23 de setembro de 2024 - 6h00
Às vezes, meu cérebro cria pontes entre histórias que me levam a perguntar para o ChatGPT (que eu carinhosamente chamo de Chatinho) coisas como: Leonardo Da Vinci era inseguro em relação às suas criações? Como ele lidava com esses sentimentos?
A resposta eu já conto, mas cheguei nessa pergunta vindo de uma sequência onde comecei lendo críticas ao comportamento da Chappell Roan dada sua mais do que rápida ascensão — “ela nem é tão boa assim e já está se achando”, passando por comentários em posts sobre o trabalho de diferentes pessoas e até um podcast com alguma celebridade dividindo os desafios de ser uma pessoa pública e ter o trabalho constantemente julgado pelas pessoas.
Que existem críticas, em sua maioria não construtivas, para tudo e todos não é novidade. O que despertou minha curiosidade nessa sequência de informações foi entender como pessoas criativas lidam com sua própria insegurança em relação a um trabalho, uma ideia, desde antes mesmo dela ir para o mundo. Como ter ferramentas para navegar isso? Será que até Leonardo Da Vinci era inseguro em relação às suas criações?
A resposta é que sim, ele tinha muita insegurança em relação às suas obras, tanto que era conhecido por atrasar a entrega dos seus projetos devido ao seu perfeccionismo, muitas vezes sentindo que seu trabalho não correspondia à sua visão. Existe muita autocrítica em seus cadernos e anotações. Fui pesquisando mais e vi que Vincent Van Gogh frequentemente duvidava do seu talento, e ele dividia isso em cartas enviadas ao seu irmão, Theo. Ele vendeu poucas peças em vida e se questionava muito sobre seu valor como artista. Apesar disso, ele continuou pintando, pois seu propósito era maior do que a validação externa. Só para dar mais um exemplo, a Sylvia Plath frequentemente sentia que seu trabalho era inadequado, conforme ela documentava em seus diários. Ela questionava suas habilidades e sentia pressão para ser perfeita, mas conseguia canalizar esses sentimentos em sua escrita, produzindo diferentes obras de uma forma profundamente pessoal e comovente.
Pessoas criativas, de forma geral, compartilham um grande senso de vulnerabilidade sobre seu trabalho. A criatividade geralmente envolve uma tensão entre a visão idealizada de um projeto e a realidade de sua execução, onde lida-se constantemente com altas expectativas e um impulso contínuo para melhorar o resultado final. Essas inseguranças tendem a alimentar o foco em buscar a excelência em vez de desistir da ideia.
Intencionalmente, fui atrás de referências desproporcionais, justamente para me trazer um certo conforto. Se até Da Vinci, Van Gogh e Plath eram questionados e se questionavam, dá para não ficar tão insatisfeita quando alguma campanha não sai como foi idealizada.
No universo corporativo, essa barra alta para a criatividade precisa existir, com pessoas que têm um grande foco no potencial e nas possibilidades de uma ideia. Isso nunca vai ser um objetivo comum entre todo mundo e confesso que depois de uns tantos anos nesse universo, de certa forma, é bom ter pessoas no time que não se preocupam com a barra alta, porque elas forçam a entrega e um certo pragmatismo. O desafio é navegar e negociar com essas pessoas ao longo do processo, porém, isso também é parte do trabalho de uma entrega criativa bem-feita.
Quis expandir mais no assunto e cheguei no Scott Berkun, em uma publicação sua que fala sobre os três gaps da criatividade: esforço, habilidade e qualidade, e como são barreiras significativas para profissionais criativos. De forma resumida, o gap de esforço está ligado ao medo da imperfeição, que impede algumas pessoas de agirem de acordo com suas ideias, podendo gerar um bloqueio criativo e fazendo com que haja receio em começar por ter medo de que o resultado não corresponda à visão. Esse gap conversa muito com o perfeccionismo e medo do fracasso. Lidar com ele requer entender que nenhum trabalho criativo já começa pronto, somente fazendo é que uma ideia pode evoluir.
O gap de habilidade é sobre como a autocomparação com especialistas do setor atrapalha o progresso, criando um senso de síndrome de impostor que afeta a criatividade. Muita gente olha para outras pessoas e presume que suas próprias ideias e esforços não têm a mesma qualidade, potência, mas não conseguem reconhecer que mesmo os profissionais mais reconhecidos partêm de um ponto de incerteza e imperfeição. Um ótimo contraponto para esse gap é entender que as habilidades podem ser desenvolvidas ao longo do tempo, e enxergar erros e começos confusos como parte do processo.
E, por último, o gap de qualidade fala sobre a realidade de que a maioria dos criativos nunca se sentirá totalmente satisfeita com seu trabalho, não importa aonde já tenham chegado. Um sentimento de insatisfação criativa, o qual muitos estudos argumentam que o desejo contínuo de melhorar e refinar é o que leva à maestria a longo prazo. Embora seja muito difícil de lidar, é essa insatisfação que impulsiona criativos a inovar e atingir novos níveis de excelência.
Viver com uma constante insatisfação é cansativo e ao mesmo tempo estimulante. Dessa sequência de leituras e conversas com o Chatinho, tirei duas grandes coisas: primeiro, abraçar a insegurança é uma ótima ideia criativa e, segundo, assim como diversas coisas na vida, melhores resultados precisam de tempo para serem atingidos.
Chatinho, mais uma dúvida: como deixar o tempo ter seu tempo vivendo em uma sociedade do agora?