciar do legado e da essência da empresa, que há mais de cem anos é sinônimo de luxo e desempenho no mercado automotivo. E quem levou a culpa por esse erro de percurso? Claro, o elo mais fraco da cadeia alimentar: a agência de publicidade, como se ela tivesse autonomia suficiente para colocar algo dessa monta no ar sem a aquiescência do cliente.

Logo em seguida, o mercado publicitário foi surpreendido com o anúncio da saída de Igor Puga da Zamp (Burger King, Popeyes, Starbucks e Subway) em um processo radical de reestruturação que incluiu não apenas a demissão do vice-presidente de marketing (cargo que Puga ocupava havia dez meses), como também de vice-presidentes de outras duas áreas desse Jardim do Éden do mundo corporativo, o chamado C-Level. De nada adiantou que nesse curto período, o executivo tenha entregado ótimos resultados e contribuído para construir uma das marcas mais reconhecidas por criatividade, consistência e posicionamento. Com a chegada do novo CEO, Pedro Zemel, há apenas dois meses, a estrutura mudou e o mandato é claro: reestruturação e corte na carne. Nada de crescimento criativo.

No início da semana passada, o jornal Valor Econômico publicou uma pesquisa que demonstrou o enfraquecimento do vínculo entre consumidores e marcas. O estudo realizado pela Troiano Branding revelou que, em 25 anos, caímos de 8% para 3% no índice de idealização, ou seja, pouquíssimos brasileiros hoje têm uma relação realmente forte com alguma marca.

Nunca antes na história do marketing contemporâneo as relações humanas e jurídicas entre anunciantes e seus prestadores de serviços de comunicação e marketing estiveram tão fragilizadas. Essa assimetria é proporcionalmente espelhada nas relações dos consumidores com as mais diversas marcas.

Isso diz muito sobre o momento líquido e volátil em que vivemos: o excesso de estímulos e a profunda transformação nas expectativas das pessoas em relação ao que elas consomem formam a moldura deste caldo cultural. Mas, o mais ilustrativo desse arco temporal é a ascensão da economia da atenção, que agora está indo para um próximo nível, o da economia da intenção. Diante da plataformização das relações e da moderação algorítmica e por meio de IA, esse esgarçamento do vínculo das pessoas com as marcas só tende a aumentar.

Sou uma otimista incontestável e acredito firmemente que o contraponto a esse cenário distópico pregado e estimulado pelas eloquentes vozes do Vale do Silício, como Zuckerberg, e ao manual da eficiência a qualquer custo, colocado em prática por executivos ultra respeitados no mundo empresarial por fazer turnarounds em empresas com dificuldades mercadológicas, é justamente se levar em conta dois fatores que somente o humano pode entregar: criatividade e espírito crítico.

Relevância e diferenciação se constroem por meio de consistência e criação de conexões verdadeiras. Claro que as agências estão sofrendo por falta de diferenciação e pagam (com poucas exceções) um preço alto por não conseguirem ser mais estratégicas e menos táticas. Mas, do lado dos anunciantes, tirar o marketing do board pode resolver problemas de curto prazo, mas poderá se mostrar uma decisão que custará muitos pontos de market share num futuro próximo. E tampouco não assumir responsabilidade por decisões ruins não mudará processos culturais que já nascem contaminados.

Não é por acaso que as duas declarações de Mark Zuckerbeg que tomaram as manchetes dos sites de notícias no começo do mês tenham a ver, respectivamente, com relações humanas e comunicação. Vivemos uma era de transformações rápidas e em escala sem precedentes na história moderna. Essas mudanças passam por revisão de proposta de valor e novas ofertas de soluções a problemas também novos. E, por mais paradoxal que pareça, quanto mais humanos e criativos formos, mais sucesso podemos ter nessa jornada que ainda está no seu início.

Afinal, citando meu querido amigo Domenico Massareto:

“Pessoas são consistentemente imprevisíveis. Máquinas são inconsistentemente previsíveis”.

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