Dilemas do rebranding
O delicado limiar entre modernizar a marca e preservar identidades reconhecidas pelo público, abraçar a evolução tecnológica sem deletar memórias afetivas que alimentam a confiança dos fãs
O delicado limiar entre modernizar a marca e preservar identidades reconhecidas pelo público, abraçar a evolução tecnológica sem deletar memórias afetivas que alimentam a confiança dos fãs
26 de novembro de 2024 - 14h00
Entre os momentos mais tensos da vida de uma marca estão os de rebranding. A apreensão costuma rondar as equipes envolvidas por um bom tempo, já que, normalmente, esses são processos muito calculados e demorados. Desde o consenso sobre as motivações da mudança — espectro amplo, que vai das crises de imagem à natural necessidade de modernização — até a aprovação das execuções finais do redesenho e das ações que irão comunicá-lo, toda a jornada envolve questões complexas. Não é fácil decidir por alterações que impactam hábitos dos consumidores, conexões intuitivas com a marca e, especialmente, memória afetiva que alimenta a confiança dos fãs. Invariavelmente, a empresa acaba colhendo aplausos e vaias, e precisa reconquistar a parte de seu público fiel que demonstra descontentamento.
Dois exemplos do ano passado, um global e outro nacional, mostram o quão delicado é o limiar entre expressar a evolução da marca e preservar identidades e legados reconhecidos pelo público. A mudança de Twitter para X é um dos casos mais discutidos e controversos dos últimos tempos. Há especialistas que consideram, inclusive, que não se tratou de um rebranding, mas sim de um restart. Isso pelo fato de a mudança ter sido menos motivada por um problema da marca — o que se comprova pelo fato de muitas pessoas, mesmo mais de um ano depois, ainda se referirem à rede social pelo nome antigo —, e mais pelo desejo de marcar posição do seu dono, Elon Musk.
Em 2023, também houve o rebranding do Itaú, uma das mais importantes marcas brasileiras, que, com o movimento e todas as ações a ele conectadas, conseguiu preservar a familiaridade de sua relação com o público e expressar sua evolução para continuar liderando um mercado tão dinâmico como o financeiro, no qual se cruzam as dependências da tecnologia e da confiança dos usuários — o que se acumulou no passado com vistas ao futuro.
A abordagem futurista é, de certa forma, o que move a Jaguar, cujo rebranding é um dos assuntos mais comentados do momento pela indústria criativa. Na semana passada, a marca, que já foi ícone da elegância britânica, apresentou ao mundo seus novos posicionamento e logotipo, que usa uma fonte personalizada que mistura letras maiúsculas e minúsculas. A mudança seria motivada pela estratégia da montadora de investir em uma frota totalmente elétrica, com modelos de luxo. Na apresentação do rebranding e de sua “nova linguagem visual dramática”, a marca anuncia para si uma “nova era”, definida por uma “filosofia criativa” que chama de “modernismo exuberante”, usando termos como “originalidade verdadeira”, “designs ousados”, “pensamento inesperado e original” e “criatividade destemida”.
Como acontece com diversos assuntos, a novidade da Jaguar instaurou polarização de opiniões de especialistas e palpiteiros de plantão nas redes sociais. O slogan “Copy Nothing” foi contestado pelos comentários ao vídeo que o apresenta, com um casting diverso usando roupas coloridas — o que, para alguns, lembrou a estética da Benetton nos anos 1990. Uma cena que busca ser impactante, ao mostrar uma mulher com uma marreta para ressaltar o texto “quebre moldes”, foi apontada como referência ao clássico “1984”, da Apple. O fato de o filme não mostrar nenhum carro também foi muito comentado, inclusive por Elon Musk — sim, ele mesmo, o do X e da Tesla. “Vocês vendem carros?”, perguntou à Jaguar na sua rede social. A marca respondeu: “Sim. Adoraríamos mostrar a você. Junte-se a nós para uma xícara de chá em Miami, no dia 2 de dezembro. Atenciosamente, Jaguar”. A data é uma referência à Miami Art Week, evento no qual irá estrear oficialmente seu novo conceito de design.
Entre os que aplaudiram a mudança, há comentários sobre seu caráter inspirador e ao fato de a Jaguar ter conseguido ser o centro das atenções da comunidade criativa, nem que seja por alguns dias, algo que a marca não alcançava há muito tempo. Aliás, esse aspecto midiático é um dos mais considerados na preparação de rebrandings, ao lado de outras questões que, por mais abstratas que sejam, precisam contribuir para objetivos palpáveis, como uma maior consideração das marcas e impacto positivo nas vendas. Com menos de uma semana de vida pública, ainda é muito cedo para saber se a aposta da Jaguar será vencedora.
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