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O Super Bowl e o delírio publicitário brasileiro

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Opinião

O Super Bowl e o delírio publicitário brasileiro

Olhamos para aquelas produções gigantescas e não vemos apenas boas ideias: vemos tudo o que gostaríamos de ter a chance de experimentar


17 de fevereiro de 2025 - 15h00

Todo ano, sem falta, o ritual se repete: o Super Bowl acontece nos Estados Unidos e o mercado publicitário brasileiro entra em estado de comoção.

De um lado, agências e anunciantes babam diante de campanhas criativíssimas, com produções cinematográficas, elencos estrelados e roteiros que mais parecem curtas hollywoodianos. Do outro, profissionais locais suspiram entre admiração e frustração, comparando esse sonho dourado à nossa própria realidade de verbas apertadas, timings impossíveis e discussões intermináveis sobre o tamanho do logo.

Mas por que o Super Bowl exerce esse magnetismo sobre a publicidade brasileira?

O grande espelho

A publicidade do Super Bowl funciona como um espelho invertido para o Brasil. Olhamos para aquelas produções gigantescas e não vemos apenas boas ideias: vemos tudo o que gostaríamos de ter a chance de experimentar. Fazer campanhas mais ousadas e com menos amarras burocráticas é um desejo que povoa os sonhos de 9,5 entre 10 publicitários brasileiros (claro que a fonte desse dado é totalmente duvidosa, mas a sensação é real).

Fato é que, por aqui, a grande maioria dos anunciantes ainda hesita em investir com vontade na construção de marca, preferindo campanhas de conversão de curto prazo. Um imediatismo por resultados concretos típico de um contexto social no qual vender o almoço para comprar a janta é uma prática estruturante.

Enquanto isso, o Super Bowl ocupa um lugar de campo de inspiração para uma publicidade emocional que nos parece utópica, um verdadeiro festival de storytelling, dopando nosso sistema de recompensas cerebrais com histórias que nos fazem rir, chorar e apertar o “compartilhar” sem pensar duas vezes.

Há, claro, marcas no Brasil que tentam seguir esse caminho, produzindo campanhas ambiciosas e cinematográficas — alô, Matt LeBlanc! —, mas são exceções restritas a anunciantes com verbas multimilionárias. Para a maioria dos anunciantes e agências, a realidade ainda é um funil de performance e pragmatismo, deixando pouco espaço para ousadias criativas e narrativas mais profundas.

Gatilhos e desejos: como nosso cérebro reage

Estudos em neurociência mostram que nossa memória é mais receptiva a histórias emocionalmente impactantes do que a mensagens puramente racionais. Os comerciais do Super Bowl sabem disso e abusam dos gatilhos certos: nostalgia, humor, empatia e surpresas bem calculadas.

No Brasil, por outro lado, quase sempre se opta por ignorar a potência dessa escolha estratégica e segue-se desenvolvendo majoritariamente campanhas que apostam no didatismo e na obviedade.

Outra diferença crucial é a forma como esses comerciais são planejados para viralizar desde a concepção da ideia. O Super Bowl é assistido por mais de 100 milhões de pessoas, mas as campanhas são pensadas para se espalhar muito além disso, gerando discussão e engajamento por semanas e por todo o globo. Funciona bem, né?

Já aqui, na batida do bumbo da vida real, a grande massa de campanhas ainda é pensada em uma lógica tradicional, independentemente do meio, quase que numa de “ah, viralizar é loteria, #semtempoirmão, preciso de conversão”.

O que podemos aprender?

Não é só sobre dinheiro (ok, dinheiro ajuda, tá bom). É sobre olhar sob novos ângulos para o que fazemos todos os dias.

O Super Bowl nos ensina que grandes ideias precisam de espaço para respirar. Uma campanha memorável não se resume a — e não depende de, falando sério — um orçamento astronômico: trata-se de entender profundamente onde estão os gatilhos emocionais do público, sejam 100 milhões ou 10 pessoas, e entregar algo que se queira realmente consumir e compartilhar.

Se quisermos pequenos, médios e grandes “Super Bowls brasileiros”, precisamos primeiro abandonar certos cacoetes criativos: o medo da ousadia, a necessidade de explicar tudo nos primeiros cinco segundos e a dependência de fórmulas gastas.

A publicidade do Super Bowl nos encanta porque não é apenas um show de criatividade, mas um desfile de ideias que entendem a alma humana. E, no fim das contas, é isso que todo publicitário brasileiro quer fazer: criar algo tão bom que as pessoas queiram assistir, não porque são obrigadas, mas porque simplesmente não conseguem evitar.

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