Julio e eu
Ele tinha paciência para encontrar um argumento original capaz de ser um gatilho poderoso. “Esperar é muito mais barato do que fazer a campanha errada”, dizia quando os prazos de mídia estouravam
Ele tinha paciência para encontrar um argumento original capaz de ser um gatilho poderoso. “Esperar é muito mais barato do que fazer a campanha errada”, dizia quando os prazos de mídia estouravam
8 de fevereiro de 2018 - 16h13
Conheci Julio Ribeiro quando fui trabalhar na Talent em 1989. Éramos três duplas de criação, cada uma na sua sala, com sofá e tudo. Nas mesas, uma máquina de escrever e um bloco para rabiscar layouts.
As reuniões de trabalho eram diferentes de tudo o que eu já tinha visto nas agências anteriores. Eram bate-papos animados, entremeados com as primeiras descobertas que o Julio tinha feito para algum cliente recém-chegado à agência. A gente anotava algumas frases dele e, depois, com outras dezenas que iriam sair das Olivettis dos redatores, formávamos um grande mural de folhas A4 escritas com pincel atômico e coladas na parede. No próximo encontro, o Julio lia tudo com atenção e apontava para algumas dizendo “muito bom isso!”. Geralmente eram exatamente as dele. Algumas dessas frases virariam tema da campanha e até títulos de anúncios. E mais tarde ainda ganhariam prêmios. Mas essa parte não interessava ao Julio. Ele era generoso com suas ideias. Apesar de ter sido redator no início da carreira, e de ter trazido o primeiro Leão de Cannes para o Brasil, ele vibrava mesmo quando as suas descobertas viravam uma grande campanha.
Muitas vezes os prazos se esgotavam e ele não se importava em ligar pro cliente dizendo que ainda não havíamos chegado lá. O Julio tinha paciência para encontrar um argumento original capaz de ser um gatilho poderoso. “Esperar é muito mais barato do que fazer a campanha errada. Não somos contratados pra fazer anúncios, mas pra fazer acontecer coisas”, dizia ele quando os prazos de mídia estouravam.
Ao todo foram três idas e vindas. Foram três despedidas usando sempre o mesmo argumento: eu queria fazer a minha própria agência. Acho que isso o deixava orgulhoso. Generoso como sempre, dava dicas valiosas.
Há três anos, depois de vender a Talent e já instalado no lindo escritório da JRP, ele me ligou. Gentil e generoso como sempre, me convidou para ser seu sócio.
Quase três décadas depois, os bate-papos animados estavam de volta. Entusiasmado com os projetos e otimista, apesar da crise, ele fazia o que sabia fazer de melhor: planos.
Na última sexta-feira eu me despedi pela última vez do mestre.
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