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Opinião

Desafios e oportunidades

Manter a relevância e a sustentabilidade como negócio será privilégio de empresas que revisitarem o seu propósito e redefinirem suas propostas de valor


21 de outubro de 2019 - 10h07

(Crédito: Ishan Seefromthesky/ Unsplash)

Cultuado como um oráculo bem-sucedido quanto às predições relativas aos avanços da tecnologia, os Jetsons apostaram nos carros voadores como o futuro da mobilidade. Os deslocamentos dos protagonistas do desenho animado dos anos 1960 a bordo do automóvel da família influenciaram por décadas o imaginário humano para o setor de transportes, alimentando o sonho de gerações que espontaneamente associavam os veículos de quatro rodas a valores como conforto, conveniência, independência e status social.

Empresas com diferentes modelos de negócio envolvendo a fabricação, o comércio ou o uso de carros — como Uber, Tesla e Toyota — já revelaram seus projetos, testes e até patentes de veículos que se locomovem pelo ar. Recentemente, foi a vez de a Porsche anunciar um acordo com a Boeing para o desenvolvimento de um carro voador, com capacidade de decolagem e pouso vertical, próprio para pessoas se locomoverem em grandes centros urbanos densamente habitados. Obviamente, os grandes desafios estão na produção em escala e, principalmente, decidir as regras do jogo quanto à estrutura e leis para organizar de fato como seriam essas faixas de trânsito aéreas, além de questões relacionadas à privacidade, que permeiam praticamente qualquer atividade na qual há a possibilidade de coleta e uso de dados.

Embora sejam uma realidade para o setor, ao menos em termos de investimento, pesquisa e desenvolvimento, carros voadores já não são a aposta óbvia para o futuro próximo da mobilidade e, consequentemente, para a indústria automobilística — foco da reportagem desta semana da série especial Next Now. Podem até vir a fazer parte de um ecossistema de transportes, mas certamente não terão o papel central que o automóvel ocupou por décadas. Cinquenta anos atrás, quando os Jetsons foram criados, a superpopulação não era uma questão tão latente quanto agora. Conforme a realidade foi sendo modificada por tecnologia e costumes, e novas variáveis passaram a influenciar a equação para se projetar os dias que virão, o prognóstico também se alterou.

De acordo com o estudo TGI, da Kantar Ibope Media, entre 2003 e 2019, caiu de 24% para 7% o índice de brasileiros dispostos a comprar um carro novo — uma redução tão drástica que não pode ser explicada apenas pela confiança em baixa do consumidor, após anos de economia em recessão ou praticamente estagnada.

O futuro é dinâmico — e, no caso da mobilidade urbana, passou a incorporar diversas linhas de pensamento, voltadas para o bem-estar coletivo, assim como outros meios de transporte (bicicletas, patinetes, carros autônomos, elétricos ou híbridos, o hyperloop de Elon Musk, caronas viabilizadas por aplicativos e toda a sorte de locomoção compartilhada) e a demanda urgente por serviços públicos melhores e mais abrangentes.

Se alguns players tradicionais de outros setores perdem o sono ao lidar com um agente disruptor de seu mercado, imaginem as grandes montadoras e seus pesadelos com novas possibilidades surgindo em diversas frentes e concorrentes até pouco tempo inusitados se credenciando a ficar com uma fatia do bolo do dispêndio das pessoas para a necessidade de ir de um ponto a outro, em diferentes etapas de sua jornada diária da porta para fora.

Nesse cenário, manter a relevância, a influência e, consequentemente, a sustentabilidade como negócio será um privilégio de empresas que revisitarem o seu propósito e redefinirem suas propostas de valor, alinhando-se aos parceiros certos para não ficarem limitadas ao campo de atuação original.

Será um baita desafio para todos. E uma oportunidade ainda maior para alguns.

*Crédito da foto no topo: Ryan Searle/ Unsplash

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