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Opinião

Modas e verdades

Evolução de posturas e narrativas das indústrias fashion e de beleza reflete menor tolerância da sociedade com abordagens excludentes


29 de outubro de 2021 - 16h07

O mundo da moda sempre mexeu com o imaginário das pessoas, não apenas pela sua capacidade de ditar comportamentos e provocar consumo, mas também pelo suposto glamour que cerca o processo criativo dos estilistas e o disputado mercado de modelos. Não por acaso, é um tema recorrente nos enredos de ficções que prendem a atenção do público. Na quarta-feira, 20, causou frisson a estreia de Verdades Secretas 2, produzida pela Globo para primeira veiculação no Globoplay e apresentada como “a primeira novela feita para o streaming no Brasil”. A trama original de Walcyr Carrasco já havia chamado atenção em 2015 ao abordar o submundo da prostituição em agências de modelos, o vício em drogas, o perigo do bullying e os excessos da fama. Aos assinantes serão liberados 10 capítulos por semana, até que se completem os 50 previstos, no dia 15 de dezembro. Já o público da TV aberta terá de esperar até o ano que vem para assistir a sua versão.

O mundo da moda sempre mexeu com o imaginário das pessoas, não apenas pela sua capacidade de ditar comportamentos e provocar consumo, mas também pelo suposto glamour que cerca o processo criativo dos estilistas e o disputado mercado de modelos (Créditos: GoodStudio/shutterstock)

O entretenimento é um dos setores mais influenciados por ideias e produtos lançados pelas indústrias da moda e de beleza, assim como a publicidade. Por ser um dos principais veículos de expressão das pessoas, o vestir alimenta a cultura da aparência e, historicamente, é um meio de exclusão que vai além de sua funcionalidade prática e reverbera em outras atividades, especialmente onde a cobrança estética é maior. Nos últimos tempos, o mercado fashion é um dos que têm respondido com novas posturas à menor tolerância da sociedade com abordagens excludentes e pouco diversas. A evolução de narrativas evidencia uma representatividade mais plural nos desfiles, nas campanhas e nos produtos, sobretudo nos espaços abertos para inclusão de negros, casais homoafetivos, pessoas com deficiência, corpos e etnias fora dos padrões tradicionais que construíram os estereótipos de beleza do mundo ocidental. Ao tema se dedica a reportagem especial que merece o destaque principal na capa desta semana, que está publicada nas páginas 20 a 23 e terá continuação em uma próxima edição. Ouvido na matéria, Paulo Borges, diretor criativo da São Paulo Fashion Week, que é a quinta maior semana de moda do mundo, considera que o momento atual é mais do que disruptivo, é “regenerativo”. De fato, aumenta sua reverberação por acontecer paralelamente a outros, como o da própria publicidade, na qual o acerto de contas com o passado atinge a comunicação de setores como os de cervejas e automóveis, que se dedicaram nos últimos anos a tentativas de perder seus ranços machistas.

No mercado de agências, o caminho sem volta da busca por mais representatividade, inserção de pessoas negras nas equipes e enredos inclusivos nas peças de comunicação das marcas ganhou novas frentes, como detalha reportagem da página 15. A learning tech Joco, a consultoria Indique Uma Preta e a Ada Strategy se juntaram no lançamento da plataforma interativa Mais Plural, que permite que empresas tenham um diagnóstico mais preciso sobre como os colaboradores se posicionam diante de questões raciais.

A VMLY&R instituiu o programa Par, para ampliar o número de profissionais e acelerar o desenvolvimento de lideranças negras na equipe. A AKQA apresentou a RGBlack: Reframing the Greatness of Black (Retratando a Grandeza da Pele Negra), movimento para fomentar o debate racial no âmbito do audiovisual, na tentativa de influenciar novas abordagens em filmes e fotografias.

Pioneira no estabelecimento de metas entre as agências brasileiras, com o Programa 20/20, que em 2017 lançou o objetivo de ter 20% de pessoas negras até 2020, a Wunderman Thompson apresentou, na semana passada, seu primeiro relatório anual de inclusão, equidade e diversidade, tornando públicos os percentuais de profissionais negros e pardos (25,7%), LGBTQIA+ (19,6%) e mulheres (60,4%) na agência. Além disso, se comprometeu a atingir 56% de pessoas negras até 2025, com elas ocupando pelo menos 30% dos cargos de liderança — hoje são 13,9%.

As metas têm se mostrado um bom acelerador na diminuição de desigualdades e em processos de inclusão. Entretanto, as mudanças culturais e de mentalidade, infelizmente, ocorrem em uma velocidade muito mais lenta que a necessária na instituição de ambientes mais justos — e, por consequência, mais criativos e inovadores, seja na publicidade, na moda ou em qualquer outro ramo de atuação.

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