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Longevidade esticada

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Opinião

Longevidade esticada

A despeito do seu potencial de consumo, há muitas estratégias de comunicação, produtos e serviços alheios ao mercado maduros, especialmente às mulheres, que são o maior contingente e sofrem mais com o etarismo


26 de setembro de 2023 - 14h00

A economia brasileira é repleta de oportunidades de negócios subaproveitadas, por miopias culturais, sociais e geográficas. Uma delas é a chamada Economia Prateada, que se refere ao poder de consumo da população maior de 60 anos. No mundo, se esse grupo fosse unido em um país, seria a terceira economia do planeta, atrás apenas de Estados Unidos e China. No Brasil, a mudança na estrutura etária, com o aumento da população madura e diminuição de jovens com menos de 30 anos, já gera novas realidades como as vistas em estados como o Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul, nos quais o contingente de pessoas acima dos 60 anos excede o de crianças e adolescentes de até 14 anos. Esse cenário será intensificado com velocidade: a população maior de 60 anos, que hoje corresponde a 15% da população brasileira, deve dobrar em três décadas. Segundo o Sebrae, a população maior de 60 anos responde por 20% de todo o consumo nacional.

A despeito desse potencial, ainda há muitas estratégias de comunicação, produtos e serviços alheios à dimensão do mercado de consumidores maduros. Com a longevidade esticada, as gerações que ultrapassam os 60 anos estão ativas, se permitem autoindulgências e querem se divertir. Apesar de muitos terem dinheiro e vontade de consumir, há falta de produtos e serviços que satisfaçam suas demandas. A oferta específica ainda se resume, majoritariamente, a produtos de cuidado com a saúde, quando poderia haver soluções financeiras diversificadas, opções de moradia customizadas, mais lazer e entretenimento e espaços e oportunidades para aplicação do conhecimento acumulado.

Nesta edição, a reportagem especial da plataforma Women to Watch foca as mulheres como vetores da Economia Prateada, especialmente pelo fato de a expectativa de vida delas ser, em média, oito anos maior que a dos homens. O problema aqui é que o preconceito com a idade, o chamado etarismo, é mais cruel com as mulheres. A luta contra o estereótipo de que idade define capacidade física e intelectual ainda é longa. Assim como o combate à relação desequilibrada entre longevidade e mercado de trabalho.

Além de tratar desses temas, a reportagem revela dados da pesquisa Elas 45+ — Movimentos etários, da consultoria Eixo, que aponta que 63% das mulheres com mais de 45 anos são provedoras de suas famílias no Brasil, sendo que pelo menos 40% são a única fonte de renda. O estudo também ajuda a desmistificar a ideia de que os mais maduros não são propensos a compras digitais. A matéria trata, ainda, do “dever de reparação” da comunicação, que, por muito tempo, alimentou a ideia de que envelhecer bem é não parecer velho — especialmente em relação à estética.

A capacidade de criar soluções para os problemas que vivenciam no dia a dia abre espaço para o empreendedorismo nesta faixa etária, combinando vontade com necessidade e se contrapondo às portas muitas vezes fechadas do mercado de trabalho ou aos ambientes corporativos hostis. O Global Entrepreneurship Monitor, estudo feito no Brasil em parceria com o Sebrae, apontou que 2,5 milhões de pessoas começaram seu próprio negócio no País tendo 55 anos ou mais. Segundo a consultoria Empreendabilidade, os maiores de 55 anos representam pouco mais de 30% do total de empreendedores no Brasil — o que desmistifica a imagem de que startups são sempre empresas comandadas por jovens.

Ao encarar as oportunidades abertas pelo fortalecimento da Economia Prateada, a indústria de comunicação, marketing e mídia não pode incorrer em erros como o de tratar esse grupo como se ele fosse homogêneo. Assim como ocorre em outras faixas etárias, a população maior de 60 é diversa. Além disso, tem vivido com mais autenticidade, se libertado do desejo por juventude eterna e aproveitado as benesses da senioridade, que, para muitos, pode significar a melhor etapa da vida. Se bem aproveitada, sua experiência, capacidade e adaptabilidade podem injetar força estratégica e contribuir com a inovação em vários campos de atuação, melhorando o mercado de trabalho e impulsionando ainda mais a economia do País.

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