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Felipe Neto, 1984 e o futuro do marketing de influência

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Opinião

Felipe Neto, 1984 e o futuro do marketing de influência

Ação do influenciador com a Audible, da Amazon, mostra que vivemos a economia da atenção, mas principalmente a da intenção


14 de abril de 2025 - 6h00

No final de 2023, o tradicional snack Bis, da Mondelez, se envolveu em um grande cancelamento. Em uma ação com Felipe Neto para promover a participação da marca na CCXP, o chocolate sofreu boicotes organizados nas redes sociais por usuários alinhados ao bolsonarismo, alegando que não consumiriam mais o produto por discordarem das opiniões do influenciador. A reação fez a hashtag #BisNuncaMais se tornar um dos tópicos mais comentados no X (ex-Twitter) por alguns dias.

A crise levou a Mondelez a alterar suas políticas para contratação de influenciadores, passando a exigir análise de reputação prévia, exclusão de personalidades com históricos de polêmicas ideológicas ou envolvimento em casos de preconceito. A mitigação de risco reputacional e a antecipacão de possíveis reações de nichos específicos com o uso de determinado influenciador ou influenciadora ganhou centralidade com esse episódio.

Dezoito meses depois, no início de abril, Felipe Neto voltou a se tornar um dos assuntos mais buscados no Google Trends e nas redes sociais após anunciar uma suposta pré-candidatura à Presidência da República em 2026. A declaração, no entanto, fazia parte de uma estratégia de marketing para a Audible. No vídeo, com mais de oito milhões de visualizações só no Instagram em menos de 24 horas, o empresário e influenciador, que tem 47,2 milhões de inscritos no YouTube, afirmou que queria ser presidente mesmo sem experiência política, destacando o poder das redes sociais.

“Eu anuncio minha pré-candidatura à Presidência da República. E este não é um gesto de vaidade, porque eu construí um legado financeiro e na comunicação que já me alimenta o estômago e o ego para o resto da vida”, disse. Ele também mencionou a criação de uma nova rede social, chamada “Nova Fala”, que permitiria um “governo neutro, sem qualquer ideologia” — uma clara referência ao livro 1984, de George Orwell.

O termo remete à “novolíngua” – ou “novafala”, em algumas traduções –, idioma fictício criado pelo regime autoritário retratado no livro. O influenciador também mencionou que a plataforma funcionaria como um ministério, “talvez o da Verdade”. Em 1984, o Ministério da Verdade é responsável por manipular informações e definir a versão oficial dos fatos conforme os interesses do governo.

Em novo vídeo postado no dia seguinte a esse em que anunciava sua suposta candidatura à presidência, Felipe Neto disse esperar “do fundo do coração” que as pessoas “não tenham acreditado” que ele seria candidato a presidente. “O que eu queria era chamar a sua atenção”, prosseguiu. “Tudo o que falei naquele vídeo é o oposto do que eu acredito.”

O anúncio inicial já havia despertado a desconfiança de internautas nas redes sociais, que suspeitavam de uma estratégia de marketing do influenciador – o que foi confirmado com o novo vídeo. Dentre aqueles que se opõem a ele, no entanto, os chamados haters, o vídeo ganhou forte tração e uma série de críticas, pois muitos chegaram a acreditar que a suposta pré-candidatura à presidência era real. Na nova publicação, ele incentivou a leitura como combate ao autoritarismo e divulgou um audiolivro.

Importante registrar que entre os youtubers, Felipe Neto foi um dos principais críticos da ex-presidente Dilma Rousseff e, posteriormente, do ex-presidente Jair Bolsonaro. Em 2022, porém, ele se tornou um dos principais aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha petista nas redes sociais.

Há cerca de dois meses, Felipe Neto anunciou que não trataria mais de política nas redes sociais dele. Ele chegou a dizer que não tinha “nenhuma intenção de ser político” e que havia sido direcionado para uma “estrada onde nunca quis entrar”.

Com tamanho histórico e politicamente exposto, Neto corria o risco de ser cancelado pelas marcas para ações de marketing. Mas, caiu como uma luva para o objetivo da Audible, serviço de streaming de audiolivros, podcasts e outros conteúdos de áudio da Amazon. A empresa destacou, por meio de nota à imprensa, que a participação de Felipe Neto na campanha se deve à sua “habilidade de criar um diálogo cultural importante e encorajar o debate sobre os temas ao redor de 1984.” O objetivo, segundo a empresa, é “inspirar os ouvintes a experimentarem esse clássico da literatura de uma nova forma, mais imersiva, que o formato do áudio oferece, nas vozes de um grande elenco brasileiro”.

Vale destacar que o influenciador mantém o Clube do Livro FN, plataforma de debates literários. Atualmente, o grupo lê Puro (2023), de Nara Vidal, romance ambientado nos anos 1930, em Minas Gerais, que trata de autoritarismo, racismo e eugenia.

Ao comentar sobre o caso no LinkedIn, a CEO do YouPix Rafaela Lotto, destacou que Felipe Neto “se mantém relevante há muitos anos porque domina, como poucos, a lógica das redes e a dinâmica social que elas movimentam. (…) Felipe contou exatamente com as pessoas que não conhecem nem ele, nem o livro. Exatamente: os haters. Que ajudaram a compartilhar o vídeo com fúria, zero filtro e uma boa dose de ignorância.”

Durante o SXSW 2025, a questão da transição da economia da atenção para a economia da intenção foi levantada por uma série de palestrantes: nossa atenção é um bem escasso e precisa ser gerida com intenção.

Nesse contexto, cresce a necessidade de as marcas criarem conexões reais, as redes sociais repensarem seu impacto, o digital resgatar ser um espaço de pertencimento (ou não) e os creators terem uma estratégia bem definida para produzir conteúdo alinhado às necessidades e interesses de seu público. A acão da Audible com Felipe Neto ilustra como poucas esse novo momento do marketing de influência.

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