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Opinião

O futuro fica do outro lado

O líder da Coca-Cola conta como as marcas precisam ficar atentas ao mundo e à cultura para inovar e se manter relevantes – mesmo quando erram


28 de outubro de 2024 - 20h13

Chris Hunsaker é o Senior Brand Director de uma das marcas mais icônicas do planeta, a Coca-Cola. Tão icônica que, para muita gente, pode dar a impressão de que se vende sozinha. Mas é bem mais complicado do que isso. Em sua palestra no The Gathering, o evento sobre marcas e cultura que acontece nas montanhas do Canadá, ele compartilhou o processo de construção da marca ao longo de seus 138 anos, para que os participantes pudessem entender a quantidade de sangue, suor e lágrimas necessários para criar uma marca tão vitoriosa. E as lições que aprendeu sobre o que é necessário para se manter relevante e seguir crescendo.

“Eu confesso que senti o peso quando cheguei nessa cadeira”, disse Chris, que antes do cargo já havia sido responsável por marcas como Sprite e Fanta. Para ilustrar esse peso, ele começou sua fala justamente pelo maior fracasso da história dos rebrandings, o lançamento da New Coke, nos anos 80. “Esse momento traz a lição mais importante que tivemos na história. Que, sempre que fugimos daquilo que somos, fracassamos miseravelmente”. Segundo ele, a empresa via os competidores se aproximando, esqueceu de sua própria essência, e tomou a decisão errada. “Nosso grande erro foi subestimar o que a marca significava para nossos consumidores, e o que o produto significava para suas vidas. Houve indignação, houve tristeza, houve raiva, com razão”. Por outro lado, voltar com a fórmula clássica da Coca-Cola, 79 dias após o lançamento da nova, foi um dos maiores acertos, que gerou uma “onda de gratidão”, em suas palavras. Chris considera que nenhuma marca está livre de errar, e que isso não a torna menor, a não ser que ela não aprenda com isso.

Ele explica que o DNA da empresa sempre foi oferecer uma experiência de produto superior. A Coca-Cola foi inventada no século 19, uma época em que não havia quase nenhuma regulamentação na indústria. “Se você ler o livro A Selva, de Upton Sinclair, ele descreve as condições da indústria de alimentos, você vai ver a falta de higiene, as condições de trabalho, era horrível”, resumiu. No lado contrário, a Coca-Cola era extremamente focada em qualidade, pureza, higiene. Os refrigerantes naquele tempo eram vendidos em farmácias, e tirados em máquinas que eram as avós daquelas que existem hoje nas redes de fast food. Nessa época a Coca-Cola introduziu equipamentos padronizados para cada farmácia armazenar, medir e servir o seu produto. Ninguém fazia isso.

O que os concorrentes faziam copiar descaradamente os produtos uns dois outros, mas com qualidade inferior, para garantir uma margem maior. A famosa garrafa nasceu daí, era uma forma de entregar o refrigerante misturado corretamente, exatamente com a qualidade que a marca queria levar a seus consumidores. A ideia não era apenas entregar um produto consistente, mas permitir que – com sua garrafa única – ele fosse reconhecido e separado dos imitadores e falsificadores. Se pararmos para pensar, foi um grande momento da história do branding! Afinal, antes mesmo de existir com esse nome, a Coca utilizou sua embalagem como forma de reforçar o seu maior atributo de diferenciação na época: qualidade do produto. “Tudo está ligado à experiência do consumidor. A Coca-Cola quer deixar as pessoas para cima, e isso é um pilar inegociável da marca”, avalia Chris.

Outra lição importante é como a marca precisa estar atenta ao que acontece no mundo – o que inclui tanto a cultura quanto os outros mercados – para identificar os novos caminhos por onde pode crescer, principalmente nos espaços fora dos limites de sua própria indústria. Por exemplo, nos anos 1920, quando os carros começaram a substituir cavalos e carroças, a Coca-Cola, que só era vendida em farmácias, viu a oportunidade de anunciar e vender em postos de gasolina. Refrigerante gelado para quem passava calor no trânsito. Mais adiante, quando foram inventadas as geladeiras de cozinha, a empresa lançou os multipacks, para que o consumidor pudesse comprar, levar para casa e guardar uma Coca-Cola gelada para se refrescar e oferecer às visitas. Parece muito natural hoje, mas o fato é que naquele tempo não se bebia refrigerante em casa. Então a marca inventou um novo mercado, e inventou a publicidade para esse mercado.

O próprio Papai Noel, que tem sua imagem tão ligada aos anúncios clássicos da Coca-Cola, representa um outro momento da marca, quando ela passou a investir no Natal para melhorar as vendas em dezembro, já que o consumo de refrigerantes nos Estados Unidos despencava nos meses frios. Muita coisa que olhamos em 2024 parece óbvia. Mas só parece porque alguém teve o trabalho de pensar antes – e funcionou tão bem que se tornou parte do cotidiano. Hoje não conseguimos imaginar como seria a vida sem aquilo. Então, vamos reforçar: parece óbvio porque alguém quebrou a cabeça criando uma solução, para uma marca e seus consumidores. Essa é a lição final do líder da Coca-Cola. Para se manter relevante, a marca precisa inovar, e para isso precisa estar sempre atenta ao que acontece no mundo. Mesmo que seja para errar, e aprender uma nova lição.

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