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Opinião

Cultura do efêmero

Agilidade e eficiência na logística de entregas do varejo online e dos negócios direct-to-consumer ganham protagonismo na pandemia e aquecem mercado de startups focadas em quick commerce


11 de abril de 2022 - 9h32

Crédito: Shutterstock

As discussões mais ruidosas das sessões de julgamento do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), no ano passado, foram travadas entre os maiores e-commerces do País. Americanas, Magazine Luiza e Mercado Livre disputaram o direito de explorar em suas mensagens publicitárias a afirmação de que têm a entrega mais rápida. O atrito acabou colocando as três marcas entre as mais punidas nas decisões tomadas pelo órgão em 2021, como mostrou ranking elaborado por Meio & Mensagem e publicado em janeiro.

Em linhas gerais, os conselheiros do Conar entenderam que a publicidade das marcas carecia de comprovação confiável e até tentaram acordos em reuniões entre as partes realizadas antes dos julgamentos, mas não houve consenso. As empresas apresentaram estudos para dizer ora que tinham prazo médio de entrega menor, ora para sustentar que eram mais rápidas em determinados locais. O Conselho decidiu que as afirmações eram usadas de forma muito genérica e recomendou que as mensagens fossem ajustadas.

Esses casos ilustram a importância da rapidez na logística de entregas para quem vende online e a prioridade alcançada pelo tema nas agendas do varejo e dos crescentes negócios direct-to-consumer. Se atrasos e prazos longos sempre foram pecados capitais para a fidelização de clientes, a pandemia disseminou a necessidade de consumir sem deslocamento e agravou o sentimento de urgência. Assim, alimentou ainda mais a cultura do efêmero, que já nos cercava antes em diversos outros hábitos, como os decorrentes do uso das redes sociais, com seus vídeos rápidos e postagens curtas.

Na seara do consumo, o desejo de reproduzir no digital a experiência instantânea do físico injeta dinheiro no quick commerce, tido como a nova fronteira do comércio eletrônico. Nas páginas 18 a 20, a reportagem da jornalista Taís Farias analisa as transformações causadas no mercado pelo fato de a rapidez ter virado protagonista nas jornadas de e-commerce. Uma pesquisa online da consultoria Capterra, que entrevistou 1.060 pessoas em novembro, dá um retrato deste momento: quase metade (49%) afirma que rapidez é o item mais importante na entrega dos pedidos, à frente, inclusive, do preço (33%).

Nos últimos anos, a prioridade à velocidade da entrega na chamada última milha dos produtos até as mãos dos consumidores foi um dos caminhos que ajudou a aproximar o varejo das startups, já que não dá para acelerar nessa pista sem tecnologia e inovação. Em 2020, a Rappi adquiriu a Avocado, que entregava em até 30 minutos produtos para mães e bebês, para estruturar sua vertical de q-commerce. Na semana passada, enquanto a reportagem estava sendo fechada, a Renner entrou no q-commerce com a aquisição da Uello Tecnologia, uma logtech especializada em entregas urbanas expressas, fundada em 2017, em São Paulo.

A logística em um País continental como o Brasil sempre foi um desafio para os serviços de entrega. Essa é uma discussão complexa que passa, inclusive, pela questão do monopólio estatal na distribuição de correspondência, pelo plano de privatização dos Correios e chega até o debate sobre a precarização do trabalho em serviços de entrega rápida.

Ao atacar esses gargalos, o setor poderá melhorar seus índices de confiança, algo fundamental para garantir fidelização, e prosseguir na jornada de corresponder à expectativa fugaz de um consumidor que quer tudo ao mesmo tempo agora. E, assim, não virar piada, como aconteceu na semana passada, quando viralizou a notícia de uma compra feita por uma jovem na região metropolitana de Fortaleza, que recebeu no dia 5 de abril o lanche pedido em aplicativo no dia 28 de março, oito dias depois — um prazo bastante indigesto.

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