Era de ouro para quem?
Enquanto os Estados Unidos querem mais desenvolvimento e mais poder, alguém sofrerá com as consequências
Enquanto os Estados Unidos querem mais desenvolvimento e mais poder, alguém sofrerá com as consequências
Eram 2h da manhã e eu ainda estava comemorando o resultado do Effie, uma das maiores premiações do mercado de comunicação. Menos de 3h depois, no entanto, uma derrota imensurável aconteceria: a reeleição de Donald Trump, nos Estados Unidos.
O sol ainda nem tinha nascido no Brasil e Trump já subia em seu palanque para agradecer o apoio recebido. Disse se sentir honrado e prometeu nada menos do que uma era de ouro para os Estados Unidos. Mas vejam bem, eras de ouro normalmente têm dois lados: enquanto uma parcela é impulsionada, outra é lançada com força ao retrocesso.
Lembremos, como exemplo, do “Ciclo do Ouro” ou “Era do Ouro” que vivemos no Brasil, principalmente entre o final do século 17 e o início do século 18. Nessa época, uma enorme atividade mineradora se concentrou nas regiões de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. Para alguns, esse ciclo transformou a economia colonial, impulsionando a urbanização e a imigração. Para outros – e essa é uma parte fundamental da história – a mineração foi um absurdo não corrigido até hoje.
Isso porque ela escondeu, no caso do Brasil, uma dependência enorme do trabalho escravo, principalmente de povos africanos. Muitos morreram durante o processo. Também gerou uma profunda destruição ambiental, já que o processo levava à erosão, desmatamento, assoreamento e poluição de fontes de água. Isso sem falar na enorme concentração de poder nas mãos da elite local, que gerou, inclusive, a não tão famosa Guerra dos Emboabas, na qual paulistas e portugueses lutaram pelo controle das minas.
Mas, eu sei, Trump não falou de uma “era de ouro” literal. Não estamos falando exatamente de extração aqui, mas sim de uma época de prosperidade econômica, segurança e crescimento para o país, na visão dele. A fala de seu discurso de agradecimento carrega a ideia de um período idealizado, marcado por altos níveis de desenvolvimento, estabilidade e um fortalecimento da posição internacional dos Estados Unidos.
Mas reparem como, ainda que não seja literal o termo, a lógica é a mesma. Enquanto os Estados Unidos querem mais desenvolvimento e mais poder, alguém sofrerá com as consequências. E não é nem difícil entender quem, já que esse outro lado sempre esteve presente na campanha presidencial e na própria história de vida polêmica do candidato. Mas, para citar alguns riscos: normalização da discriminação contra pessoas negras e imigrantes, revogação de direitos da população trans, normalização de comportamentos misóginos, aumento da violência armada em escolas e aprofundamento de crises ambientais. E você pode até pensar que isso nada tem a ver contigo. Mas a verdade é que somos um país do Sul Global e, para alguém se destacar ao Norte – ainda mais o país mais poderoso do mundo -, alguém sofrerá as consequências ao Sul.
Um exemplo prático é que Elon Musk, um dos principais aliados de Donald Trump, tem reclamado do preço “insano” do lítio, matéria-prima necessária para fabricação de seus produtos. O plano? Extrair mais e mais da natureza. E adivinhem, amigos, qual país tem uma fonte de lítio pertinho dos EUA? Nós, Brasil. Possuímos reservas significativas, principalmente em Minas Gerais. De novo, Minas Gerais. Olhem a história se repetindo séculos depois.
Mas você deve estar se perguntando o porquê de eu falar sobre isso aqui, em um veículo de comunicação, não de política. E qual o sentido em nós olharmos para isso com atenção agora, nos próximos quatro anos e em toda a história futura. Mas vou deixar vocês por aqui, porque é ideal que cheguemos a essa resposta juntos, coletivamente e, principalmente, que ela não seja única. Qual o papel que nós podemos ter como indivíduos nesse cenário?
Força, energia e clareza a todos nós.
Porque, como bem disse o Clima Info: as necessidades sociais e ambientais não esperam.
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