Assinar

Faça você mesmo

Buscar
Publicidade
Opinião

Faça você mesmo

Princípios éticos corporativos e individuais não devem ser regidos por decisões políticas como a de Donald Trump, ao abandonar o Acordo de Paris


5 de junho de 2017 - 12h47

Já houve épocas em que nossos ancestrais parecem ter convivido em maior harmonia com o ecossistema do planeta que habitamos. Estudos apontam a revolução agrícola, deflagrada 12 mil anos atrás, como um marco transformador nessa relação: foi quando os seres humanos começaram a modificar efetivamente grandes áreas da Terra em prol de uma vida supostamente mais segura e preditiva para suas famílias e comunidades, com maior estabilidade no acesso a alimentos e menor exposição aos riscos intrínsecos a deslocamentos constantes e longínquos.

Foto: Reprodução

As consequências colaterais desse trade off em nosso meio ambiente não foram percebidas pela sociedade como um problema por milhares de anos. A mudança climática entrou definitivamente no calendário global de grandes questões a serem debatidas e resolvidas há exatos 25 anos. Em 3 de junho de 1992, tinha início a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento.

A Rio-92, como ficou conhecida, parecia o pontapé de uma nova era. Falar de sustentabilidade virou obrigação para toda grande empresa e virou mote de comunicação, independentemente do setor de atuação.

O fracasso da convenção que regulamentou o Protocolo de Kyoto (que, proposto em 1997, nunca foi reconhecido pelos EUA) em estabelecer metas efetivas facilitou a ação de oportunistas, que transformaram um oceano azul em vermelho ao surfar ondas artificiais de greenwashing — mantendo práticas predatórias da porta para dentro enquanto, em público, tentavam construir uma imagem falsa de salvadores do planeta. Foi tanto “faça o que eu digo, não faça o que eu faço” que a ressaca veio na forma de desconfiança generalizada.

Com a dificuldade em distinguir o que era real em meio a tantas marolas, muita gente reagiu com ceticismo e o discurso da negação quanto à mudança climática voltou a ganhar força com a crise financeira que eclodiu em 2008, quando os governantes das maiores economias do mundo decretaram ter problemas mais sérios a resolver naquele momento.

Embora nunca tenha saído da pauta, o assunto deixou de ocupar as manchetes, salvo em ocasiões pontuais, como a revelação de novos estudos com cenários catastróficos para o futuro do planeta ou na assinatura do Acordo de Paris, em dezembro de 2015 — que, com a participação de 195 países, fixou uma meta de contenção do aquecimento global. A atitude radical de Trump, que na quinta-feira, 1o de junho, optou por retirar o compromisso americano e deixar de cumprir o acordo, ao menos serviu para recolocar o tema em um nível mais intenso do debate.

Após ser oficializada, a decisão provocou uma reação em cadeia dos mais cultuados líderes corporativos contemporâneos nos Estados Unidos. Elon Musk, fundador da Tesla, e Robert Iger, CEO da Disney, imediatamente anunciaram que estavam deixando o grupo de conselheiros empresariais da Casa Branca. Mark Zuckerberg, do Facebook, Jack Dorsey, do Twitter, e Sundar Pichai, do Google usaram as redes sociais para protestar. Microsoft, Uber, IBM, Amazon, Shell, entre outras, também se manifestaram contra a opção de Trump — que, dois dias antes, na terça-feira, 30 de maio, recebeu um telefonema do CEO da Apple, Tim Cook, tentando demovê-lo da ideia de deixar a mesa de negociações. “Não foi o bastante”, resignou-se Cook, em carta enviada aos funcionários, segundo relatou o The New York Times.

Outra vez, as empresas terão a chance de mostrar na prática que a indignação demonstrada não ficará apenas no discurso. “Agora, a indústria deve assumir a liderança desse processo e não depender do governo”, afirmou Jeff Immelt, da General Electric, elucidando o dever de empresários, executivos e qualquer pessoa, enfim. Não é preciso esperar uma legislação para agir de maneira alinhada com suas próprias crenças, tampouco princípios éticos corporativos e individuais devem ser regidos por decisões políticas.

Conceitualmente, não é nada muito diferente do que norteia as decisões que tomamos todos os dias, dos pequenos aos grandes atos.

Publicidade

Compartilhe

Veja também

  • Além do like

    O papel estratégico da área jurídica na relação entre marcas e influenciadores

  • A consciência é sua

    A consciência é sua

    Como anda o pacto que as maiores agências do País firmaram para aumentar a contratação de profissionais negros e criar ambientes corporativos mais inclusivos?