Assinar

Games olímpicos

Buscar
Publicidade
Opinião

Games olímpicos

A decisão do Comitê Olímpico Internacional (COI) de criar uma versão da Olimpíada para os e-sports gera controvérsia, mas não foi impensada


12 de agosto de 2024 - 14h00

O Comitê Olímpico Internacional (COI) anunciou há algumas semanas a criação dos Jogos Olímpicos de e-sports. Assim como os Jogos Olímpicos, o evento acontecerá a cada quatro anos. As três primeiras edições – começando em 2025 – serão na Arábia Saudita.

A escolha da sede não é casual.

A Arábia Saudita é o país que mais investe em e-sports no mundo e o único que tem uma “Estratégia Nacional de Jogos e Esportes Eletrônicos”. Através do fundo de investimentos públicos (PIF, na sigla inglesa), o país investiu na aquisição de muitos desenvolvedores de jogos, agências e outras empresas nesse setor. Na Reliance Industries da Índia foram mais de R$ 6 bilhões. Na chinesa VSPO, outro R$ 1,5 bilhão. Eles também são acionistas majoritários na EA Sports (um valor de mais de R$ 115 bilhões), investidores na Tencent, Nintendo, Activision Blizzard, e Take-Two Interactive.

O PIF, que está por toda parte no mundo dos games e e-sports, tem o objetivo de estabelecer 250 empresas de e-sports na Arábia Saudita, criar 39 mil empregos e aumentar a contribuição do setor para o seu PIB em R$ 76 bilhões até 2030.

O momento do anúncio também é proposital.

Nos meses de julho e agosto deste ano, acontece em Riad a primeira Copa do Mundo de e-sports. A competição, também financiada pelo governo Saudita, já é o maior evento mundial de e-sports, com um total de prêmios de R$ 360 milhões distribuídos para os ganhadores dos 22 jogos que fazem parte do evento.

Todos os que estão envolvidos com e-sports – jogadores, investidores, patrocinadores etc. – comemoraram a inclusão no mundo olímpico. Apesar de não faltarem investimentos, visibilidade, torcedores, e interesse pelos jogos eletrônicos de uma forma geral, é indiscutível o valor do aval olímpico.

Mas essa decisão não foi fácil para o COI, porque há muita gente influente que acha que os esportes tradicionais e os e-sports jamais deveriam ser comparados ou estarem associados.

Para entender quem é contra, é preciso entender o mundo olímpico e seus administradores. As Federações Internacionais (como a World Athletics, que coordena o atletismo mundial), os Comitês Olímpicos Nacionais (como o COB no Brasil), e as Federações Nacionais (como a Saltos Brasil, que coordena nossos saltos ornamentais) são povoadas por profissionais dedicados ao esporte, muitos ex-atletas. São administradores, treinadores, preparadores físicos, psicólogos, nutricionistas etc. que dedicam suas vidas à preparação física e mental de atletas de alto rendimento e ao desenvolvimento do esporte de base.

Para eles, tratar Lee “Faker” Sang-hyeok (amplamente considerado o melhor jogador da história do League of Legends) com a mesma distinção que se trata Michael Phelps, Simone Biles, Usain Bolt e Jesse Owens é uma grande heresia. Acreditam que usar o termo olímpico no contexto de e-sports diminuirá o valor das olimpíadas e fará o maior evento esportivo do mundo perder parte de sua magia.

Mas o COI não tomou essa decisão sem um propósito ou de forma impensada.

Na última década, a Arábia Saudita tornou-se um país-chave no esporte mundial. Os recursos do PIF financiaram as compras de equipes de futebol na Europa (como o Newcastle United), a contratação de dezenas de jogadores (como Cristiano Ronaldo) para a sua liga local, a criação da LIV Golf e posterior fusão com o circuito global (o PGA Tour), a atração de inúmeros eventos do UFC e automobilismo para a Arábia Saudita, e até mesmo o direito de sediar a Copa do Mundo da FIFA de 2034 (a Arábia Saudita é a única candidata).

Mas pouquíssimos recursos foram investidos nos esportes Olímpicos ou no COI, que até hoje não tem nenhum patrocinador TOP saudita.

Essa aproximação do COI com o governo saudita e com o PIF, começa com os e-sports em 2025, mas tem tudo para se expandir nas próximas décadas nas áreas de patrocínios e até mesmo sediando eventos. Se a Arábia Saudita pode patrocinar a Fifa (a Aramco é uma das patrocinadoras globais) e até mesmo sediar a Copa do Mundo, por que não ser o primeiro país do Oriente Médio a sediar os Jogos Olímpicos de Verão em 2036 (as próximas edições em 2028 e 2032 já estão confirmadas para Los Angeles e Brisbane, respectivamente)?

Não faltam recursos, ambição, e bom planejamento.

Publicidade

Compartilhe

Veja também