22 de outubro de 2024 - 8h00
Passei 28 anos dentro de agências de publicidade. A W/Brasil foi a primeira grande agência nacional onde trabalhei. E a primeira, a gente nunca esquece.
A W não foi o único lugar onde trabalhei e amei, de onde “peguei as tintas”. Mas, sem dúvida, ao longo da minha jornada, muito do que fiz tinha um “caldo de W/Brasil”. Na semana passada, participei de um painel no Festival do Clube de Criação, cujo tema era identidade cultural das agências. E é justamente sob esta lente que quero falar sobre Washington Olivetto.
Na minha opinião, a escola W/ tem elementos que interessam não somente ao mundo das agências, mas a empresas de qualquer segmento. O que constrói identidade cultural? Valores claros, coerência, consistência. Essa é a primeira parte.
A segunda é que o próprio dono seja “súdito” da marca e tenha a capacidade de engajar as pessoas, olhando para uma mesma direção. A capacidade de criar um lugar onde as pessoas se reconhecem como parte daquilo, onde umas estimulam as outras.
A W não era uma agência qualquer. Washington foi o primeiro dono de agência a mandar derrubar as paredes internas. Trazia para a agência trabalhos de branded content quando esse termo nem existia. Fazia questão de fazer festas incríveis para os clientes e para si. Quem mais fez festa em porta-avião? Festas da firma cujas atrações eram Gilberto Gil, Titãs, Lulu Santos, Kid Abelha e outros. Não era apenas porque eram os top notch artists, mas porque todos eram amigos do Washington. Pela W/, passavam também jobs de lançamentos de longas-metragens e discos. As músicas eram protagonistas tanto quanto atores e atrizes nos comerciais, a ponto de termos um CD chamado W/Hits. Fora camisetas, biquínis, sacolas e broches. Por falar em música, que outra agência tem uma com seu nome, tocada nas rádios e nas festas de todo o Brasil? E ao lado de toda essa produção multiforme de coisas, ingredientes para exacerbar os sentidos e a criatividade, saíam as campanhas publicitárias extraordinárias e superpremiadas.
A cultura de uma empresa também está em seus costumes, suas atitudes. Com o Washington era assim: lutar pelas boas ideias até o fim; criatividade e qualidade de execução eram mandatórias; entender que criatividade traz vendas; não fazer reunião para reunir, só para decidir; atenção aos detalhes; não criar para ganhar prêmios, mas para conquistar o consumidor brasileiro, o prêmio viria como consequência; se inspirar nas artes: plásticas, cênicas, musicais; precisa nadar no meio da tarde? Vá. Quem sabe você não se inspira? Só não deixe o cliente na mão.
Tínhamos um ambiente de confiança, onde estava muito claro tudo que era aceitável ou não nos seus padrões, onde um ajudava o outro, mesmo que a conta não fosse sua, onde um telefone tocando não ficava sem atendimento. Essa foi a W/ da época que eu vivi. As piadas internas da W/ permanecem vivas entre nós, W/Pessoas, mesmo tantos anos depois. Princípio básico de branding: o jeito de ser se refletir no modo de agir. Cansei de ver empresas que apresentavam seus valores num slide no PowerPoint, mas cujo dia a dia não refletia nada daquilo que estava escrito. Washington e suas tintas carregavam uma identidade cultural tão clara a ponto de que poderíamos até identificar que se tratava de um trabalho seu e da sua equipe.
É bem verdade que na época que eu trabalhei na W não havia a fragmentação das mídias, nem a brutal quantidade de conteúdo que há hoje, coisas que tornam mais difícil você construir sucessos de massa, como tínhamos antes. Mas, as criações de Washington Olivetto ecoam até hoje, porque uma boa história fala com a alma, independentemente da época. Credito parte dessa identidade cultural ao fato de que o Washington sempre fez do nosso trabalho uma entrega para o Brasil. Todo aquele sucesso, nos anos 1990, num país fora do Hemisfério Norte, com verbas muito menores que as de lá, mas com uma capacidade criativa incrível. Ele tinha orgulho de ser uma empresa brasileira. Por isso, sempre foi e é tão respeitado por nós e pelo mercado mundial.